Rilke e as cidades do mundo
“Para que duas criaturas se aconselhem, são necessários muitos encontros e muitas realizações”, adverte Rainer Maria Rilke nas suas Cartas a um jovem poeta.
Bem que podemos nos inspirar no poeta alemão ao abordar o relacionamento entre as cidades do mundo, quando o propósito é a cooperação e benefício mútuo: são necessárias muitas conversas e algumas experiências iniciais.
A idéia nos vem a propósito da missão que ora realizamos no Caribe e na África, em nome da Prefeitura do Recife, no intuito de estabelecer relação de irmanamento (ou germinamento, como dizem os angolanos) com Santiago de Cuba, Luanda, em Angola, e Maputo, em Moçambique. De pronto surgem alternativas de ação conjunta nos terrenos da cultura e da educação, do planejamento urbano, do turismo e da tecnologia da informação, dentre os exemplos preliminarmente examinados com autoridades locais.
É o que recolhemos das conversações mantidas com o prefeito de Santiago, Luis Henrique Ibañes, e com o vice-governador da Província de Luanda, Bento Soito, e com técnicos e assessores dos dois governos. Algo semelhante com o presidente do Conselho Municipal de Maputo, Eneas Comiche. Na verdade, dos primeiros contatos o que se pode ter são impressões – e não exatamente a compreensão precisa de realidades encontradas, nem juízo de valor sobre a situação econômica, social e política. Por mais que estejamos previamente informados.
De cada cidade, traços marcantes, algo do modo de ser, viver e sentir dos povos que as habitam. Em Santiago de Cuba, de pouco mais de 400 mil habitantes e rica tradição de luta, respira-se História e cultura em cada esquina onde há sempre alguém cantando ou expondo obras de arte e artesanato. O mesmo se pode dizer de Havana. E em ambas, como em toda a Cuba, um fortíssimo sentimento de Nação e de unidade do povo, produtos diretos das lutas pela Independência e pela República, desde o século IXX, da vitoriosa Revolução de 1959 e do bloqueio econômico inclemente movido pelos EUA. O bloqueio e a suspensão abrupta e sem aviso prévio das relações bilaterais por parte da Federação Russa, quando da débâcle da União Soviética (mais de 80% da economia cubana dependia de transações com os soviéticos), provocaram o “período especial” dos anos 90 que atingiu duramente a vida do povo cubano por meia década. Provação decisiva, da qual todos – dos dirigentes às pessoas mais simples que encontramos nas ruas e nos restaurantes – falam com emoção e orgulho. “Cuba resistiu e venceu”, proclamam com entusiasmo.
Já em Luanda, caótica cidade de mais de 5 milhões de habitantes convertida em verdadeiro canteiro de obras, só se fala no desenvolvimento. Tema que empolga o motorista que nos serve, Teixeira, ele próprio, o pai e dois irmãos participantes da guerra civil que mergulhou o país no impasse por três décadas após a libertação do jugo português. “Esse engarrafamento do trânsito é porque o país está crescendo”, justifica orgulhoso. “Temos muito a investir em infra-estrutura e em planejamento urbano”, assinala o vice-governador Soito, um jovem arquiteto urbanista.
Em Maputo, o tema central são os preparativos para as eleições que se darão em três etapas distintas num período de cerca de seis meses: para governantes e parlamentares municipais, provinciais e federais; e são encaradas como meio de consolidação do Acordo Geral de Paz assinado há quinze anos e de certo modo são torpedeados, o pleito e paz, pela oposição.
Nas três cidades, um vivo interesse sobre as coisas do Brasil e uma vontade efetiva de compartilhar idéias e experiências com o Recife, sob a inspiração da solidariedade internacional, do respeito às diferenças e da luta comum pela paz e pelo progresso.
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