Por Luís
Nassif, no Jornal GGN
A estratégia
do governo interino está cada vez mais clara. É uma estratégia de assalto aos
cofres públicos, com dois movimentos devidamente agendados no tempo: no
primeiro, este ano, saca-se contra o presente na esperança de, no segundo
movimento, pagar a conta na forma de redução dos gastos com educação e saúde.
Peça
1 - Saque contra o presente - É um
conjunto de medidas que pressionarão ainda mais a dívida pública.
Assalto ao orçamento
No caso do
mundo político, a ampliação do déficit público para garantir as emendas
individuais dos parlamentares – aquelas em que eles apresentam o projeto a ser
bancado e o dinheiro já vem carimbado – em detrimento dos projetos em que os
beneficiários são difusos. Ressalva apenas para o Bolsa Família, por conta dos
seus impactos nas eleições municipais especialmente do Nordeste.
Segundo
reportagem de Gustavo Patu e Daniele lima, da Folha (http://goo.gl/r0mgcc),
apenas em junho foram destinados R$ 669 milhões para emendas parlamentares
individuais, contra R$ 57 milhões de junho do ano passado. A estratégia
do governo interino é liberar de R$ 3 milhões a R$ 4 milhões para cada
parlamentar pavimentar as próximas eleições municipais.
Assalto à dívida pública
Para o
mercado, a desaceleração da queda da taxa Selic e a volta do binômio juros
altos-câmbio baixo. Ainda conseguirão legitimar as propostas de auditoria da
dívida interna.
Assalto na privatização
Nos negócios
privados, uma privatização a toque de caixa, queima a seco, sem nenhuma
estratégia de valorização prévia dos ativos ou de visão estratégica setorial.
Esse modelo está sendo acelerado com o projeto de lei Tasso Jereissati –
praticamente impedindo a recuperação de empresas em dificuldades – e a
tentativa da equipe econômica de retirar os direitos trabalhistas da relação de
credores preferenciais, em caso de venda de ativos.
Peça central
desse jogo é o fim do sistema de partilha no pré-sal, a maior tacada do
período.
O nível de atividade
A apreciação
do câmbio abortará a recuperação da indústria via exportações. Em
contrapartida, barateará as importações, ajudando a controlar a inflação. Isso,
mais alguma distensão nos gastos públicos, trará algum alívio na frente
econômica nos próximos meses. Repete-se pela enésima vez o populismo cambial
das eras FHC, Lula e Dilma, com um novo voo de galinha da economia.
Peça
2 – saque contra o futuro - Em
troca dessas liberalidades, a encomenda a ser entregue é o tal limite para
gastos orçamentários que, na prática, significará congelar o orçamento nos mais
baixos níveis de gastos das últimas décadas, impedindo até a recuperação
futura, com a volta do crescimento do PIB. E também medidas irreversíveis em
relação ao pré-sal, à Petrobras e às empresas públicas.
Para que os
investidores acreditem na promessa, ela terá que ser viável no longo prazo,
resistir a eleições e a pressões da população sobre seus parlamentares,
resistir à falta de legitimidade e às denúncias contra o governo interino.
E garantir
isso, quem há de?
Há dois
imensos desafios pela frente: as investigações da Lava Jato e as eleições de
2018.
Peça
3 – as vulnerabilidades da turma de Temer - A mídia anda sempre em um fio da navalha, entre a instrumentalização
da notícia e a credibilidade perante seus leitores. Nas últimas décadas a mídia
atravessou inúmeras vezes a linha vermelha. Mas nada embute risco maior do que
fechar os olhos às manobras dos atuais inquilinos do poder. Ainda mais devido
ao fato de terem sido alçados ao comando do país por uma cruzada supostamente
moralizadora.
Numa ponta, há
o apoio ao governo interino. Na outra, o olhar vigilante de seus leitores.
Entre ambos, as verbas da Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da
República). Quanto custa colocar a credibilidade em risco? Uma coisa era
manipular a credibilidade para algo simpático aos olhos dos leitores: a
demonização do PT. Outra, distinta, é arriscar a ser vista como cúmplice do
grupo de Temer.
Por enquanto,
a estratégia tem sido de soltar um ou outro petardo, mas sem insistir na
cobrança. Depois, conceder um período de graça aos suspeitos.
É o caso de
Eliseu Padilha. Desde que se tornou o dono do cofre mais cobiçado – as verbas
publicitárias de todas as estatais – passou a ser poupado pela mídia. Mas é tão
notoriamente suspeito que chegará o momento que a mídia não poderá mais deixar
passar em branco as denúncias. Principalmente porque, na outra ponta, há a
parceria com a Lava Jato, que não parece disposta a refluir contra o PMDB,
mesmo após a queda da Dilma.
Peça
4: o fator Lava Jato - O embate entre o establishment e
a Lava Jato foi bem descrito pelo cientista político Marcos Nobre em artigo
no Valor(http://goo.gl/wj4hjD).
1.
O primeiro ataque foi do Procurador Geral da República Rodrigo Janot, com a
divulgação dos grampos de Sérgio Machado comprometendo toda a cúpula do PMDB.
2.
Com a negativa do STF de autorizar as prisões – e a constatação de que Janot
tinha pouco a apresentar além das conversas grampeadas – houve o contra-ataque
e a tentativa de pedir seu impedimento, além do projeto de lei visando
penalizar quem der início à persecução penal sem justa causa e a retirada da
urgência das dez medidas do Ministério Público contra a corrupção.
3.
A reação foi a operação de São Paulo ordenando a prisão de várias pessoas,
dentre as quais o ex-Ministro Paulo Bernardo.
4.
O establishment reagiu com a decisão do Ministro Dias Toffoli de ordenar a
libertação de Bernardo, acusando a Polícia Federal de ter invadido a casa de
uma senadora, com foro privilegiado. Limitar a possibilidade de se decretar a
prisão de pessoas sem privilégio de foro significa inibir ainda mais a
possibilidade de prender pessoas com privilégio de foro.
5.
Novo contra-ataque na última operação, com a prisão de pessoas que haviam sido
detidas na operação anterior e artigos na imprensa de procuradores da Lava Jato
desancando Toffoli.
Peça
5 – o fator Darth Vader - A
participação de Toffoli revela que a reação contra a Lava Jato tem sido
liderada, fundamentalmente, pelo Ministro Gilmar Mendes. Toffoli jamais ousaria
uma medida com tal repercussão política, se não tivesse o endosso total de seu
guru.
O jantar de
terça feira passada, entre Gilmar, Temer, o Ministro João Otávio de Noronha (do
STJ), Dias Toffoli, José Serra e Aécio Neves, provavelmente teve mais
ingredientes do que acepipes e vinhos finos.
Dentre todos
os personagens do mundo político e jurídico tucanos, apenas Gilmar tem peito e
fôlego para as grandes jogadas táticas.
Não se
surpreenda se, proximamente, a Lava Jato ingressar na sua guerra final contra o
Darth Vader – como Gilmar é tratado em alguns círculos do Ministério Público.
Peça
6 – o fator Temer - A cada dia que passa, mais o
interino Michel Temer é picado pela mosca azul. O curto período de interinato
mostrou uma personalidade volátil , que caminha conduzida pelos ventos do
momento.
A exaustão com
a crise o fortalece no meio empresarial e midiático. É a velha máxima do ruim
com ele, pior sem ele. A consolidação de Temer passa, inevitavelmente, por
jogar ao mar sua velha turma e se aproximar cada vez mais do figurino PSDB. É
nesse contexto que o jantar de terça fica repleto de significados.
Esse aggiornamento de
Temer não se dará sem sangue e ranger de dentes. Eduardo Cunha continua sendo
uma bomba ambulante. E alguns movimentos recentes de Romero Jucá – tentando
defender Janot das arremetidas de Renan – indicam que já estão sentindo o óleo
sendo esquentado na frigideira.
E aí se chega
à incógnita de 2018, com os limites de gastos surtindo efeito nos serviços da
saúde, educação, segurança; e com a recuperação econômica mais uma vez sendo
vôo de galinha, abortado pela apreciação cambial e pela manutenção da política
monetária de Ilan Golfjan. Será provavelmente vitoriosa a candidatura que
basear sua plataforma no desmonte dos malfeitos do período.
Quem paga a
aposta?
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