29 outubro 2015

Flexibilidade tática

Sem manual de instruções

Luciano Siqueira, no portal Vermelho

“Mas a vida, a vida, a vida,/a vida só é possível/reinventada”, ensina Cecília Meireles. Entretanto, muita gente gostaria de ter um “manual de instruções” com fórmulas prontas para cada nova situação, tamanha a perplexidade que experimenta diante do evolver multifacetado da vida.
Na política, a gente se depara com grupos e indivíduos que teimam em arengar com a maldita realidade concreta, que muda a todo instante.
Seja na tentativa de repetir modelos que deram certo em outra conjuntura, seja na persistência de posições adotadas antes e que agora já não dão conta dos novos desafios.
Do ponto de vista estratégico, o PCdoB, já faz tempo, livrou-se do esquematismo (que ainda persiste no movimento internacional), que se traduz na crença em “modelos” experimentados em países que alcançaram o socialismo – ainda que evidente seja a imensa diferença entre realidades sociais e épocas.
Do ponto de vista tático, idem. Desde a década de sessenta do século passado, os comunistas brasileiros vêm acumulando expressivo saber teórico e político mediante a abordagem da luta com “as quatro patas fincadas na realidade”, como diria Pleckhanov.
Mas tanto em nossas fileiras, como entre aliados à esquerda, verifica-se o apego a certas posições como uma espécie de norma pétrea.
O conturbado cenário nacional fornece o caldo de cultura para tanto.
O pensamento mediano há que reconhecer que, a despeito de divergências acerca dos rumos que o Brasil deve tomar a defesa da democracia – consubstanciada na preservação do mandato da presidenta Dilma – é hoje o “x” do problema.
Porém há como que uma névoa, alimentada pela estreiteza e pelo sectarismo, que impede certas corrente políticas de perceberem isso.
Muitos confundem o ajuste fiscal, por exemplo, cujos fundamentos se inspiram na macropolítica econômica de cunho neoliberal, como se fora ‘a política’ de governo da presidenta Dilma, e não uma manobra temporária, destinada a equilibrar as contas públicas.
Daí as bandeiras específicas de cada movimento e segmento social – em geral legítimas – passarem a ser erguidas em primeiro plano, subestimando a luta maior.
O mesmo se ensaia nos preparativos para as eleições municipais de 2016.
Para alguns, difícil é navegar no mar revolto que é a multiplicidade de alianças concertadas nos planos nacional, estadual e municipal, aparentemente antagônicas.
Aqui e acolá, ouve-se a recusa a coalizão com partidos que não têm a mesma posição sobre a questão nacional, mesmo que o preço a ser pago seja o isolamento.
De aliados à esquerda, a repetição do discurso pronunciado no pleito de 2014, como se ali houvesse sido lavrado um Livro Sagrado a ser obedecido a qualquer custo.
Aos que buscam um padrão de desenvolvimento do País que nos encaminhe à emancipação civilizatória através do socialismo, cabe o descortino tático e a busca do acúmulo de forças conforme a realidade permite.
O Programa Socialista é o guia, sem um manual de instruções que nos livre da análise da situação concreta e da astúcia tática.
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