Terão os anfíbios o direito de ir e vir?
Luciano Siqueira
Aconteceu em março do
já finado ano de 2018 – e bem que o fato pode ser incluído em toda “retrospectiva”
digna desse título, tão em voga nas redes de TV nessa época do ano.
Uma espécie de
perereca, absolutamente desconhecida na região, visitou de surpresa um
condomínio de luxo no Guarujá, litoral de São Paulo.
A perereca, se vocês
não sabem fiquem sabendo: é um anfíbio, conhecida dos pesquisadores com o
sonoro nome Scinax perereca, da família Hylidae.
Em condições normais
de tempo e temperatura jamais seria encontrada ali, sob pena de apreensão pela
Vigilância Sanitária e multa ao Detran. E, de quebra, suspeita de “terrorismo
de esquerda” pela turma do capitão.
Mas apareceu.
Um biólogo especializado
nesse tipo de animal, imediatamente convocado para atender a ocorrência, de
pronto a acusou de invasora.
A partir daí, como é
próprio de todo bom cientista, o “fenômeno” (assim classificado) deu azo a
muitas especulações e estudos, quem sabe até futuras teses de doutorado.
Fez-se o levantamento
de anfíbios invasores dos biomas brasileiros e, a partir daí, formularam-se
hipóteses sobre o futuro dessa espécie e congêneres.
E assim ficamos
sabendo através do biólogo Lucas Rodriguez Forti, pesquisador do Instituto de
Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) que no verão de 2013 algo
mais grave já havia acontecido: uma verdadeira infestação de
pererecas-das-bromélias (Phyllodytes luteolus) nos jardins de um condomínio na
Estrada Parque da Serra do Guararu.
Por que mais grave?
Simplesmente porque
habitat natural dessa espécie são as porções de Mata Atlântica que se estendem
desde o norte do Rio de Janeiro até a Paraíba. Nada a ver com o litoral
paulista.
Então, as leis da
Natureza, já faz algum tempo, vêm sendo desobedecidas pelas pererecas de
variadas espécies?
Meu espírito
militante logo se aguçou. Leis existem para ser questionadas e, quando
consideradas iníquas, desobedecidas.
A questão é: terão os
anfíbios o direito de ir vir consagrado na Declaração Universal que concede
esse mesmo direito aos humanos?
Pode ser que sim, ou
não.
A dúvida reside no
fato de que essas pererecas rebeldes ameaçam a sobrevivência de semelhantes animais
nativos que vivem na Baixada Santista.
E o rolo é grande.
Os machos da espécie
invasora emitem um som para atrair a fêmea, tal como ocorre em seu habitat de
origem.
Até aí, tudo bem.
Porém esse sinal se
dá na mesma faixa de frequência dos machos da espécie nativa, o que causa problemas
diversos – da infidelidade conjugal até a supressão gradativa dos ditos cujos. Daí
a necessidade de se evitar a promiscuidade, em nome da sobrevivência da
espécie.
Donde se conclui,
mais uma vez, que a Natureza é sábia - porém vulnerável à subversão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário