Rafeal Moro Martins, The Intercept_ Brasil
Empunhando simplórias Bic Cristal e com o ar compenetrado de quem
acaba de se alistar nos Intocáveis de Eliot Ness, os ministros Ricardo
Vélez Rodríguez e Sergio Moro assinaram ontem um documento que o colombiano e
discípulo de Olavo de Carvalho vê como o estopim da "Lava Jato da
Educação".
O objetivo é "apurar indícios de corrupção, desvios e outros tipos de
atos lesivos à administração pública no âmbito (sic) do MEC e de suas
autarquias nas gestões anteriores", diz no release.
Trata-se da primeiro sinal concreto emitido por Vélez de que o governo de
extrema-direita irá declarar guerra às universidades públicas federais. Até
agora, tudo o que o colombiano fizera fora distribuir bravatas.
Numa já célebre entrevista à Veja, ele contou ter se tornado
ministro por indicação de Carvalho – o auto-denominado filósofo e guru do
bolsonarismo – por ter "a faca nos dentes para enfrentar o problema do
marxismo (sic) no MEC".
Vélez também disparou o seguinte: "Tem de haver Lei de Responsabilidade
Fiscal para os reitores [de federais]. Eles são habitantes deste belo país,
também estão submetidos à lei. O CPF deles pode ser rastreado pelo juiz
(sic) Sergio Moro, por que não? Querem mais dinheirinho? Paguem as
contas".
A que contas se referiu, Vélez não explicou – e nem foi inquirido pela
Veja. E é aí que está o problema: ao prometer uma Lava Jato contra as
universidades com base em acusações genéricas, o ministro não consegue
sequer disfarçar que o objetivo é criar um novo inimigo de estimação para
um governo que mal começou e já se vê constrangido por suspeitas graves que
envolvem o filho, o partido e o principal cabo eleitoral do presidente.
"Quer dizer que para esse governo a educação superior é uma inimiga?
Vai ser assim mesmo?", questionou o reitor de uma das principais
universidades federais do país, que me pediu sigilo pelo óbvio temor de
retaliações contra a instituição. Nós conversamos essa semana. "Poucas
instituições são tão controladas como as nossas. A CGU (Controladoria Geral
da União) mora aqui dentro. Isso soa como ameaça. O conteúdo simbólico é
muito forte."
Nos últimos anos, multiplicaram-se investigações da Polícia Federal em
universidades. A maioria delas desbaratou esquemas criminosos que não
tinham participação das reitorias. Mas também avançou-se o sinal.
No caso mais emblemático, o então reitor da UFSC Luiz Carlos Cancellier de
Olivo suicidou-se após ser preso, despido e algemado por uma operação
que sequer conseguiu amealhar provas contra ele. A
comandante daquela operação, a delegada Erika Mialik Marena, que também fez
parte da Lava Jato, não teve qualquer punição. Pelo contrário: ganhou de
Moro um cargo no ministério.
De Vélez, como diria o Barão de Itararé, não se podia esperar nada melhor. Ele
mesmo já disse que virou ministro para combater o "marxismo do
MEC", que na visão infantil do olavo-bolsonarismo atinge seu ápice nas
universidades federais, verdadeiros antros de esquerdistas, gays, feministas
e maconheiros. Para o presidente e seu ministro da Educação, os
universitários brasileiros são os Freak Brothers, o hilário trio de
hippies-alternativos-esquerdistas-drogadões criado pelo quadrinista
norte-americano Gilbert Shelton.
O que surpreende é ver Sergio Moro aceitar ser instrumento da guerra do
olavo-bolsonarismo. O juiz, um fã de quadrinhos visto por seu fã-clube como
o Eliot Ness brasileiro, se torna cada dia mais parecido com – para nos
mantermos na obra de Shelton – Tricky Prickears, o gambé cego, surdo e ultra-reacionário
que persegue os Freak Brothers. Enquanto isso, Flávio Bolsonaro segue
debochando do Ministério Público fluminense.
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Enquanto Vélez e Moro assinavam a declaração de guerra às universidades, o
novo presidente da Capes, Anderson Ribeiro Correia, determinou novas regras
para a abertura de novos cursos de mestrado e doutorado no país, informou a
ótima newsletter "Brasil Real Oficial", do jornalista Breno
Costa, colaborador do Intercept.
A partir de agora, é preciso provar a “adequação e justificativa da
proposta ao desenvolvimento regional ou nacional e sua importância econômico-social”.
Para Costa, abriu-se a brecha para que o MEC possa exercer um controle
ideológico sobre novos cursos de pós-graduação.
"Mostrar que um curso de engenharia, por exemplo, tem um impacto
potencial direto no desenvolvimento regional é fácil. Mas e quanto a cursos
na área de sociologia, história, filosofia ou mesmo psicologia?",
Costa questionou.
A blitzkrieg do olavo-bolsonarismo contra a educação superior está em
marcha.
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