21 fevereiro 2025

Enio Lins opina

Uma denúncia muito aguardada, e que chega para ficar na história
Enio Lins  

CONFIRMANDO O ÓBVIO, o inominável está indiciado por tentativa de golpe de Estado. Embora uns e outros gastem a saliva na vã tentativa de dissolver a solidez de maçaranduba das evidências ululantes e provas irrefutáveis sobre as tentativas de golpe de Estado patrocinadas pelo ex-capitão, a parte mais expressiva de sua quadrilha está contemplada no processo. 33 meliantes acompanham o mito na denúncia apresentada, terça-feira, pela Procuradoria Geral da República.

JAIR MESSIAS, VULGO “O MITO”, verdade seja reconhecida, nunca jamais – em tempo algum – havia negado seus ideais autoritários. Sempre assumiu seu instinto perverso, sua índole terrorista e seu projeto golpista. Esses foram os ingredientes essenciais, autênticos, usados sem moderação ao longo de seis décadas, na construção de um personagem. Isso desde1988, quando de sua primeira eleição, como vereador, no Rio de Janeiro. Sempre foram sinceras suas defesas do golpe, e sua devoção à ícones da violência e da covardia (como o coronel Ustra, torturador, promovido, post mortem, ao posto de marechal). Às vésperas do indiciamento formal, o mito miou, arranhou renegar toda uma vida pública de declarações explosivas, e sinceronas, sobre sua aversão à democracia, e à sua busca pela reimplanta&c cedil;ão de uma ditadura militar no Brasil. A denúncia, feita pela Procuradoria Geral da República, apenas dá seguimento ao indispensável processo – próprio ao Estado Democrático de Direito – sobre uma tentativa de golpe de Estado. Na real. Sem surpresas, e com provas em profusão.

MUITO SE COMENTARÁ SOBRE esse processo, obviamente. Esta coluna será um dos espaços onde será pauta recorrente. Naturalmente. Afinal, é a primeira vez em toda história do Brasil que uma tentativa de golpe de Estado vai fluir nos tribunais, percorrendo, de forma transparente e constitucional, mares nunca dantes navegados por naus, ou jangadas, carregadas com inquéritos desta natureza. A história brasileira é uma história de golpes jamais punidos. Já passou da hora de mudar essa escrita. Agora, mesmo com atraso, é momento de dar um novo rumo e interromper essa sequência ininterrupta de “tentativa de golpe – deixa pra lá”. Bater nesta tecla se faz necessário pelo fato de que as forças golpistas seguem vivas, ricas, atuantes e com grande base parlamentar, e se movimentam na tentativa de preservar a impunidade como patrimônio hist&oac ute;rico nacional. E, nos quartéis, há quem queira continuar a ensinar uma velha lição: “tentar golpes não dá em nada, nem atrapalha a carreira de ninguém, e quem não aderir às quarteladas é ‘melancia’ e será alvo de perseguição interna e eterna, talkey?”.

ENSINA A HISTÓRIA BRASILEIRA: 1) golpista não punido faz escola; 2) não existe tentativa de golpe sem participação de militares; 3) militar que se opor às tentativas de golpe será perseguido, dentro dos quartéis, pelos colegas golpistas no caso estes não sejam processados; 4) golpistas nunca desistem. A denúncia da PGR é uma importante etapa nesse caminho inovador de fazer valer as leis e de se apurar, julgar e punir tentativas de golpe – mas, insisto: a parada não está resolvida, a história está sendo escrita no chão, dentro das linhas da Constituição (que são bem mais de quatro) e teremos várias outras etapas adiante. Não se esqueçam de Juscelino Kubitscheck e sua bondade inconsequente de perdoar os envolvidos em duas quarteladas frustradas (Jacareacanga, em 1956, e Aragarças, em 1959). Sobre o q uesito particular da questão militar, voltaremos noutro dia, pois o assunto merece a lembrança de detalhes não tão pequenos nessa memória trágica. Por ora, fiquemos no aplauso à PGR por sua coragem cívica e pelo passo decisivo dado em defesa do Estado Democrático de Direito.


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