25 abril 2020

Uma briga que nos serve...


Ajudamos com a gasolina
Por João Bani*


Quando, em 2017 ou 2018, não lembro bem, Sérgio Moro recebeu os cumprimentos em forma de continência militar, de um pateticamente exultante Bolsonaro que o encontrou então ainda juiz num aeroporto, o fez de forma cautelosa, como que parecendo evitar ligar seu nome ao do folclórico deputado, já em campanha para presidente.

Naquela ocasião, no lugar mais alto da idolatria iludida dos fãs de seu trabalho persecutório na operação Lava Jato, Moro havia alcançado um capital político considerável, pela sua popularidade. Estar ao seu lado era privar da companhia de um puxador de votos bastante promissor, mas o juiz paranaense parecia não se interessar muito.

Vieram as eleições, o capitão venceu, e coerente com seu trânsito medíocre entre nomes para composição do seu ministério, contou para tal com a ajuda dos filhos e dos “chegados”. Convidado, Moro aceitou o convite e foi um nome celebrado pela sua representatividade junto à direita com tudo o mais que significasse o antipetismo e chegou ao ministério dividindo com Paulo Guedes os holofotes da Esplanada. Moro também era, como sempre foi e estamos vendo que continua sendo, endossado pela Globo como elemento “de confiança” dentro do governo do tresloucado capitão: se observarmos bem, depois de acossado pela esquerda no Congresso pelas revelações do Intercept, o sempre midiático Moro baixou seu perfil de alguns meses para cá, mais curiosamente em sintonia com o acirramento das críticas mútuas entre os Marinho e o capitão.

Era, já , um estranho no ninho a observar metodicamente a deterioração do chefe, um inepto que assim já se mostrava diante da responsabilidade de governar um país complexo como o Brasil, pior ainda na gestão do governo diante de uma pandemia.

Moro, que agora requenta a imagem de “herói nacional”, probo que “não admite interferência na gestão da PF”, como ministro foi sempre omisso desde as primeiras revelações pela COAF das traquinagens dos filhos e família do chefe, como a todas as irregularidades e apontados crimes de Bolsonaro e seus filhos, como bem sabemos.

Mas, pragmaticamente, não é o momento da esquerda fazer o julgamento moral de quem já sabemos imoral. A hora é de observar e estimular o chumbo trocado na ruptura pública entre os dois nomes que compuseram a vitória da direita nas últimas eleições e subsidiar com as revelações de suas atuações espúrias a inviabilização eleitoral de ambos. Moro pensou exatamente em preservar o capital político que cultivou imoralmente como juiz na Lava Jato quando decidiu sair. De ex-herói apagado e boicotado pelo chefe, Moro abandona planos de ser ministro do STF e sai dando um “reset” no seu conceito público ilusório de baluarte da moral e da justiça, pavimentando sua trajetória política para 2022 provavelmente endossado pela Globo e americanos , e enterrando o já morto Bolsonaro, a quem restarão somente os seguidores mais fiéis, da ala dos folclóricos, ou seja, da ala de influência dos filhos.

É desse “chumbo trocado” que a esquerda colherá o capital político para disputar com alguma chance de vitória as próximas eleições. Pelas repercussões e revelações até aqui, é certo que o impeachment ou a imposição militar da renúncia virão. Mourão deve assumir e a incógnita é se vai assumir também o apoio a Moro ou não. O dever da esquerda nesse momento é tentar de verdade encontrar a união, enquanto observa o fogo pegar no parquinho e ainda ajuda com a gasolina.

*Músico

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