"Faz-se necessário, portanto,
seguir os rigores jurídicos quanto a tais fundamentos, não sendo aceitáveis
malabarismos"
Por
Bruno Galindo*, no Diário de Pernambuco
A
questão dos fundamentos jurídicos no processo de impeachment da Presidente
Dilma tem sido objeto de grande controvérsia na comunidade jurídica. Juristas
renomados têm defendido teses completamente opostas a respeito. Elucidá-la
implica discutir a natureza de tal processo, se predominantemente política ou
jurídica.
O
impeachment é um instituto que nasceu no parlamentarismo britânico. Diante de
sua complexidade processual, foi substituído pelo voto de desconfiança e nunca
mais usado por lá. Contudo, foi importado pelos EUA e por outros países
presidencialistas.
Nos
EUA, foi inicialmente visto por autores como Alexander Hamilton como um
processo de punição dos que governam mal, tese, contudo, não aceita no caso do
Presidente Andrew Johnson, em 1867, quando se rejeitou uma condenação
estritamente política. Nos demais casos predominaram os aspectos criminais,
tendo Richard Nixon renunciado antes da instauração do processo no Caso
Watergate e Bill Clinton absolvido das acusações de perjúrio e obstrução da
justiça.
Na
América Latina, ocorreu pela primeira vez justamente aqui no Brasil, em 1992,
com o ex-Presidente Fernando Collor. Acusado de 6 crimes comuns e 2 de
responsabilidade, foi condenado por estes últimos no Senado e absolvido pelos
primeiros no STF, em um dos casos (corrupção passiva) em razão de provas
ilícitas no processo. Os demais foram na Venezuela em 1993, com o ex-Presidente
Andrés Pérez condenado por peculato, e no Paraguai, em 2012, com o
ex-Presidente Fernando Lugo, um verdadeiro impeachment “relâmpago”, por ter
sido instaurado e concluído em menos de 48 horas.
Considerada
sua evolução histórica, o impeachment é atualmente um processo de natureza
político-criminal, como destaquei em recente livro publicado (Impeachment à luz
do constitucionalismo contemporâneo, Editora Juruá, 2016). Embora seja julgado
nos crimes de responsabilidade por uma Casa política (Senado) o fundamento
jurídico é uma exigência imprescindível em sua atual conformação. A própria
jurisprudência do Supremo inclina-se a compreendê-lo como um instituto
predominantemente penal (ADI 834/MT, j. 18/02/1999, e ADI 1628/SC, DJ
24/11/2006), o que reforça as exigências de bases jurídicas sólidas para o
acolhimento de um pedido de tal natureza, não podendo ser a má administração ou
o cometimento de ilícitos que não se enquadrem estritamente nas previsões
constitucionais e legais os fundamentos de tais denúncias.
Faz-se
necessário, portanto, seguir os rigores jurídicos quanto a tais fundamentos,
não sendo aceitáveis malabarismos interpretativos, analogias ou interpretações
extensivas em prol de uma condenação, o que pode até mesmo ser objeto de
impugnação junto à Suprema Corte brasileira, caso estejam em desacordo com as
exigências constitucionais, tal como alertou recentemente o Min. Marco Aurélio
Mello.
*Professor
Associado da Faculdade de Direito do Recife/UFPE
Leia mais sobre temas
da atualidade: http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário