14 agosto 2015

Palavra corajosa

Dilma e o cadáver de Johnny Hooker

Vandeck Santiago, no Diário de Pernambuco

Quando uma crise avança a ponto de o seu desfecho ser vislumbrado por todos, surge a cobrança dirigida a cada um de nós: você é a favor que aconteça o quê?

A escalada da crise política está nos encaminhando para um daqueles momentos em que a todos se cobra uma posição: você é a favor que aconteça isso ou aquilo? Não necessariamente a favor ou contra um partido ou um político, mas em relação a uma postura do que você acredita seja o mais correto a acontecer. Isso acontece quando uma crise avança sem parar e os desfechos possíveis já não se afiguram mais como algo distante e abstrato, e sim como uma hipótese concreta que pode virar realidade – tornando imperativa uma tomada de posição.

Aos artistas e intelectuais, que são personalidades com influência no público (de massa ou segmentado), esta cobrança costuma chegar com mais intensidade. O posicionamento de alguns deles já é bastante conhecido, dado o engajamento de cada um. Se você cita o nome de Chico Buarque, Milton Nascimento ou Lobão, não precisa nem dizer quem cada um apoia, tão sabida é a preferência deles.

As declarações de apoio ou crítica são mais comuns em artistas e intelectuais de carreira já consolidada, com o couro já curtido para suportar o tiroteio no qual inevitavelmente se metem ao tornar público seu pensamento político ou ideológico. Os novos são mais reservados, numa prudência compreensível. Por tudo isso chama atenção o que fez a nova sensação da música popular brasileira, o ator, compositor e cantor performático pernambucano Johnny Hooker.

Em sua página no Facebook, domingo, ele escreveu uma virulenta tomada de posição. O texto integral:

“Eu só queria dizer para vocês que só vão impedir Dilma Rousseff, a presidenta do Brasil, mulher, militante sobrevivente da ditadura militar, mãe e avó, economista, reta, heroína, braba, séria, deusa, eleita por milhões e milhões de brasileiros por voto direto apesar de uma campanha midiática severa e massiva contra, sucessora indicada do incrível Luiz Inácio Lula da Silva, sob o meu cadáver.
Boa noite e boa sorte!”

Johnny Hooker tem 28 anos. Ganhou este ano o prêmio de melhor cantor popular na 26ª edição do Prêmio da Música Brasileira. Tem músicas em trilha de novela da Globo e em filme. É conhecido sobretudo pelo público jovem, com sucessos como “Alma sebosa” e “Amor marginal”. Se vocês nunca foram a um show dele, vão ao primeiro que aparecer. Se nunca o escutaram, corram para fazê-lo (há vários clipes disponíveis na internet). Vale a pena.

Mas não é a qualidade do trabalho dele que está em foco aqui, e sim o seu posicionamento. Para um rapaz cuja carreira está deslanchando, declarar-se a favor de uma presidente que tem 8% de aprovação, e da forma incisiva que ele o fez, não é o tipo de atitude que renda benefícios. Não há, portanto, oportunismo em seu gesto. O que há é aquilo que falamos no início deste texto – um ambiente em que de todos será cobrado um posicionamento, contra ou a favor. Os artistas e intelectuais até podem falar primeiro, mas cedo ou tarde a cobrança chegará para todos nós.
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