28 junho 2007

Reforma abortada

No Vermelho, por Cláudio Gonzalez:
Maioria conservadora derruba pilares da reforma política
A Câmara dos Deputados iniciou na noite desta quarta-feira (27) a votação da reforma política. A primeira votação, porém, sinalizou que uma maioria conservadora do parlamento teme mudar as regras do jogo eleitoral. Liderados pelo PSDB e por caciques políticos personalistas aos quais não interessa o fortalecimento dos partidos, 240 deputados votaram contra a apreciação, pelo plenário da Câmara, de uma emenda aglutinativa que tentava garantir alguns avanços na reforma política sem, no entanto, mudar radicalmente o sistema eleitoral. O resultado da votação, que acabou enterrando em seguida a proposta de lista fechada, inviabilizou também a idéia de financiamento público de campanha: os dois principais pilares da reforma política.

A emenda aglutinativa apresentada por diversos líderes em relação ao texto do relator Ronaldo Caiado (DEM-GO) para o Projeto de Lei 1210/07, da reforma política, contava com o apoio formal de quatro partidos (PT, PMDB, DEM e PCdoB). Os apoiadores da emenda acreditavam que o conjunto das bancadas que referendaram a emenda teria maioria no plenário em torno de 250 votos (para aprovar o projeto), contando com os votos do PT, DEM, PCdoB, PMDB, PSB e dissidências do PSDB e outros.

Mas a ausência de 70 deputados na votação, somada às dissidências nas bancadas que teoricamente deveriam apoiar o projeto, fez com que a vantagem numérica se invertesse a favor dos que combatem a reforma política. Assim, o requerimento do PMDB que pedia preferência de votação à emenda substitutiva aglutinativa foi rejeitado por 240 votos a 203.

A emenda propunha um sistema híbrido de escolha nas eleições proporcionais. Metade das vagas a que o partido ou federação partidária teria direito seria preenchida obedecendo a ordem da lista apresentada. A outra metade ficaria com os candidatos dessa lista mais votados individualmente pelo eleitor.

Quanto ao financiamento de campanha, o sistema também seria misto, com recursos públicos e recursos privados arrecadados de pessoas físicas.

Com a rejeição do requerimento do PMDB, todos os itens da emenda aglutinativa deixaram de ser apreciados pelo plenário e a questão da lista preordenada acabou sendo definitivamente rechaçada.

Argumentos - O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que atuou como porta-voz dos setores contrários à reforma política, criticou os parlamentares que destacaram a corrupção e o poder econômico na eleição para o Congresso para defender o financiamento público de campanha. "Eu e muitos outros parlamentares fomos eleitos pelo suor e pelo nosso sacrifício. Aqueles que nos acusam podem ter sido eleitos assim. Nesse caso, que saiam do Parlamento", disse.

Faria de Sá, que apresentou requerimento, rejeitado pelo Plenário, para retirada de pauta do Projeto de Lei 1210/07, da reforma política, criticou o financiamento público. No seu entender, essa medida tiraria o dinheiro destinado a tudo o mais que o País precisa. Ele também afirmou que, se a reforma for aprovada, fará de cobaia os vereadores e prefeitos na eleição do ano que vem.

Já um dos autores da emenda aglutinativa, o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), disse que não há sistema ideal nem reforma boa em si mesma. Para ele, o sistema híbrido representa "o diálogo do sonho com o possível e foi proposto a partir das necessidades históricas do País". Ele disse que o sistema misto é o que vigora na Alemanha, na França e na Itália.

Votação fatiada - Depois da recusa do Plenário em votar o sistema híbrido, o plenário aprovou requerimento do PR para a votação do Projeto de Lei 1210/07 por grupos de artigos, ou seja, de forma fatiada.

Como o primeiro grupo a ir em votação foi o referente à lista fechada para as eleições proporcionais, constante do substitutivo do deputado Ronaldo Caiado, a tendência demonstrada desde o início dos debates foi a da rejeição desse item.

O resultado da votação, ocorrida já no final da sessão, por volta das 22h30, confirmou a recusa da maioria quanto a essa importante mudança na legislação eleitoral. A proposta de lista fechada tão enfaticamente defendida pelo relator Ronaldo Caiado foi derrotada por 252 contra a lista, 181 votos a favor da lista e 3 abstenções. No total, 436 deputados votaram.

Os demais itens da reforma política, como a fidelidade partidária e o fim das coligações proporcionais devem ser apreciados na próxima semana.

Medo - O medo foi um elemento decisivo para a derrota de uma proposta de reforma política mais avançada.

De um lado, o PSDB teme que a adoção das listas preordenadas e o financiamento público fortaleça partidos mais orgânicos, sobretudo os de esquerda como o PT, PCdoB, PSOL, entre outros. No mesmo sentido, políticos personalistas, caciques regionais e parlamentares sem apego às estruturas partidárias temem que as mudanças nas regras eleitorais lhes tirem prestígio e poder de barganha junto ao eleitorado e sobretudo junto a lideranças empresariais. Não seria exagerado também afirmar que uma parte dos deputados teme não poder mais usufruir de benefícios ilícitos que o atual sistema eleitoral proporciona. Usando uma expressão muito popular, pode-se dizer que a maioria conservadora do parlamento ficou com medo de ''perder a boquinha''.

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