Tempo
de medo e solidariedade
Vital Nogueira
Nunca tivemos tanto medo, como agora.
Logo nós que nos aventuramos no espaço
exploramos o planeta,
dominamos a natureza e os animais,
criamos hierarquias sociais,
fazemos girar a economia
e oscilar a bolsa de valores.
Nunca tivemos tanto medo, como agora.
Os que fazem valer a força do Estado,
que arbitram a guerra e a paz,
que teorizam sobre a política, a filosofia e a
religião,
que proclamama supremacia da ciência e da
indústria,
que governam terra, mar e ar
se dão conta do desafio que um minúsculo ente lhes
impõe.
Nunca tivemos tanto medo, como agora.
Os que ontem abraçavam os amigos,
beijavam os entes queridos,
andavam de mãos dadas.
Agora são chamados a sedistanciar,
usar máscaras,
fazer da casa a sua prisão.
Nunca tivemos tanto medo, como agora.
Medo da crise sanitária e econômica,
medo de perder o emprego,
medo de não poder pagar a água, a luz, o aluguel.
medo de não ter comida,
medo de adoecer e de perder a vida.
Nunca tivemos tanto medo, como agora.
Nem tanta clareza de que o vírus nos iguala,
numas coisas e noutras não.
Afinal de contas, a peste não tem o condão
de abolir as diferenças etárias e sociais.
Para aplacar as diferenças, somente a força da
solidariedade.
[Ilustração: Arshile Gorky]
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