08 junho 2007

DESTAQUE DO DIA


Reencontro com Beto
Em 2005, quando visitamos pela primeira vez a China, estivemos na Churrascaria Latina e encontramos Beto - um cearense criado no Rio de Janeiro, há pouco mais de um ano no comando da cozinha do restaurante. Escrevemos essa crônica, transcrita abaixo, mais tarde incluída no livro "O Brasil é Verde-Amarelo - 65 Crônicas Políticas", publicado pela Editora Anita Garibaldi.

Hoje, dois anos após, reencontramos Beto com a mesma verve de antes, agora feliz porque conseguiu trazer para Shangai a esposa Marise e o filho Douglas.


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Beto de Shanghai

Difícil escrever sobre a China, esse imenso país de um bilhão e trezentos milhões de habitantes que constrói, a seu modo, as bases objetivas e subjetivas para a sociedade socialista. Aqui, onde nos encontramos, numa estada de duas semanas, em missão oficial da Prefeitura do Recife, tudo é instigante. O crescimento se dá em todas as direções, em ritmo acelerado, numa verdadeira orgia de trabalho. Guanghzou, Hanghzou, Shanghai e Beijing – cidades que visitamos pela primeira vez – causam tamanho impacto que não dá para dividir com vocês, de pronto, as impressões que colhemos do que vimos e do que conversamos com autoridades e técnicos de governos locais e com o diretor geral para a América Latina e o Caribe do Departamento Internacional do Comitê Central do Partido Comunista, Wang Hua (que nos ofereceu um jantar e com quem dialogamos sobre os complexos problemas teóricos e políticos da transição do capitalismo ao socialismo e sobre a situação brasileira e latino-americana).

É preciso esperar que caiam as fichas – o que deverá acontecer, pouco a pouco, no retorno ao Brasil.

Porém um brasileiro rouba a cena – e é impossível deixar de falar dele agora. Trata-se de Beto, cearense de nascença, criado no Rio de Janeiro, há um ano e meio em Shangai, onde comanda a cozinha da churrascaria Latina, numa das áreas centrais da cidade. Deixou a esposa e o filho de seis meses no Rio em troca de um salário mensal de mil dólares – dos quais envia a metade para a família, duzentos gasta com moradia e outras necessidades pessoais e trezentos poupa em função de projetos futuros.

A saga de Beto tem um nome: o brasileiro é antes de tudo um corajoso. Pois além da arte culinária e boa dose de saudável malícia, esse moreno jovial de apenas quarenta anos demonstra sobretudo coragem. Topou enfrentar um mundo inteiramente desconhecido, sem falar sequer uma palavra do idioma local, tendo que se comunicar com os outros quase sessenta funcionários através da mímica. Agora já fala “chinglês”. Hábil, diz que só paulatinamente foi alterando o sabor e as combinações do cardápio, “para não ferir os nativos”.

Saudade do Brasil? Muita. Da mulher, do filho, da mãe, dos amigos, do ambiente carioca. Tanto que se deixa entusiasmar na conversa, falando da sua vida, da vida na China, do contato com brasileiros que por aqui passam, alguns ilustres detentores de cargos públicos. Esteve entre os pouco mais de setenta compatriotas convidados para uma recepção com Lula, quando da visita do presidente à cidade.

“Aqui a gente aprende muito”, diz ele. “O chinês é trabalhador e esperto” – sentencia, despedindo-se rápido para atender ao telefonema de uma cliente que deseja fazer encomendas para o jantar.

Precisava não, Beto, ir tão longe, para o outro lado do mundo, para mostrar que pode viver do seu trabalho. Provavelmente você é muito mais esperto do que os chineses. Pode crer, amigo, trilhando um caminho próprio, o Brasil alcançará, no futuro, um padrão de desenvolvimento como o da China. Então, gente como você não necessitará sair do país em busca de um lugar ao sol.

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