Num artigo publicado em 1956 – faz 60 anos – o
grande educador brasileiro Anísio Teixeira defendeu ideias e uma interpretação
da sociedade que se mantém nestes tempos turbulentos vividos por nosso país.
O artigo resultou de palestra proferida por ele no
Congresso Estadual de Educação do Estado de São Paulo, e a atualidade de suas
teses é inacreditável.
O editorial que o jornalão conservador O Globo
publicou neste domingo (24), sob o título “Crise força o fim do injusto ensino
superior gratuito” remete diretamente àquelas teses. E revelam a força que
ideias tão conservadoras e retrógradas mantêm na classe dominante brasileira,
acentuadas desde que o golpe de Estado em curso interrompeu a democratização do
Brasil e da educação brasileira, acentuadas desde 2003.
Jogando com as palavras, O Globo diz que a
educação gratuita em todos os níveis é uma “injustiça”. Esconde que, ao
assegurar a elevação educacional e cultural de todos, torna-os mais capazes
para exigir direitos iguais sem exceção. Este direito foi garantido, pela
primeira vez na história de nossas constituições, pela Carta Magna de 1988, e
se encontra sob cerrado ataque pela mídia conservadora e sobretudo pelas
mudanças constitucionais que o governo ilegítimo do impostor Michel Temer quer
aprovar para acabar com aquela obrigatoriedade.
“Para combater uma crise nunca vista, necessita-se
de ideias nunca aplicadas. Neste sentido, por que não aproveitar para acabar
com o ensino superior gratuito, também um mecanismo de injustiça social?”, diz
aquele editorial mistificador que vê a gratuidade do ensino superior como se
fosse um mecanismo concentrador de renda.
É contra essa péssima ideia conservadora que vale a
pena recordar as teses democráticas defendidas há 60 anos por educadores
progressistas e avançados. Sobretudo duas elas, que fundamentam a defesa do
ensino gratuito em todos os níveis, do elementar ao superior. A primeira, já
referida, diz respeito à necessária elevação cultural e educacional para que os
cidadãos de uma república sejam efetivamente iguais.
A outra, intimamente ligada à anterior, fala sobre
o atraso democrático, anacrônico e persistente, das velhas oligarquias que se
arrojam a comandar a política brasileira. Das quais O Globo é um
porta-voz renitente. Atraso que está na base daquilo que Teixeira chamou de
sociedade “dual”, em que há uma elite pequena que se julga apta para o mando, e
uma imensa maioria a quem caberia apenas obedecer e sujeitar-se.
O sistema “educacional” defendido por essa
oligarquia, reproduzido pelo editorial aqui comentado, tem o objetivo duplo de
criar líderes conservadores destinados ao mando, ao mesmo tempo em que procura
“adestrar” os demais para a subordinação e a obediência.
A permanência deste sistema “educacional”
excludente está na base da tentativa de eliminação do direito constitucional à
educação gratuita e de qualidade em todos os níveis. “Educação”, assim
entendida, só para os ricos que podem pagar e serão, depois de diplomados, os
herdeiros e continuadores da oligarquia.
Para os conservadores que, momentaneamente, dominam
o cenário político brasileiro, os avanços obtidos desde 2003 são ameaçadores e
devem ser anulados.
Afinal, os governos Lula e Dilma previam alcançar
em 10 anos a meta de 10% do PIB para a educação. O orçamento do Ministério da
Educação passou de cerca de R$ 35 bilhões em 2002 para quase R$ 102 bilhões em
2013. Isto é, foi multiplicado por três! Além disso, foram reservados recursos
do pré-sal para a educação; criadas 14 novas universidades e duplicado o número
de vagas nas federais. Foram beneficiados quase dois milhões de estudantes
através do Fies e quase 1,5 milhão de estudantes pelo ProUni.
Isso contraria a opinião conservadora segundo a
qual o ensino superior deve ser mantido como espaço de habilitação destinado
somente aos que tem dinheiro – como sempre foi no Brasil. E não espaços
democráticos que possam ser frequentados pelos filhos das famílias mais pobres
e que, assim, capacitam-se para ampliar e consolidar a democracia.
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