Sem manual de instruções
Luciano Siqueira, no portal Vermelho
“Mas a vida, a vida, a vida,/a vida só é possível/reinventada”, ensina
Cecília Meireles. Entretanto, muita gente gostaria de ter um “manual de
instruções” com fórmulas prontas para cada nova situação, tamanha a
perplexidade que experimenta diante do evolver multifacetado da vida.
Na política, a gente se depara com grupos e indivíduos
que teimam em arengar com a maldita realidade concreta, que muda a todo
instante.
Seja na tentativa de repetir modelos que deram certo em outra
conjuntura, seja na persistência de posições adotadas antes e que agora já não
dão conta dos novos desafios.
Do ponto de vista estratégico, o PCdoB, já faz tempo, livrou-se do
esquematismo (que ainda persiste no movimento internacional), que se traduz na
crença em “modelos” experimentados em países que alcançaram o socialismo –
ainda que evidente seja a imensa diferença entre realidades sociais e épocas.
Do ponto de vista tático, idem. Desde a década de sessenta do século
passado, os comunistas brasileiros vêm acumulando expressivo saber teórico e
político mediante a abordagem da luta com “as quatro patas fincadas na
realidade”, como diria Pleckhanov.
Mas tanto em nossas fileiras, como entre aliados à esquerda, verifica-se
o apego a certas posições como uma espécie de norma pétrea.
O conturbado cenário nacional fornece o caldo de cultura para tanto.
O pensamento mediano há que reconhecer que, a despeito de
divergências acerca dos rumos que o Brasil deve tomar a defesa da democracia –
consubstanciada na preservação do mandato da presidenta Dilma – é hoje o “x” do
problema.
Porém há como que uma névoa, alimentada pela estreiteza e pelo
sectarismo, que impede certas corrente políticas de perceberem isso.
Muitos confundem o ajuste fiscal, por exemplo, cujos fundamentos se
inspiram na macropolítica econômica de cunho neoliberal, como se fora ‘a política’
de governo da presidenta Dilma, e não uma manobra temporária, destinada a
equilibrar as contas públicas.
Daí as bandeiras específicas de cada movimento e segmento social –
em geral legítimas – passarem a ser erguidas em primeiro plano, subestimando a
luta maior.
O mesmo se ensaia nos preparativos para as eleições municipais de
2016.
Para alguns, difícil é navegar no mar revolto que é a multiplicidade
de alianças concertadas nos planos nacional, estadual e municipal, aparentemente
antagônicas.
Aqui e acolá, ouve-se a recusa a coalizão com partidos que não têm a
mesma posição sobre a questão nacional, mesmo que o preço a ser pago seja o
isolamento.
De aliados à esquerda, a repetição do discurso pronunciado no pleito
de 2014, como se ali houvesse sido lavrado um Livro Sagrado a ser obedecido a
qualquer custo.
Aos que buscam um padrão de desenvolvimento do País que nos encaminhe
à emancipação civilizatória através do socialismo, cabe o descortino tático e a
busca do acúmulo de forças conforme a realidade permite.
O Programa Socialista é o guia, sem um manual de instruções que nos
livre da análise da situação concreta e da astúcia tática.
Leia
mais sobre temas da atualidade: http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário