13 novembro 2020

O que está em jogo domingo

A mudança começa nas cidades – mais que um slogan, uma esperança!

Ana Cristina Santos*, no Blog do Renato

 

Toda cidade brasileira, nesse ano de 2020, ouviu ao menos uma vez um candidato ou candidata falar sobre mudança. O sentimento de mudança é inato aos seres humanos e naturalmente a publicidade explora essa palavra e sensação das formas mais diversas (e até bizarras) nas propagandas eleitorais. E de tanto uso, essa palavra tão preciosa entrou no eixo da banalização, fica caminhando ali, naquela linha tênue entre o esvaziamento e a ressignificação.

No ambiente político em que vivemos o sentimento de mudança é muito forte. No mundo inteiro, polarização, guerra, miséria, retrocessos. No Brasil, um governo ultraliberal na economia, que desrespeita a Constituição, atropela direitos básicos do povo e da sociedade em geral, aprofunda as desigualdades sociais e estimula o ódio, a intolerância, os preconceitos e o negacionismo. Uma crise de múltiplas faces — política, sanitária e econômica — empurra a faixa mais vulnerável da população para a miséria, atinge a classe média e espalha a desesperança até mesmo em militantes mais resistentes, que seguem nas trincheiras de defesa da civilidade, combatendo os desmandos do Governo Federal. A fome voltou a fazer parte da realidade dos brasileiros e a internet, entre notícias falsas e sensacionalismo, segue evidenciando o rancor de uma elite que sonha em voltar aos tempos do colonialismo.

Assim chegamos às eleições de 2020. Na defensiva e, para piorar, fragilizados por uma pandemia que modificou completamente nossos hábitos e costumes e nos impôs uma dura rotina de temores_, perdas, adoecimentos, isolamento e distanciamento social. Nesse cenário, mais do que nunca a palavra mudança ganha mais força e precisa fazer mais sentido. E é olhando para o passado que busco a concretude para, mais que uma palavra, ela seja uma ideia forte, um combustível para alimentar ações, pensamentos e aspirações para o futuro neste novembro, vésperas de eleições municipais.

Há 20 anos vivíamos uma situação de desesperança parecida com a atual. São fortes as lembranças do arrocho provocado pelas políticas neoliberais de Fernando Henrique Cardoso, dos ataques contínuos à Educação, do desmonte do SUS, da entrega do patrimônio público à iniciativa privada. Ali, daqueles tempos de luta e resistência, surgia a semente da esperança que, dois anos depois, tomou conta do país e promoveu uma grande revolução com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva, o primeiro representante dos trabalhadores a dirigir o Brasil. Em 29 de outubro de 2000, Olinda e Recife elegiam prefeitos de esquerda e renovavam a energia de combatividade daqueles que acreditavam que o Brasil poderia trilhar um futuro de desenvolvimento social e de combate à desigualdade.

Luciana Santos foi a primeira pessoa eleita pelo PCdoB para um cargo executivo em Olinda. Uma mulher, jovem, negra, nordestina e comunista mudaria os rumos da cidade patrimônio, abriria caminhos para dizer que lugar de mulher é na política sim e que competência, credibilidade e boa gestão não dependem de gênero. No Recife, João Paulo, na época no Partido dos Trabalhadores, também era eleito. O voto popular conduzia um operário à prefeitura da capital pernambucana. O sentido verdadeiro da palavra mudança, que começou naquele momento ainda, está impresso nas mentes e corações recifenses. A sua principal obra: cuidar das pessoas, garantiu que ele saísse do governo com quase 90% de aprovação e um legado de combate à desigualdade, de modificação do espaço urbano, de inclusão, respeito e trabalho pela dignidade de cada homem e cada mulher, da orla aos altos.

Olho para esses dois casos e repenso o slogan. É nas cidades que a mudança começa. Se procurarmos na história recente encontraremos muitos outros exemplos. É nas cidades que a mudança começa. Com candidaturas que olhem nos olhos das pessoas, que tenham compromisso com a mudança do mundo, com o desenvolvimento sustentável, com o respeito à cidadania e que entendam o quanto é sagrada a dignidade de cada ser humano. A mudança começa nas cidades. Conosco. Com a consciência de que o que digitamos na urna é mais que um número, é mais que um voto em uma pessoa ou em um partido. Com a certeza de que nosso voto é mais um tijolo numa construção muito maior, muito mais ampla. É um passo numa caminhada que é árdua, longa e que só pode ser feita coletivamente. A mudança começa nas cidades porque é lá onde moramos, porque são as cidades que guardam nosso peito cheio de esperança, nossos punhos erguidos e nosso desejo de viver em um mundo mais justo, onde todas as pessoas tenham, minimamente, o direito de ser feliz.

*Jornalista, pesquisadora sobre comunicação alternativa e popular e doutoranda em Comunicação na Universidade de Brasília.

Foto: Diego Galba

Veja: De grão em grão a urna confirma o que se quer https://bit.ly/2U6Twlu 

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