05 fevereiro 2025

Cláudio Carraly opina

Uma abordagem para um Brasil mais seguro

Cláudio Carraly*  

Nos últimos 30 anos, a segurança pública tem sido uma das principais preocupações dos brasileiros, o aumento da criminalidade, a sensação de insegurança e a violência nas ruas afetam profundamente a qualidade de vida de milhões de pessoas. Para compreender a complexidade desse problema, é essencial adotar uma abordagem multidisciplinar, que vá além da perspectiva policial e integre análises sociológicas, econômicas e culturais, bem longe das retóricas politiqueiras e das soluções simplistas.

A evolução da criminalidade no Brasil nas últimas décadas está intrinsecamente ligada à expansão das facções criminosas e às crescentes desigualdades sociais, ancoradas pelo enorme abismo de renda entre os mais ricos e os mais pobres no Brasil. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelam que o país apresenta uma taxa de homicídios de cerca de 27 por cada 100 mil habitantes, uma das mais elevadas do mundo. Além disso, estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) demonstram a forte correlação entre falta de renda, altos índices de desemprego, baixa escolaridade e a perpetuação da violência.

Fatores estruturais como a desigualdade social, a exclusão econômica e a educação precária são determinantes na dinâmica do ciclo da criminalidade. A falta de oportunidades formais e a vulnerabilidade dos jovens em contextos de informalidade favorecem o aliciamento por organizações criminosas, nesse sentido, políticas públicas integradas, envolvendo habitação, saúde e assistência social, são imprescindíveis para romper o ciclo de exclusão e violência.

Esses fatores da diminuição de violência não são nada desconhecidos, porém lamentavelmente a incompetência dos governos estaduais, cuja responsabilidade formal da segurança pública foi determinada na constituição de 1988, isso agravado pelo desinteresse dos municípios e das sucessivas administrações federais, ressaltando que os demais entes políticos da República não querem trazer esse “problema para o seu colo”.

Casos internacionais demonstram que políticas integradas podem transformar realidades marcadas pelo crime. Medellín, na Colômbia, por exemplo, investiu em infraestrutura urbana, educação e programas culturais, conseguindo reduzir os índices de homicídios em mais de 80% ao longo de duas décadas, Em Los Angeles, a presença efetiva de um policiamento comunitário, bem como o uso inteligente dos dados coletados, melhoraram substancialmente os níveis de sensação de segurança no estado. Tais exemplos oferecem lições valiosas, mas devem ser adaptados à realidade brasileira, considerando as especificidades regionais e a diversidade cultural do país.

Para que iniciativas como o policiamento comunitário e os programas de prevenção à violência em escolas se tornem sustentáveis, é necessário definir etapas claras de implementação, como monitoramento contínuo da segurança, com indicadores reais que permitam avaliar a eficácia das políticas adotadas. Ainda a criação de fundos específicos para projetos de prevenção, garantindo recursos constantes em uma ação de Estado que não possa sofrer solução de continuidade pela administração seguinte, além do envolvimento de lideranças populares, ONGs e universidades na concepção, execução e monitoramento das políticas, garantindo maior aderência e adaptação às necessidades locais.

A corrupção e a impunidade corroem a eficácia das políticas de segurança. Para reverter esse cenário, a criação ou fortalecimento de entidades existentes que fiscalizem a gestão dos recursos públicos destinados à segurança, além da implementação de tecnologias que garantam a transparência dos processos e agilizem a aplicação da lei, reduzindo assim a sensação de impunidade. Estabelecendo mecanismos rigorosos de responsabilização e prestação de contas, onde agentes públicos e privados respondam civil e criminalmente por desvios e má gestão dos recursos.

A tecnologia desempenha um papel crucial na modernização da segurança pública, as novas tecnologias utilizadas de forma eficiente e respeitando os direitos individuais e a privacidade dos cidadãos são e serão cada vez mais fundamentais. A aplicação de algoritmos para identificar padrões de criminalidade, garantindo assim a atuação preventiva fundamental, assim como o uso ético de câmeras e sistemas inteligentes para mapear áreas de risco, utilizando a identificação facial de condenados pela justiça, além de otimizar o patrulhamento, remanejando-o para áreas de perigo iminente.

A segurança pública é uma responsabilidade coletiva. É necessário garantir a participação ativa da população, a criação de espaços de diálogo entre governo, forças de segurança e comunidade, onde as demandas e sugestões sejam discutidas e implementadas. O incentivo à educação cidadã sobre os direitos e deveres na defesa da paz e da não violência, promovendo a colaboração entre todos os segmentos da sociedade, garantindo ainda mecanismos que permitam à população opinar sobre as políticas de segurança e sugerir melhorias de forma estruturada.

O Brasil precisa repensar sua política de segurança pública de maneira abrangente e integrada. É fundamental que os governos e a sociedade atuem de forma conjunta para promover reformas estruturais, combater a corrupção e implementar soluções inovadoras, como a desmilitarização das polícias estaduais e consequente unificação à polícia civil, para que o sistema de segurança tenha apenas um corpo e comando diretivo único. Cada cidadão tem um papel essencial nessa transformação, seja participando de conselhos comunitários, pressionando por maior transparência ou engajando-se em iniciativas locais de prevenção à violência. Somente com um esforço coletivo e coordenado poderemos construir um país mais seguro, justo e solidário.

*Cláudio Carraly - Advogado, ex-secretário executivo de Direitos Humanos de Pernambuco.

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