Eleição nas capitais dificilmente terá onda de direita como nas disputas de 2016 e 2018
Análise compara a
posição dos atuais prefeitos no GPS Ideológico com a dos candidatos favoritos
no pleito municipal
Daniel
Mariani, Fábio Takashi e Diana Yukari, na Folha de S. Paulo
A
onda de direita que ganhou impulso na eleição municipal de 2016 e virou maremoto em 2018 não
deve seguir o curso neste ano. Os candidatos favoritos nas capitais tendem a
estar mais à esquerda e ao centro do que os atuais prefeitos.
A análise tem
como base o GPS
Ideológico, ferramenta da Folha que monitora o
debate político no Twitter, atualizada neste mês. Os perfis são posicionados
numa reta, do ponto mais à direita ao mais à esquerda, considerando o perfil
dos seguidores das contas (clique aqui para
ver a reta completa).
A reportagem
comparou a posição dos atuais prefeitos com a dos primeiros e segundos
colocados nas capitais, de acordo com os resultados dos institutos Datafolha e
Ibope.
Em 11
capitais, os primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto estão mais à
esquerda do que o atual prefeito.
Na outra
ponta, apenas seis candidatos favoritos estão mais à direita do que o atual
mandatário.
Além de estarem em maior número como favoritos, esses
candidatos mais à esquerda também têm um perfil de seguidores que se
diferenciam mais do atual prefeito.
Numa escala
de 0 a 100 pontos, os favoritos mais à esquerda estão 16 pontos em média à
esquerda dos atuais mandatários. Na direita, são apenas 7 pontos mais à
direita.
O caso mais
emblemático no movimento à esquerda é o de Porto Alegre, onde Manuela D'ávila
(PCdoB), primeira colocada nas pesquisas, é 38 pontos mais à esquerda na escala
ideológica do que o prefeito atual, Nelson Marchezan Jr (PSDB).
A segunda
maior diferença é em Belém, onde Edmilson Rodrigues (Psol) tem um perfil de
seguidores 34 pontos à esquerda do atual prefeito, Zenaldo Coutinho (PSDB).
Entre os
candidatos favoritos que estão mais à direita, a maior diferença aparece em
Cuiabá, onde Abilio (Podemos) é 12 pontos mais à direita do que o prefeito
Emanuel Pinheiro (MDB).
Em São
Paulo, maior cidade do país, o favorito no pleito é o atual prefeito, Bruno
Covas (PSDB). Se considerado o resultado da urna de 2016, uma vitória de Covas
pode ser vista como deslocamento à esquerda, pois o eleito naquele ano, o agora
governador João Doria (PSDB), está à direita do atual prefeito.
Outro ponto
negativo para o espectro conservador é que os candidatos que estão mais à
direita no GPS Ideológico tendem a estar mal posicionados nas pesquisas do
Datafolha e do Ibope.
Alguns dos
exemplos são Bruno Engler (Belo Horizonte-PRTB) e Luiz Lima (Rio de
Janeiro-PSL), que estão em alguns dos pontos mais à direita da reta e não
passaram dos 5% de intenções.
A eventual
perda de força da direita no pleito de domingo é uma má notícia para o
presidente Jair Bolsonaro, pois os perfis nesse espectro tendem a ter
alinhamento com sua base.
O movimento
recente em direção à direita, que culminou com a eleição de Bolsonaro, começou
justamente nas últimas eleições municipais. Simbolicamente, naquele ano o PT
perdeu sua hegemonia no país (vinha do partido que governava a maior população
nas cidades e caiu para 11º).
Os dados
deste ano, porém, não são suficientes para se ter total certeza de que a
direita não possa surpreender e ainda ter um bom resultado, ao fim do segundo
turno, ao menos mantendo parte de suas capitais.
Se
considerados também os segundos colocados nas pesquisas de intenção de voto,
além dos líderes, em 15 cidades pode ser que o eleito venha estar à direita do
atual prefeito. Sob esse mesmo critério, são 16 cidades que podem ter eleito
mais à esquerda.
Mas
considerando as últimas pesquisas de opinião, candidatos mais à direita
precisariam de grandes arrancadas para chegarem ao segundo turno e serem
competitivos.
“Está claro
que não há grande movimento para a direita. A conclusão pode ser que vai ficar
mais ou menos como estava antes, ou então que vai haver movimento para a
esquerda", afirmou o cientista político Cesar Zucco, da Escola Brasileira
de Administração Pública e Empresas, da FGV-RJ.
Zucco aponta
duas possíveis explicações para o fenômeno. O primeiro é o fato de a aprovação
de Bolsonaro nas capitais estar arrefecendo, aparentemente. “Pode haver
incentivos para um afastamento em relação ao presidente, o que também levaria a
um arrefecimento de posições muito marcadamente à direita”.
Outra
possibilidade é que o ponto atual já seja o máximo que se possa chegar à
direita.
Pesquisador
do Cepesp (Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Público), da
FGV-SP, Guilherme Russo disse fazer sentido que a eleição de 2020 tenha
dinâmica diferente das anteriores e não siga em direção à direita.
"Há um
certo pêndulo na política que ora favorece forças mais à direita e depois à
esquerda”. E o contexto de 2020, diz o cientista político, é diferente de 2016,
ano conturbado para a esquerda, com Lava Jato, impeachment da presidente Dilma
Rousseff e prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Já 2020 está
sendo marcado pela pandemia, dificuldades econômicas e sociais, o que favorece
propostas de maior participação do Estado na parte econômica e social. Vale
dizer também que políticos são obviamente estratégicos em suas campanhas e ao
perceber o momento atual, se movem para a esquerda”, afirmou Russo.
Professor de
ciência política da Universidade Federal de Minas Gerais, Felipe Nunes disse
que "os temas municipais parecem ser mais fortes na eleição municipal do
que a disputa ideológica nacional que marcou o pleito de 2018."
Além disso, "a queda de popularidade do governo Bolsonaro, suas pautas
polêmicas, além de seus desgastes, têm contribuído para que a direita não
mantivesse seu crescimento", afirmou Nunes, que também que é diretor da
consultoria Quaest.
METODOLOGIA
A posição dos influenciadores na
reta é calculada a partir do perfil de 1,7 milhão de usuários do Twitter no
Brasil, com interesse em política (foram excluídas contas que um modelo
matemático classificou como possíveis robôs).
O algoritmo
do GPS Ideológico busca encontrar padrões nos perfis de seguidores entre os
influenciadores.
O modelo
capta, por exemplo, que usuários que seguem o vereador Carlos Bolsonaro tendem
a seguir também o deputado Flávio Bolsonaro e o jornalista Alexandre Garcia.
Esses ficam próximos na reta.
Mas esses
seguidores tendem a não seguir contas como a do petista Fernando Haddad, da
comentarista Gabriela Prioli e do cantor Emicida. Esses três ficam próximos na
reta, mas distantes dos Bolsonaros e de Alexandre Garcia.
Ou seja, a
posição na reta depende do perfil dos seguidores do influenciador, não
necessariamente mostra a ideologia da conta (ainda que haja uma forte
correlação entre o perfil de seguidores e o perfil do influenciador).
Autor do
algoritmo que foi adaptado para o GPS Ideológico, o cientista político Pablo
Barberá (Universidade do Sul da Califórnia e London School of Economics) afirma
em seus trabalhos acadêmicos que, ao seguir uma pessoa, via de regra o usuário
tem afinidade com esse perfil.
Isso porque a
pessoa passará a visualizar mais tuítes desse usuário. E receber conteúdo de
alguém sem afinidade é algo custoso, em termos de tempo e de atenção —por isso,
tende a ser exceção.
Para a
análise dos atuais postulantes à prefeitura, em alguns casos foi usada a
posição do partido deles no GPS Ideológico, pois suas contas pessoais possuíam
poucos seguidores e não foi possível fazer a análise da posição delas.
São os casos
dos prefeitos Roberto Cláudio (Fortaleza-PDT) e Socorro Neri (Rio Branco-PSB) e
dos candidatos Alfredo Gaspar de Mendonça (Maceió-MDB), Abilio Jr.
(Cuiabá-Podemos), Nilvan Ferreira (João Pessoa-MDB), José Priante (Belém-MDB) e
Fabrício Gandini (Vitória-Cidadania).
Veja: De grão em grão a urna
confirma o que se quer https://bit.ly/2U6Twlu
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