Xadrez do homem que
delatou Temer
Luis Nassif,
Jornal GGN
Introdução – características das
grandes conspirações
Conspirações políticas não se montam
com o controle completo e acabado de todas as variáveis, obedecendo a um manual
previamente definido.
Quando atua sobre realidades
complexas, como o cenário sócio-político-econômico de um país, não há controle
sobre todas as variáveis nem clareza sobre os desdobramentos dos grandes
lances.
Jogam-se os dados, então, em cima das
circunstâncias do momento, tendo apenas uma expectativa sobre seus
desdobramentos.
Digo isso, para tentar avançar um
pouco no Xadrez de Marcelo Calero, o ex-Ministro da Cultura que denunciou
Michel Temer de pressioná-lo em favor de benefícios pessoais a Geddel Viria
Lima.
Peça 1 – jabuti não
sobe em árvore
Em 2010 Calero foi candidato a
deputado federal pelo PSDB do Rio. Aluno de Direito da UERJ (Universidade
Estadual do Rio de Janeiro) sempre chamou a atenção pela extravagância, mas
jamais pela vocação do suicídio político. Fazia parte do time de yuppies que
ascendeu na gestão Eduardo Paes.
Reagiu contra as jogadas de Geddel
Vieira Lima e, provavelmente, se assustou quando este passou a jogar balões de
ensaio para setoristas palacianos. Em tempos de grampo e de prisões
indiscriminadas, jacaré nada de costas. E aí resolveu pedir demissão e
denunciar as pressões.
Até aí, se tinha um Ministro neófito
resistindo às investidas de boca de jacaré e gerando uma crise política
restrita. Mas o inacreditável amadorismo político de Michel Temer transformou
em início de incêndio, ao não tomar a decisão óbvia e imediata de demitir
Geddel.
Aí ocorre o lance seguinte, a
denúncia contra o próprio Temer na Polícia Federal, com o depoimento vazando
para a empresa mal chegou no STF (Supremo Tribunal Federal). Imaginar espontaneidade
em lance dessa amplitude é tão improvável quanto acreditar que jabuti sobe em
árvore.
O desafio é saber quem pendurou o
jabuti na árvore.
Peça 2 – o lance do partido da mídia
A melhor maneira de garimpar os
antecedentes é através de um balanço rápido da repercussão:
· O
Jornal Nacional investiu contra Michel Temer com a mesma gana com que atacava
Lula.
·
Época, o braço mais manipulável das Organizações Globo, depois da Globonews,
registrou Calero na capa, o sir Galahad do novo, em contraposição ao velho
Geddel Vieira Lima.
Folha e Estadão vão a reboque. E
todos trataram de poupar Eliseu Padilha, principal avalista do pacote de apoio
à mídia.
No mesmo dia, em que o escândalo
Geddel expunha o vácuo Temer, FHC aparecia nos jornais online – e no Jornal
Nacional – falando do orgulho de ser PSDB, o PSDB representando o novo etc. E,
como bom malaco, afiançando, com ar confidente, que a presidência seria de
alguma das lideranças presentes. Mas não dele, é claro.
É difícil uma conspiração discreta
com FHC porque ele não consegue conter a euforia nos momentos que antecedem o
desfecho.
A delação de Calero serve, portanto,
para dois objetivos:
Objetivo 1 – enfraquecer substancialmente a camarilha de Temer.
Objetivo 2 – recolocar FHC no centro das articulações, como a alternativa
para a travessia até 2018.
As circunstâncias ditarão os próximos
lances, que poderá ser um Temer sem camarilha, sendo tutelado pelo FHC; ou um
FHC assumindo a presidência para tocar o barco até 2018, tendo dois trabalhos a
entregar:
1. Completar
o desmonte da Constituição de 1988, conquistando o limite de despesas e a
reforma trabalhista e da Previdência.
2. Implantar
o parlamentarismo, ou outras alternativas de esvaziamento do poder Executivo e
de poder do voto popular.
Peça 3 – uma explicação para a capa
de Veja
Há dúvidas de monta sobre a capa de
Veja, com a chamada superior informando sobre as acusações contra José Serra e
Geraldo Alckmin nas delações da Odebrecht.
Três hipóteses foram aventadas:
1. Veja começou
a fazer jornalismo.
Não bate com a insuficiência de dados
da reportagem. A rigor, há uma única informação, sobre a maneira como a
Odebrecht repassava o dinheiro do caixa 2 para Serra através do banqueiro
Ronaldo César Coelho.
2. Dar um
chega-prá-lá nos três presidenciáveis atuais do PSDB,.
Para deixar claro que o momento não é
de disputa, mas de coesão em torno de FHC.
3. Arrumar um
álibi para os três.
É uma teoria um pouco mais complexa,
mas que faz sentido.
Sabia-se que haveria dois tipos de
delação das empreiteiras. A Odebrecht se concentraria nos financiamentos de
campanha; a OAS nos casos de corrupção para enriquecimento pessoal.
Aì houve a intervenção preciosa do
Procurador Geral da República Rodrigo Janot, cancelando as negociações com a
OAS e provocando um enorme alívio nos advogados de Serra.
Com exceção de Geraldo Alckmin, há
indícios robustos de que houve enriquecimento pessoal tanto de Serra quanto
Aécio. Focando-se nos pecados menores, confere-se um álibi de isenção à Lava
Jato e à mídia e, ao mesmo tempo, desvia-se o foco das investigações dos crimes
mais graves.
Peça 4 – o enfrentamento da crise e o
fator FHC
O quadro que se apresenta, hoje em
dia, é ameaçador.
Na base, o agravamento da crise
econômica, expandindo-se por estados e municípios. Os cortes nas políticas
sociais, criando situação de fome para parcela expressiva dos beneficiários do
Bolsa Família. Um endividamento circular das empresas, travando os negócios. E
os grandes investimentos públicos paralisados.
Em cima desse quadro, um conjunto de
medidas pró-cíclicas, agravando a crise econômica.
a.
O arrocho fiscal, aprofundando a recessão e ampliando o déficit fiscal pela
redução da receita.
b.
A política monetária com taxa básica a 14%, inviabilizando qualquer
possibilidade de novos investimentos.
c.
A política cambial provocando a apreciação do real e abortando a recuperação
das exportações.
d.
O trancamento do crédito nos bancos comerciais. Não há crédito mais e
trabalha-se com extrema cautela a rolagem das dívidas das empresas inadimplentes.
e.
A retirada de R$ 100 bilhões do BNDES, em um momento em que o endividamento
circular das empresas paralisa a economia.
Em um ponto qualquer do futuro,
haverá a necessidade de uma mudança de 180o na política
econômica, com um choque fiscal – ampliando despesas e investimentos públicos
-, flexibilização das políticas monetária e creditícia.
Um trabalho de recuperação da
economia exigiria um conjunto de qualidades que falta a FHC:
1. A
proatividade para conduzir os diversos instrumentos de recuperação da economia.
Nos seus 8 anos jamais se envolveu no
dia-a-dia da gestão política e econômica.
2. Habilidade
política para recompor a base de apoio.
Em seu tempo de presidência, o varejo
da política era garantido justamente pelo quarteto que compõem a camarilha de
Temer: Geddel, Padilha, Moreira Franco e o próprio Temer. No Congresso, o PSDB
atual regurgita ódio e, no campo das ideias, é um mero cavalo das ideias
mercadistas.
3.
Credibilidade para conduzir um pacto nacional.
Em todo o período de conspiração, FHC
sempre estimulou a radicalização e o golpe. Jamais conseguiu entender que o
único papel engrandecedor que lhe caberia seria o de um futuro mediador, no
caso de recrudescimento da crise política. Pensa pequeno.
Peça 5 – o jogo de forças pós-Temer
Leve-se em conta que a fritura de
Temer promoverá um racha na frente golpista.
A frente é composta pelo PMDB de
Temer, PMDB dos caciques nordestinos, PSDB, centrão, PGR- Lava Jato e mídia.
A implosão do governo Temer
significará restringir o grupo vitorioso e enfrentar, no Congresso, a reação do
PMDB e do chamado centrão, além da oposição da esquerda.
Os 200 e tantos nomes da delação da
Odebrecht não reporão de forma alguma a isonomia nas investigações da Lava
Jato, pelo fato de incluir políticos tucanos nas delações. Pois a escolha dos
investigados caberá exclusivamente a Janot.
O movimento de fritura de Temer
acirrará mais as contradições do golpe, até que o aprofundamento da crise
promova ou a conciliação ou o caos.
E aí será possível um pacto entre FHC
e Lula.
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