Luciano Siqueira, no Blog da Folha
Antes foi uma carta mal elaborada que transpirou para imprensa. Ontem, uma
mensagem de áudio absolutamente comprometedora.
Lamentáveis sob todos os títulos, sendo o autor
vice-presidente da República.
É fato que a composição do comando de um governo — seja a
presidência da República, o governo estadual ou a prefeitura — expressa aliança
entre partidos.
Alianças políticas em geral são conjunturais, podem se
consolidar ou se esgarçar conforme a evolução dos acontecimentos. Isto vale em
qualquer circunstância, particularmente em situação de crise.
É fato que o PMDB, por razões que boa parte da opinião
pública conhece — numa postura típica de partido centrista e internamente
subdividido — afastou-se formalmente do governo.
Também é fato que Michel Temer, acumulando a dupla condição
de vice-presidente da República e de presidente nacional da sua agremiação,
atua nas duas instituições — para o bem ou para o mal.
Igualmente sabe-se que, meses atrás, o próprio Temer esteve
à frente da elaboração de um projeto para o país distinto do acordado quando da
renovação da chapa presidencial vitoriosa no último pleito.
A dimensão em que essa situação, de certa maneira híbrida,
vivida entre o governo e o PMDB e entre a presidenta e o vice-presidente, ainda
que delicada, pode até ser compreendida sob o prisma das divergências
políticas.
Porém na carta à presidenta, que o próprio Temer cuidou de
vazar para imprensa, numa tentativa infantil — para não usarmos expressão mais
dura — de se fortalecer politicamente em meio à crise então instalada, se
evidencia a pequenez do ocupante do cargo.
Ali, em razão de pleitos de natureza eminentemente
fisiológica, no pior estilo da tradição clientelista, aquele que se supunha co-responsável
pelos destinos da nação se ajoelha e se apequena.
Agora, na gravação em áudio, tornada pública mais uma vez
pelo próprio autor, torna-se nítida e irrefutável a sua participação em manobras
de caráter golpista, destinadas afastar Dilma da presidência da República.
Desse modo, o princípio elementar a ser observado por um
companheiro de chapa e de gestão — o da lealdade — é posto na lama.
Divergências envolvem parlamentares, próceres partidários e
outros, mas jamais poderiam envolver, da forma como vem acontecendo, o próprio vice-presidente
da República.
Decidida a questão do impeachment, virá a difícil tarefa de
reconstruir o governo — no caso mais provável do não afastamento da presidenta
Dilma. Ou, consumado o golpe, a construção de um governo de transição — tendo o
próprio Temer à frente — como defendem
peemedebistas e tucanos.
Em
ambas as alternativas, Temer não terá estatura política, ética e moral para
assumir o papel que lhe caberá.
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