12 março 2009

Coluna semanal no portal Vermelho

A santa, a procissão e a reza
Luciano Siqueira

Não sou entendido na matéria, restam-me apenas fragmentárias recordações das festas religiosas da infância no meu bairro, Lagoa Seca, em Natal. Mas acredito que não basta conhecer a santa, é preciso saber a reza para que a gente participe com entusiasmo da procissão. Salvo se for para entrar no cortejo por pura obrigação.

E não será por obrigação que os partidos à esquerda na coalizão governista se integrarão à campanha de uma possível candidatura do PT à sucessão de Lula. A ministra Dilma Rousseff, escolhida pelo presidente, reúne sob muitos títulos condições de encarar a missão. Honradez, eficiência administrativa, compromisso com o povo e boas idéias sobre os rumos do país não lhe faltam. Aliás, num governo dual e marcado por permanente conflito, aberto ou velado, entre “desenvolvimentistas” e “monetaristas”, a ministra tem marchado ao lado dos primeiros – o que inspira boa dose de confiança.

Então, a santa a gente conhece e nada tem contra. Entretanto, o seu partido, o PT, tem se precipitado bastante ao vincar a todo instante que o novo aliado (“primordial”, no dizer de alguns) é o PMDB, afastando a um segundo plano o PSB e o PCdoB, estes co-responsáveis pela definição das linhas de governo desde que o presidente era ainda candidato.

Bom, a política é assim mesmo, diria o leitor; é como uma gangorra, segundo o velho jargão. Mas não é bem assim. Que o PMDB tenha se convertido em importante aliado, sobretudo agora que venceu os pleitos para as mesas da Câmara e do Senado e assim tenha um papel decisivo na governabilidade, ninguém contesta. E a esquerda, o PCdoB em especial, sempre instou o PT a valorizar a aliança com os peemedebistas para alterar a correlação de forças em favor do governo. Porém o entrosamento quase promíscuo (que a palavra não pese em demasia) entre petistas e peemedebistas pode expressar um reforço do centro moderado (para não dizer conservador) e um enfraquecimento relativo das correntes mais avançadas, que pugnam pelo aprofundamento das mudanças em curso no país.

Isto se traduz no modo atabalhoado como próceres petistas têm apresentado a pretendida candidatura da ministra: como fato consumado. Obviamente que assim não dá. Os desafios que se colocam diante de nossas forças em 2010 vão além de vencer eleitoralmente o pleito; implicam um programa de ação pós-Lula que dê conta das novas exigências postas na ordem do dia em busca de uma alternativa progressista e soberana para o desenvolvimento do país. É a reza que precisa ser explicitada, melhor dizendo, formulada a muitas mãos e com a contribuição indispensável da esquerda - para que todos possam se incorporar à procissão, quer dizer, à futura campanha presidencial com fé, disposição de luta e confiança.

3 comentários:

Anônimo disse...

O PT é assim mesmo e não aprende nunca a respeitar os aliados, e vai ser assim até o dia em que amargar uma grande derrota.
Analúcia Vitorino

Anônimo disse...

Essa sua opinião tem aminha concordância, pois cada vez mais é necessário no Brasil se discutir as idéias e os compromissos dos candidatos para que o povo possa cobrar depois com conhecimento de causa.
Feliciano Tavares

Anônimo disse...

Seu argumento é claro e esclarecedor, deixa a gente por dentro dos meandros da política e ainda faz a gente pensar, poarabéns. Conte comigo.
Aristeu Novaes