Queiroz é o de
menos
Janio de
Freitas, Folha de S. Paulo
O inquérito sobre a
arrecadação financeira do assessor e amigo dos Bolsonaros, Fabrício
Queiroz, não foge à regra brasileira: se o caso tem evidência e pode
ser acompanhado, a constatação de alguma coisa esquisita não tardará. O que
pode se dar tanto na ação da polícia como do Ministério Público, quando não de
um juiz.
Esse caso
motivou estranheza logo de início, mas por conta própria.
Despontou já trazendo, na ainda pequena bagagem, um lote de seis cheques de
Queiroz para a senhora Bolsonaro, totalizando R$ 24 mil que o marido Jair
explicou, com demora de três dias, restituírem um empréstimo de R$ 40 mil não
declarado no Imposto de Renda.
Nenhuma
referência ao débito restante, admitindo-se o valor inicial indicado, e sem
menção à finalidade do empréstimo —que, vá lá, é assunto mais do tomador que do
emprestador.
Até
a última sexta (18) o caso vinha rolando, semana após semana, sem mais
informações úteis do que as iniciais.
O
Ministério Público do Rio esperou em vão pelo previsto depoimento de Flávio
Bolsonaro, deputado estadual a quem Queiroz serviu como assessor de gabinete e
motorista pessoal.
A
mulher de Queiroz também não apareceu para depor. As duas filhas dele, muito
menos. E o próprio, depois de demorado sumiço, reapareceu em quarto de
hospital, como paciente acamado
e dançarino em atividade.
As
informações elementares indicavam, nos dias de pagamento mensal, o desembolso
de quantias destinadas a Queiroz por oito
funcionários de gabinete do deputado (hoje senador eleito). Sem
incluir, porém, qualquer indicação do motivo de descontos por uma parte e
recebimento por outra.
E
nada disso clareia com o passar dos dias. As especulações não têm como ser muito
variadas, mas são fortes e cada vez menos contestadas.
Em
lugar de quem devia fazê-lo, se é que poderia, o general
Augusto Heleno diz que “para Bolsonaro, o assunto é de Flávio, não seu”.
A
velha sabedoria já dizia: o que não é capaz de livrar, complica mais.
Há
uma inovação comprometedora no dito pelo general.
Todos
no circuito dos Bolsonaros diziam que o assunto era de Queiroz e por ele seria
esclarecido. Passou a ser de Flávio. É em nome do próprio pai, e por meio de um
general palaciano, que sua implicação vai a nível mais fundo.
E
não é tudo. Bolsonaro e o general que o invoca enganam-se: MichelleBolsonaro e
recebimentos, com explicação não comprovada, figuram nas suspeitas de que
Flávio é agora declarado parte. Isto diz respeito a Jair Bolsonaro, sim.
A
falta de determinada providência, porém, não se justifica. Já porque, além de
óbvia, é muito simples, não exige investigações. E, acima de tudo, pela
possibilidade de diluir, com informações autênticas, uma zona sombria do caso.
Oito
pessoas que entregaram a Queiroz parte do salário, mês a mês, por certo sabem o
motivo de fazê-lo. Seus depoimentos mostrariam que, entre elas, também sabem
para que ou para quem o fazem —o fim da linha.
Ficar
à espera de Fabrício Queiroz, da possível montagem de ardis, dasliminares de um
Luiz Fux,
e tanto mais, é típico das estranhezas que, nas formas mais variadas, não
faltam nos inquéritos com interesses notórios. Em todos eles. Sem disso
excluir, necessariamente, os inquéritos mais modestos.
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