31 agosto 2024

Minha opinião: campanha

A TV, as redes e as ruas

Luciano Siqueira  

Perpassa a campanha eleitoral o debate acerca da influência efetiva sobre o comportamento do eleitor que podem ter a TV e as redes sociais. 

O tempo disponível para o programa eleitoral gratuito na televisão sempre foi muito disputado. Coligações mais amplas somam mais tempo — o que se considera uma importante vantagem. 

O desafio passa a ser o bom uso desse espaço alargado, que requer muita competência para prender a atenção de telespectadores por um tempo razoavelmente útil. 

Entretanto, com a expansão das redes sociais e a sua utilização em campanhas, a TV embora permaneça provavelmente como o principal veículo, já não teria o mesmo peso que antes. 

As redes, particularmente para candidatos e candidatas previamente possuidores de largo alcance e interação com seus seguidores, compensam em muito o tempo eventualmente diminuto na TV. 

Este é o fato. 

O risco é a subestimação da abordagem direta do eleitor, particularmente por campanhas situadas à esquerda e que apostam não apenas no objetivo eleitoral imediato, mas igualmente no acúmulo de forças tendo em vista as batalhas que seguem — com um olhar no município e o outro nos destinos da nação. 

A atividade política direta junto ao povo é indispensável. 

Daí porque se tem cunhado a expressão realizar a campanha "nas redes, nos salões e nas ruas".

Num plano local e particular, a campanha pela reeleição da vereadora Cida Pedrosa 65113 (PCdoB-Recife), quase nula na TV, aposta numa divulgação sequenciada e de conteúdo esclarecedor nas redes sociais concomitantemente com reuniões de residência, porta a porta nas áreas populares, presença física onde se concentra o seu público alvo. 

Um exemplo a ser seguido.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/08/minha-opiniao-debates-na-tv_29.html

Interesses conflitantes?

Campos Neto será investigado por suas empresas offshores em paraíso fiscal
No ano passado, sob o argumento de que as investigações violavam a autonomia do BC, o presidente do órgão conseguiu uma liminar para não ser investigado
Iram Alfaia/Vermelho  

Por unanimidade, a primeira turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) autorizou investigação contra o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, pela comissão de ética da Presidência da República por manter empresas offshores em paraíso fiscal.

Em 2021, uma investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, sigla em inglês) revelou que o presidente do BC e o então ministro da Economia, Paulo Guedes, apareciam no documento Pandora Papers como proprietários de empresas offshores.

As investigações contra as duas figuras mais poderosas na área econômica do governo Bolsonaro estavam paralisadas, mas com a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a investigação foi retomada com os novos membros da comissão.

No ano passado, sob o argumento de que as investigações violavam a autonomia do BC, Campos Neto conseguiu uma liminar para não ser investigado. A Advocacia-Geral da União (AGU) solicitou a suspensão da liminar, alegando que a comissão tem a autoridade para avaliar conflito de interesse.

“Campos Neto conseguiu liminar argumentando que não podia ser investigado com base na Lei de Autonomia do Banco Central. Ele estava querendo fugir de uma investigação séria. É um absurdo um presidente do Banco Central ter offshore, ter recursos que estavam escondidos em paraísos fiscais”, disse o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), autor de um pedido de investigação contra Campos Neto na comissão da Presidência.

“Pasmem, as informações que foram apresentadas é que essas empresas têm remuneração pela Taxa Selic. Ou seja, Campos Neto pode ter lucrado com a manutenção de juros altos no Brasil. Isso é muito grave!”, completa o deputado.

De acordo com as investigações, o presidente do BC é dono de quatro empresas. “Duas delas, Cor Assets e ROCN Limited, são marcas registradas no Panamá em sociedade com sua esposa, a advogada Adriana Buccolo de Oliveira Campos. O objetivo declarado das empresas é investir nos investimentos financeiros do Santander Private Bank, cujo conselho executivo Campos Neto integrou no passado. As outras offshores são Peacock Asset Ltda, gerida pelo banco Goldman Sachs , e que foi descoberta na investigação do Bahamas Leaks, de 2016. A quarta empresa é a Darling Group, que segundo informou o Banco Central, é uma empresa de ‘gestão de bens imóveis’”, diz o El País.

A reportagem explica que o problema das offshores é que, apesar de legal, acabam esvaziando a arrecadação fiscal nacional, já que muitos contribuintes com rendas altas as usam para evitar os tributos.

“Tanto é que as empresas offshore, em seus anúncios, oferecem aos seus potenciais clientes ‘evitar o pagamento de impostos’. Para isso, atua como uma estrutura intermediária entre os investimentos do cliente e os rendimentos que ele recebe, seja pelos dividendos das ações ou pelo aluguel de propriedades, por exemplo. Esses lucros não são depositados na conta do proprietário da empresa, e sim no offshore, e por isso ficam à margem do fisco brasileiro”, explica.

Gaza: múmeros do genocídio

Em dez meses, ataques de Israel a Gaza já mataram 40 mil pessoas, 130 por dia
Comissário da ONU diz que situação resulta, em boa medida, às falhas recorrentes das forças de Israel “em cumprir as regras da guerra” e Papa Francisco volta a pedir paz
Priscila Lobregatte/Vermelho   

Cerca de 40 mil pessoas perderam a vida em Gaza desde que tiveram início os ataques de Israel, em outubro, segundo dados do Ministério da Saúde local, apresentados pelas Nações Unidas nesta quinta-feira (15). O número equivale a 130 mortes por dia nesses dez meses. A grave situação na região levou o papa Francisco a fazer, no mesmo dia, um novo apelo por um cessar-fogo imediato. 

Ainda de acordo com as autoridades palestinas, a estimativa é de que 2% da população da região foi morta, o que corresponde a um óbito a cada 50 pessoas, e 10 mil corpos continuam sob escombros de edificações destruídas. 

“Enquanto o mundo reflete e considera sua incapacidade de evitar essa carnificina, peço a todas as partes que concordem com um cessar-fogo imediato, deponham as armas e parem com a matança de uma vez por todas”, declarou o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk.

Turk também salientou que o dia de hoje, quando este alto número de vítimas foi alcançado, “é um marco sombrio para o mundo”. Ele completou enfatizando que a maioria dos mortos é de mulheres e crianças e acrescentou: “Essa situação inimaginável se deve, em grande parte, às falhas recorrentes das Forças de Defesa de Israel em cumprir as regras da guerra”. 

Apelo papal

Tamanha carnificina e o quadro humanitária desolador enfrentado pelos palestinos também levaram o Papa Francisco a, novamente, apelar para a paz nesta quinta (15). “Continuo acompanhando com preocupação a gravíssima situação humanitária em Gaza e peço mais uma vez que o fogo seja cessado em todos os frontes, que os reféns sejam libertados e que se ajude a população esgotada”, afirmou o pontífice. 

“Encorajo todos a realizar todos os esforços para que o conflito não se amplie e a percorrer os caminhos das negociações a fim de que essa tragédia termine em breve. Não nos esqueçamos que a guerra é uma derrota”, completou o papa. 

Negociações

Ambas as manifestações — da ONU e do Papa — acontecem no mesmo dia escolhido para uma nova reunião entre mediadores dos Estados Unidos, Catar e Egito e representantes de Israel e do Hamas para buscar um acordo que cesse os ataques. 

Comunicado sobre o encontro, marcado na semana passada, dizia que “é hora de trazer alívio imediato tanto para o povo de Gaza, que está sofrendo, quanto para os reféns e suas famílias, que também enfrentam grande sofrimento”.

Nesta terça (13), o Hamas disse que não enviaria representante por considerar que Israel está dificultando as negociações — o governo israelense, por sua vez, afirma que a culpa pelo atraso seria do grupo palestino. 

No entanto, reportagem recente do The New York Times mostrou o contrário do alegado por Benjamin Netanyahu, apontando que seu governo teria feito exigências que inviabilizariam a trégua, entre elas a permanência das forças israelenses no controle da fronteira sul de Gaza e uma menor flexibilidade para que palestino retornem às suas casas ao fim do conflito. 

Com agências

Ilustração: Ataque de Israel a Gaza. Foto: Wikimedia Commons

Imperialismo

O significado teórico do imperialismo de Lênin
Prabhat Patnaik/portal da Fundação Maurício Grabois www.grabois.org.br

O significado do imperialismo de Lênin estava no fato de que ele revolucionou totalmente a percepção da revolução. Marx e Engels já haviam visualizado a possibilidade de países coloniais e dependentes terem revoluções próprias antes mesmo da revolução proletária na metrópole, mas esses dois conjuntos de revoluções eram vistos como desarticulados; E tanto a trajetória da revolução na periferia quanto sua relação com a revolução socialista na metrópole permaneceram obscuras. O imperialismo de Lênin não apenas ligou os dois conjuntos de revoluções, mas também fez com que a revolução nos países periféricos fizesse parte do processo de transição da humanidade para o socialismo.

Via, portanto, o processo revolucionário como um todo integrado; visualizou um único processo revolucionário mundial, que, a partir de uma ruptura no elo mais fraco da cadeia, não importando onde esse elo estivesse localizado, derrubaria todo o sistema. E afirmava também que chegara o tempo de tal revolução mundial, pois o capitalismo chegara a um estágio em que enredara a humanidade em guerras catastróficas: “cobrira” o mundo inteiro sem deixar “espaços vazios”, dividindo-o completamente em esferas de influência de diferentes potências metropolitanas, de modo que só poderia agora ocorrer uma repartição; E essa redivisão só poderia ocorrer por meio de guerras interimperialistas, das quais a Primeira Guerra Mundial foi um exemplo clássico.

A posição teórica que informava o imperialismo estendeu o marxismo de pelo menos cinco maneiras principais. Primeiro, trouxe as “regiões periféricas” do mundo, países que Hegel havia descartado como sem história, para o âmbito da revolução mundial; de fato, com o passar do tempo e com o desaparecimento das esperanças de uma revolução na Europa após a Revolução Bolchevique, esses países passaram para o centro da revolução mundial. Em um de seus últimos escritos, Lênin não apenas depositou suas esperanças em uma revolução na China e na Índia para suceder a Revolução Russa, mas até mesmo obteve satisfação do fato de que Rússia, China e Índia juntas representavam quase metade da humanidade, de modo que as revoluções nesses três países juntos mudariam decisivamente a balança em favor do socialismo. Não surpreendentemente, a Internacional Comunista que ele ajudou a criar era diferente de tudo o que o mundo já tinha visto até então, onde delegados da Índia, China, México e Indo-China se cruzavam com os da França, Alemanha e Estados Unidos.

Em segundo lugar, e paralelamente, ampliou o escopo do marxismo de uma teoria da revolução proletária nos países capitalistas avançados para uma teoria da revolução mundial. É claro que reconhecer o alcance muito mais amplo do marxismo, um reflexo da dominação mundial do capital que o imperialismo havia enfatizado, ainda exigia que a tarefa específica de analisar a história das sociedades não europeias com base na teoria marxista tivesse que ser realizada. Mas a extensão e o florescimento do marxismo no terceiro mundo forneceram a base para tais análises, estimuladas pelo Comintern mesmo quando as leituras políticas específicas deste último eram errôneas. O imperialismo de Lênin deu, assim, ao marxismo uma vitalidade sem precedentes.

Lênin, com certeza, não foi o primeiro a falar de imperialismo. Antes dele, Rosa Luxemburgo havia fornecido uma análise extremamente aguda e perspicaz explicando por que o capitalismo precisava invadir os mercados pré-capitalistas. Mas a análise de Luxemburgo sofria com o fato de que via tal invasão como resultando em uma assimilação do segmento pré-capitalista ao capitalismo. O segmento pré-capitalista não se deteve como uma entidade devastada; passou a fazer parte do segmento capitalista. O foco da análise de Luxemburgo, portanto, ainda permanecia uma revolução proletária europeia. Não obstante observações errôneas em contrário, não viu um mundo permanentemente segmentado sendo criado pelo capitalismo metropolitano. O imperialismo de Lênin, no entanto, visualizou um mundo permanentemente segmentado e aí estava sua for&ccedi l;a.

3º lugar, a teoria de Lênin forneceu uma interpretação radicalmente nova do conceito de “obsolescência histórica” do capitalismo. Até então, com base nas breves observações de Marx no prefácio de Uma Contribuição à Crítica da Economia Política, o entendimento era de que um modo de produção se tornava historicamente obsoleto e, portanto, maduro para ser derrubado apenas quando se esgotasse o espaço para qualquer desenvolvimento posterior das forças produtivas dentro dele; e tal exaustão deveria manifestar-se tipicamente sob a forma de uma crise. A ausência de tal crise, de fato, havia levado Bernstein a exigir “rever” o marxismo, substituir uma reforma do sistema em vez de sua derrubada, como desiderato do proletariado. Aqueles que aderiram à tradição revolucionária, como contra Berns tein, procuraram provar que tal crise terminal, que talvez ainda não tivesse surgido, era, no entanto, inevitável.

A teoria do imperialismo de Lênin abriu um terreno completamente novo aqui. A manifestação da obsolescência histórica do capitalismo, sua maturidade para a derrubada, não foi qualquer crise econômica, mas o fato de que ele havia entrado em uma fase em que engoliu a humanidade em guerras devastadoras, guerras em que os trabalhadores de um país foram obrigados a lutar contra os trabalhadores de outro através de trincheiras. Quando isso aconteceu, havia chegado a hora de converter a guerra imperialista em guerras civis, de desviar as armas dos companheiros de trabalho através das trincheiras em direção aos capitalistas de cada país.

4º o socialismo deveria ser agora o objetivo de todas as revoluções, não importando onde ocorressem. A ideia de a revolução democrática não ser levada adiante nos países que chegavam tarde ao capitalismo pela burguesia, que historicamente desempenhara o papel de seu arauto, já havia aparecido nas Duas Táticas da Social Democracia de Lênin: em tais sociedades, a tarefa de levar adiante a revolução democrática cabia ao proletariado, que entraria em aliança com o campesinato, e tendo liderado a revolução democrática, não pararia por aí, mas seguiria para a construção do socialismo. Mas agora essa perspectiva de uma revolução em uma sociedade periférica, inicialmente contra o imperialismo e baseada em uma ampla aliança de classe com trabalhadores e camponeses em seu núcleo, e depois passando par a o palco socialista, generalizou-se. A tarefa de construir o socialismo, em suma, não era mais uma preocupação apenas dos trabalhadores do campo avançado; Era uma tarefa a ser alcançada por etapas que entraram na agenda de todas as sociedades.

Finalmente, uma questão fundamental havia surgido: por que houve um crescimento tão grande do “reformismo” no movimento operário europeu que tantos líderes da segunda internacional adotaram posições oportunistas ou francamente chauvinistas durante a guerra; e Lênin forneceu uma resposta a essa pergunta, com base em uma sugestão anterior de Engels, desenvolvendo o conceito de uma “aristocracia do trabalho” que havia sido “subornada” dos superlucros imperiais.

O imperialismo foi uma conquista teórica estupenda. Lênin já havia comentado que a força do marxismo estava em ser verdadeiro. Pode-se fazer uma afirmação semelhante sobre a teoria do imperialismo de Lênin também. Notável tour de force, dava respostas, quase com iluminação ofuscante, a toda uma gama de perguntas que haviam surgido na nova conjuntura e clamavam por respostas. Poder-se-ia discutir com este ou aquele detalhe do argumento de Lênin, mas seu impulso geral era quase esmagadoramente correto. E um índice de sua correção é a maneira quase estranha como Lenin antecipou os desenvolvimentos no mundo no período entre 1914 e 1939.

O mundo de hoje, no entanto, se afastou do que Lênin havia escrito sobre o imperialismo. Uma característica importante dessa diferença é que a centralização do capital avançou muito mais do que no tempo de Lênin, dando origem a um capital financeiro internacional, no lugar dos capitais financeiros nacionais que dominavam então. As rivalidades interimperialistas, consequentemente, silenciaram-se, uma vez que o capital financeiro internacional não quer que o mundo seja dividido em diferentes esferas de influência; quer, ao contrário, um mundo não dividido para o seu movimento irrestrito. A questão das guerras provocadas pela rivalidade interimperialista não se coloca, portanto, mais.

Isso, no entanto, não significa o alvorecer de uma era de paz. A ofensiva implacável do capital financeiro internacional contra todos os esforços nacionais no terceiro mundo em direção à independência econômica e à autossuficiência econômica (incluindo alimentar) provocou uma onda de conflitos locais, colocando um imperialismo unido contra determinados países. Ao mesmo tempo, a exploração dos trabalhadores do terceiro mundo intensificou-se muito, mesmo quando a oligarquia empresarial-financeira no seu interior se integrou ao capital financeiro internacional; O resultado é um crescimento maciço da desigualdade no Terceiro Mundo, a ponto de grandes segmentos da população testemunharem o aumento da pobreza absoluta em termos nutricionais. Ao mesmo tempo, a maior disposição do capital metropolitano em realocar as atividades para o sul global, enfraque ceu os sindicatos na metrópole e levou a um aumento da desigualdade dentro da própria metrópole. A hegemonia do capital financeiro internacional, expressa em uma ordem neoliberal, implicou, portanto, uma piora significativa em termos relativos, e mesmo absolutos, nas condições dos trabalhadores do mundo.

Isso deu origem a uma crise de superprodução para a qual não há solução dentro da ordem global neoliberal. E essa crise deu origem a um surto de fascismo e neofascismo em todo o mundo, com as oligarquias corporativo-financeiras em vários países firmando alianças com grupos fascistas para manter sua hegemonia. A luta pelos direitos democráticos, a luta contra o desemprego e a luta pelas liberdades civis vieram assim para a linha da frente; E essa luta está ligada à luta pelo socialismo. A revolução de Lênin na perspectiva da revolução mundial continua válida, mas o foco imediato da revolução mudou com os tempos.  

Prabhat Patnaik é um economista indiano de orientação marxista-leninista. Entre seus livros estão Accumulation and Stability Under Capitalism (1997), The Value of Money (2009), e Re-envisioning Socialism (2011).

Ilustração: Edward Linley Sambourne

Futebol: controlar e criar

Ter a bola é essencial, mas, obviamente, não o bastante
Não ficar com a bola no meio campo foi a deficiência principal da seleção na Copa América
Tostão/Folha de S. Paulo 

Nos melhores jogos do Brasileirão ou da Copa do Brasil, o Botafogo está quase sempre presente. No sábado, veremos outro jogaço entre o líder Fortaleza e o vice Botafogo, pelo Brasileirão. São dois times que priorizam as jogadas rápidas em direção ao gol.

O Fortaleza tem mais pausas que o Botafogo, algumas vezes descansa com a bola. O Botafogo não para de correr. O Fortaleza é a equipe que mais jogou durante o ano e a que melhor alterna jogadores, diferentemente de outros clubes brasileiros, que muitas vezes escalam todos os reservas. 

Nesta quarta (28), Bahia e Flamengo se enfrentam no Maracanã pela Copa do Brasil. São dois times com muita qualidade no meio campo. Gostei da convocação de Gerson para a seleção. Por ter jogado em várias posições do ataque e se destacado pela habilidade e bons passes, ele trouxe para o meio campo essas qualidades e se adaptou às necessidades do setor, de marcação e de capacidade para atuar de uma intermediária à outra.

Dorival Júnior deveria experimentar outra formação no meio campo e escalar um trio com um volante mais centralizado (Bruno Guimarães ou André) e um meio-campista de cada lado (Gerson e Paquetá), em vez da formação habitual, que foi usada na Copa América, com dois volantes em linha e mais Paquetá entre os dois e o ataque.

Nessa nova estratégia, a equipe teria três jogadores marcando no meio campo e dois dos três avançando (Paquetá e Gerson). Na formação anterior, o time se defendeu com apenas dois no meio campo e avançou apenas com o meia ofensivo (Paquetá). 

Na formação com apenas dois jogadores no meio campo, é essencial ter pontas que voltam para marcar. Na Copa América, como Vinicius Junior estava sempre no ataque, sem voltar para marcar pela esquerda, o lateral ficava desprotegido, o que obrigava um dos volantes a se deslocar para o lado, deixando grandes espaços pelo centro. Uruguai e Colômbia pressionavam na marcação e tomavam a bola com facilidade dos dois volantes e dos dois laterais.

Não ficar com a bola no meio campo foi a deficiência principal da seleção. Gerson e Paquetá, por serem mais hábeis, podem diminuir esse problema, ainda mais com a companhia de um volante mais centralizado.

A grande dúvida é se Gerson vai ter na seleção o mesmo destaque que possui no Flamengo. Inúmeros jogadores, desde a década de 60, que brilhavam nos clubes, não foram bem na seleção por variados fatores, como a comparação com outros jogadores, por não se sentirem à vontade e muitas outras razões que fogem à nossa compreensão. 

Assim como a seleção, vários clubes brasileiros têm dificuldade em manter a bola no meio campo. Com isso, usam demais as bolas longas da defesa para o ataque, como ocorre com o Atlético-MG. A equipe joga com dois alas abertos, dois atacantes pelo centro e mais um meia ofensivo e deixa apenas um ou dois jogadores no meio campo, que não conseguem ficar com a bola.

Também nesta quarta, o Atlético-MG enfrenta o São Paulo, no Morumbis, pela Copa do Brasil. O São Paulo melhorou a qualidade individual com boas contratações e também o jogo coletivo após a chegada do novo técnico (Zubeldía). A equipe alterna velocidade com posse de bola e troca de passes no meio campo.

Ter a bola é essencial, o básico para qualquer equipe. Obviamente não é o bastante. É necessário ter talento individual e capacidade de, no mesmo jogo, alternar a troca de passes, a posse da bola com jogadas rápidas em direção ao gol. Essa é a tendência mundial.

Ter ou não ter a bola, eis a questão.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/02/futebol-brasileiro-impasses.html

No X (ex-Twitter) @lucianoPCdoB

Uma vez indicado pelo presidente Lula para presidir o Banco Central, Gabriel Galípolo agora tem sua mente dissecada pela grande mídia pró-mercado financeiro, que antecipa o que ele pode e não pode fazer. É a ditadura do rentismo.

Leia: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2021/10/privilegios-rentistas.html

30 agosto 2024

Minha opinião: jogo pesado

Oportunismo contido 
Luciano Siqueira 


Na era moderna dos outsiders, o complexo midiático que monopoliza a comunicação no Brasil adota postura dúbia em relação ao tal Pablo Marçal, que ameaça desarrumar o coreto do bolsonarismo nas eleições para a capital de São Paulo. 

A cobertura jornalística oscila entre a "análise" do fenômeno a partir da presença do dito cujo nos meios digitais e a dúvida acerca de até onde o novo outsider serve ou não aos propósitos do capital financeiro.

Seja quem for, travestido de diabo ou não, desde que combatente contra a esquerda e qualquer projeto nacional de desenvolvimento soberano e democrático, o sistema midiático antes de tudo tratam com benevolência. 

A dúvida, nesse caso, está no estrago que o dito aventureiro parece provocar na candidatura à reeleição do prefeito Ricardo Nunes, opção preferencial do bolsonarismo. 

Daí se cogitar agora da interdição da candidatura do autoproclamado ex-coach pela via judicial. 

Quanto ao conteúdo do seu discurso dito "anti sistema", bem ao estilo fascista, as análises o subestimam. 

É o pesado jogo do poder no Brasil dos nossos dias.

Uma crônica de Ruy Castro

Síndrome de O. A.
Lá fora, estuda-se a 'Síndrome de DiCaprio'; mas há uma entre nós, inédita e mais interessante
Ruy Castro/Folha de S. Paulo  

Um site americano mapeou os casos amorosos do ator Leonardo DiCaprio e descobriu que, em seus já balzacos 30 anos de estrelato, nenhuma de suas muitas namoradas tinha mais de 25 anos. Ao se aproximarem da data fatal, eram substituídas por outra sub-25. Com isso, a suposta preferência masculina por infantes de até 25 anos está na mira dos estudiosos, com o nome "Síndrome de DiCaprio". Mas qual é a novidade? A história está cheia de homens que tiveram casos ou se casaram muitas vezes com mulheres de metade da sua idade.

O rei Salomão, segundo a bem informada Bíblia, teve 700 esposas e 300 concubinas. Como ele morreu antes dos 60 anos, a maioria certamente tinha menos de 25. Talvez, no seu tempo (970-931 a.C.), 25 anos correspondessem hoje a 125, donde a tremenda rotatividade. O incrível é que, com essa ativa vida conjugal, Salomão ainda tivesse tempo para ser sábio.

Pensando bem, até o nosso Oswald de Andrade deixa DiCaprio no chinelo —seu limite de idade era muito mais exigente: 18 anos. Sua biógrafa Maria Eugenia Boaventura, em "O Salão e a Selva", descreve casos de Oswald a partir de 1912 com meninas ainda mais novas. Duas delas foram as adolescentes Kamiá e Carmen Lydia, que ele trouxe da Europa, uma de cada vez, e trocou a primeira pela segunda. E houve Deisy (segundo Maria Eugenia, "normalista de 18 anos incompletos" em 1918), musa da famosa garçonnière de Oswald na rua Líbero Badaró e que morreu em 1919 em função de um aborto. Oswald tinha então quase 30.

Sim, Oswald se casou em 1924 com Tarsila do Amaral, quatro anos mais velha e também mais rica, mais chique e com boas relações na Europa. Mas, quatro anos depois, conheceu Pagu, também por volta dos 18 —24 anos menos que Tarsila—, e o que aconteceu entre ele e elas é uma história que até hoje não se contou direito.

"Síndrome de DiCaprio"? Que nada. Quente é a "Síndrome de O. A.".

[Ilustração: Oswald de Andrade (1890 - 1954]

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/08/minha-opiniao-por-um-triz.html 

Enio Lins opina

Fogo no cabaré bolsonarista em São Paulo
Enio Lins 

Natural é a eleição na capital paulista chamar a atenção de todo país, afinal a pauliceia desvairada é o epicentro econômico-financeiro e cultural do Brasil (e da Latinoamérica). Assim, comentar as démarches eleitorais paulistanas é coisa natural para o resto do país. Isto posto, vamos lá:

TREMOR PAULISTANO

Desvairada está a disputa na pauliceia. Treme a terra plana com o crescimento da candidatura, antes tida como “folclórica”, de um marginal destacado na tórrida terra-sem-lei que é o universo das redes sociais no Brasil. Estremecem as almas pudicas defensoras da “liberdade de desinformação” e do “livre-comércio absoluto” nas redes sociais. Tremelica quem acha que a Justiça (com maiúscula), especialmente o Supremo Tribunal Federal, “extrapola seus limites”. Mas, tal como o finado Escobar colombiano, esse Pablo brasileiro despontou para impor as regras do submundo ao dito establishment, surpreendendo seus próprios patrões.

TEMOR PAULISTANO

Teme a dita elite uma legítima cria sua. Os Pablos de sucesso nas redes sociais são alimentados por investidores que apostam nos lucros fáceis do tráfico da desinformação, da comercialização das fake news, da venda dos preconceitos de todos os tipos, e do exercício puro e simples do crime organizado no cyberespaço. Hoje, esses patrocinadores temem o famigerado Pablo com 21% das intenções de voto para a prefeitura de São Paulo, mas temem muito mais que a Justiça cumpra seu papel e passe a cobrar limites legais às redes sociais. Esse horror se materializa, dentre outras ações, quando – atendendo a um pedido do PSB (da candidata Tabata Amaral) – a Justiça Eleitoral paulista decide suspender alguns perfis delituosos usados para monetização pelo candidato bolsonarista nº 2. O sobressalto, então, dobra de intensidade: choram por que Don Pablo, o ex-coach, ameaça o candidato bolsonarista nº 1, Nunes, e choram porque para frear Don Pablo é necessário aplicar a legislação no segmento das redes sociais.

FORA DE CONTROLE?

Pablo Marçal e Jair Messias são duas faces de uma mesma moeda: estupidez pessoal e relevância de massas na extrema-direita. O problema para o bolsonarismo é que sua melhor candidatura em São Paulo seria a do atual prefeito, Ricardo Nunes, por representar uma ampliação política dessa quadrilha que chegou a ocupar o Palácio do Planalto por quatro anos. Don Pablo deveria ter jogado o papel de provocador apenas contra Guilherme Boulos, a verdadeira e grande novidade na disputa paulistana, numa ação tática em benefício da reeleição de Nunes. Mas El Escobar digital se empolgou, enxergou-se aboletado na cadeira de prefeito e pulou (temporariamente) fora do controle da familícia, mudando sua posição na ménage-à-trois com Jair e Ricardão. O mito gemeu, as elites assustam-se. Mas, e agora?

CENA DO MOMENTO

Divulgada há cinco dias, uma pesquisa realizada pelo Datafolha sobre a intenção de voto para a prefeitura paulistana, mostrou Boulos com 23%, Don Pablo com 21% e Nunes, 19%. O cabaré do Jair pegou fogo: o mito e seus filhos partiram a mais de mil para se engalfinhar com o “homem de bem” e “patriota” Pablito – o bolsonarista que virou inimigo de infância (por enquanto, depois estarão aos beijos novamente). Nesse imbróglio, as elites avalistas e financiadoras do bolsonarismo estão perdidas como deficientes visuais em tiroteio, pois (repito) essa gente teme gente como Don Pablo fora da coleira, mas tem pavor muito maior à aplicação da Lei (quaisquer leis) ao lucrativo submundo digital.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/08/minha-opiniao-sem-limites.html

Sylvio: bons sinais

A notícia da criação de 188 mil empregos em julho, juntamente com a queda do desemprego, do controle da inflação, da diminuição do número de pessoas na faixa de miséria, do maior crescimento do PIB em relação ao previsto, do maior desenvolvimento dos programas sociais em destaque como Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida, ao mesmo tempo em que saímos da décima terceira  para oitava economia mundial e assumimos um maior respeito e protagonismo internacional, nos leva a ser cada vez mais otimistas com os rumos do País. Somente a extrema direita, derrotada nas urnas democraticamente, e alguns articulistas da grande mídia se recusam a ver e pregam contra o cenário de reconstrução nacional.

Sylvio Belém 

Novo presidente do Banco Central

As reações à indicação de Galípolo ao BC: mercado, haddadismo ou nova política monetária
O Portal Vermelho consultou seis analistas de orientação econômica heterodoxa para observar como foi recebida a notícia.
Cezar Xavier/Vermelho   

A indicação de Gabriel Galípolo para a presidência do Banco Central, anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, gerou uma mistura de otimismo cauteloso e preocupações entre especialistas e líderes sociais. Galípolo, que atualmente ocupa a Diretoria de Política Monetária do BC, foi descrito por alguns como um nome que pode significar uma mudança de postura na instituição, enquanto outros expressaram incertezas sobre o futuro de sua gestão.

Portal Vermelho consultou seis analistas de orientação econômica heterodoxa para observar como foi recebida a notícia. Enquanto alguns veem sua nomeação como uma oportunidade para modernizar e alinhar o BC às políticas econômicas do governo, outros expressam dúvidas sobre sua capacidade de enfrentar os desafios impostos pela economia brasileira e as pressões do mercado financeiro.

A nomeação de Galípolo abre um novo capítulo na política monetária brasileira. Com uma formação crítica e uma visão que equilibra a responsabilidade fiscal com as demandas sociais, Galípolo enfrenta o desafio de modernizar o Banco Central, promover uma comunicação mais eficiente e transparente, e, eventualmente, ajustar a política de juros em um cenário global em transformação.

Sua gestão será acompanhada de perto por analistas, economistas e pela sociedade em geral, que esperam ver como ele vai navegar pelas complexas águas da economia brasileira. A sabatina no Senado será o próximo passo para definir o futuro de Galípolo à frente da política monetária do país.

Expectativas do movimento sindical 

Adilson Araújo, presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), expressou uma expectativa clara de que Galípolo, caso aprovado, se alinhe aos interesses da população ao invés de ceder às pressões do mercado financeiro.

“Espero que ele seja sensível aos anseios do povo brasileiro e trabalhe pela redução da taxa básica de juros, em vez de fazer a vontade do mercado financeiro e encher as burras dos rentistas.”, afirmou Araújo.

Araújo ressaltou a necessidade de uma redução da taxa básica de juros, a Selic, destacando que o Brasil não pode continuar a ser o “campeão mundial dos juros reais”. Segundo ele, a manutenção de juros elevados tem sacrificado investimentos e o consumo, impedindo o crescimento econômico e o desenvolvimento do país. Para Araújo, é fundamental que o novo presidente do Banco Central tenha sensibilidade para essas questões, resistindo às pressões do mercado financeiro e evitando beneficiar apenas os rentistas.

O presidente da CTB também frisou a importância da reindustrialização do Brasil e do fomento ao desenvolvimento nacional. Ele vê em Galípolo uma oportunidade para acelerar esses processos, que são cruciais para o futuro econômico do país.

Controle da política monetária?

Para Wellington Duarte, professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a indicação de Galípolo reflete o “haddadismo” na condução das políticas econômicas, mas com uma ressalva importante: ainda não está claro se o governo terá, de fato, mais controle sobre a política monetária.

“Galípolo é o ‘haddadismo’, mas, pelo menos, parece que o governo terá mais controle da política monetária… o termo ‘parece’ diz tudo, né?” disse Duarte, sugerindo que, embora a indicação possa trazer um alinhamento maior entre o BC e o governo, ainda há incertezas sobre o real impacto dessa mudança. Ele indica que, embora a nomeação possa sugerir um maior controle governamental, a realidade só será confirmada com o tempo.

Duarte caracteriza Galípolo como um representante das ideias econômicas defendidas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sugerindo que a sua nomeação pode ser vista como uma extensão das políticas implementadas pela atual equipe econômica. O termo “haddadismo” aqui refere-se a uma linha de pensamento que busca equilibrar as demandas por crescimento econômico com a responsabilidade fiscal, adotando uma postura menos ortodoxa em relação às políticas monetárias.

Duarte aponta que, embora a nomeação de Galípolo seja vista como um movimento estratégico, as expectativas em torno de sua gestão são moderadas pela realidade complexa do Banco Central. O economista sugere que o sucesso de Galípolo dependerá de sua habilidade em equilibrar as pressões do mercado financeiro com as demandas do governo por uma política monetária que favoreça o crescimento econômico.

Modernização e independência na política monetária 

Diogo Santos, economista formado pela UFMG, avaliou que a indicação de Galípolo era esperada, dadas suas credenciais e a proximidade com Lula. No entanto, Santos sublinhou que a atuação do economista à frente do BC será acompanhada com grande expectativa.

“É um economista de formação crítica, portanto cresce a expectativa sobre sua atuação. Para além da taxa de juros, ele deveria levar à frente uma agenda de modernização do BC, como colocar os objetivos de controle da inflação e busca do pleno emprego no mesmo nível hierárquico”, sugeriu Santos.

Sua trajetória, marcada por um pensamento econômico mais heterodoxo, sugere que ele poderá trazer novas perspectivas para a gestão da instituição. Para muitos, isso significa a possibilidade de uma abordagem mais equilibrada entre os objetivos de controle da inflação e a busca pelo pleno emprego, dois pilares que, até então, não têm recebido o mesmo nível de atenção dentro da política monetária brasileira.

Outro ponto crucial destacado por Diogo é a necessidade de Galípolo adotar uma postura diferente em relação à comunicação do Banco Central sobre a política econômica do governo. O atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, foi criticado por alguns por, supostamente, acentuar as instabilidades no setor financeiro ao transmitir uma visão que muitos consideram equivocada sobre o risco fiscal do país. Galípolo, por outro lado, terá a oportunidade de demonstrar uma maior independência em relação à visão predominante dos agentes financeiros, oferecendo uma comunicação mais equilibrada e transparente que contribua para a estabilidade econômica.

No que diz respeito à taxa Selic, suas expectativas são de que não haverá mudanças significativas em relação ao mandato atual. O Banco Central tem o dever de buscar uma meta de inflação de 3%, considerada baixa, o que obriga a instituição a manter uma política monetária restritiva. No entanto, se o Federal Reserve (Banco Central dos EUA) iniciar uma sequência de cortes na taxa de juros, seria importante que o Banco Central do Brasil aproveite essa oportunidade para reduzir a Selic, incentivando assim a retomada do crescimento econômico.

Diogo ainda acrescentou que será muito importante, sobretudo, o BC reassumir a condução da política monetária e a orientação das expectativas dos agentes financeiros. Para ele, estas operações, hoje, estão terceirizadas para o boletim Focus, que agrega opiniões de alguns agentes financeiros, excluindo representantes de outros setores da economia.

Desafios econômicos e reações de mercado

Marcos Antonio Costa, economista pela UFF, viu a indicação de Galípolo com bons olhos, destacando seu profundo conhecimento das políticas do Ministério da Fazenda e dos desafios que o país enfrenta. “Ele sabe muito bem quais são os limites do arcabouço fiscal e a necessidade de reação do BC aos ataques especulativos promovidos pela variação do dólar em relação ao real”, explicou Costa, reforçando a importância de uma atuação firme para combater as altas taxas de juros que prejudicam o desenvolvimento nacional.

A volatilidade cambial, quando não devidamente gerida, pode gerar instabilidade econômica, afetando negativamente o mercado financeiro e a economia real. O novo presidente do Banco Central, segundo ele, terá que enfrentar esses desafios de maneira decisiva para manter a estabilidade econômica.

Outro ponto central da análise de Costa é a crítica à atual taxa de juros, que ele considera “inexplicável” e excessivamente alta. Com uma das maiores taxas de juros do mundo, acima de dois dígitos, o economista argumenta que o Brasil está sacrificando seu desenvolvimento econômico. Para ele, essa política de juros elevados impede a implementação de projetos fundamentais, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a Nova Indústria Brasil (NIB), além de manter a Formação Bruta de Capital Fixo (FBKF) em níveis inadequados para o crescimento sustentável do país.

Apesar dos desafios, Costa expressa confiança na capacidade de Gabriel Galípolo de enfrentar essas questões complexas. Ele espera que o futuro presidente do Banco Central tenha a coragem necessária para promover mudanças significativas na política monetária, reduzindo a taxa de juros e, assim, abrindo espaço para um crescimento econômico mais robusto e sustentável no Brasil.

Símbolo de uma nova abordagem

Marcelo Fernandes, economista da UFRRJ, vê a indicação como um movimento carregado de simbolismo e uma potencial ruptura com a ortodoxia econômica vigente. “Muito bom. Simbolismo grande. Indicado pelo presidente Lula. Não comunga com a teoria ortodoxa vulgar. Seguidor da boa economia na tradição de Marx e Keynes”, disse Fernandes, sugerindo que a indicação pode sinalizar uma mudança de direção na política monetária do país. 

Ao escolher um nome que não comunga com a “teoria ortodoxa vulgar”, Lula sinaliza uma possível mudança de direção na condução das políticas monetárias do país. Para o economista, a decisão reflete um desejo de Lula de alinhar o Banco Central com uma visão econômica que foge dos padrões tradicionais e que busca alternativas para os desafios econômicos do Brasil.

Galípolo é descrito por Fernandes como um seguidor da “boa economia na tradição de Marx e Keynes”, o que, segundo ele, marca uma clara ruptura com as práticas ortodoxas que têm dominado a política monetária brasileira nas últimas décadas. Levar em consideração princípios keynesianos e marxistas, significa priorizar não apenas a estabilidade de preços, mas também o desenvolvimento econômico e a redução das desigualdades a partir de uma intervenção mais ativa do Estado na macroeconomia.

Atenção aos desafios e ao controle do mercado financeiro 

Por outro lado, Paulo Kliass, economista especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, adotou uma postura mais cautelosa, lembrando que a indicação de Galípolo ocorre em um contexto político complexo. “A nomeação veio da parte do Lula na tentativa de agradar ao setor financeiro, mas tenho receio que ele continue atendendo aos interesses dos grandes conglomerados financeiros”, alertou Kliass, enfatizando a importância de o novo presidente do BC atuar com firmeza para controlar os spreads bancários e democratizar o acesso ao sistema financeiro.

Kliass destacou, inicialmente, que a substituição de Roberto Campos Neto já pode ser vista como um passo positivo. Ele ressaltou o papel de Galípolo no governo desde o início do mandato de Lula, ocupando uma posição de destaque como secretário-executivo no Ministério da Fazenda e, posteriormente, como diretor de política monetária do Banco Central. Durante seu tempo no Comitê de Política Monetária (Copom), não manifestou uma postura divergente da liderança de Roberto Campos Neto, o que levanta dúvidas sobre possíveis mudanças significativas em sua futura gestão.

“Nessas nove reuniões, não houve nenhuma manifestação do ponto de vista de ata, de resultado, etc., do Galípolo em relação à orientação da maioria liderada pelo Roberto Campos Neto.”

O economista também apontou a importância de aguardar a sabatina de Galípolo no Senado, lembrando que a nomeação ocorreu em um contexto de eleições municipais, o que pode atrasar o processo. Para Kliass, essa nomeação pode ser vista como uma tentativa de Lula de agradar o mercado financeiro, ao escolher alguém com um perfil mais conciliador, o que, segundo ele, pode limitar a capacidade do governo de promover mudanças mais profundas na política monetária.

“Existem expectativas do mercado e expectativas do governo em relação a ele, e eu diria também expectativas dos economistas progressistas que simbolizam a parte da sociedade que quer que esse governo dê certo.”

Kliass ressaltou ainda que o Banco Central tem um papel regulador e fiscalizador crucial, que vai além da condução da política monetária. Ele questionou como Galípolo lidará com questões como a redução das tarifas bancárias e o spread, a democratização do acesso ao mercado financeiro e a administração da política cambial. Para ele, o novo presidente do Banco Central precisaria adotar uma postura mais incisiva nessas áreas para realmente promover uma mudança significativa.

“Essa é uma função do Banco Central como órgão regulador e fiscalizador, de evitar que haja uma espoliação da absoluta maioria da sociedade frente a quatro, cinco grandes conglomerados do financismo privado.”

Em sua análise, Kliass expressou preocupação com a possibilidade de que Galípolo continue atendendo aos interesses do setor financeiro, especialmente considerando a recepção positiva que sua nomeação teve entre os grandes players do mercado. A juventude do economista, com uma possível longa e bem sucedida cooptação de sua carreira pelo mercado financeiro, deixa dúvidas sobre os riscos que ele queira correr ao confrontar estes agentes.

Ele acredita que Lula pode ter perdido a oportunidade de colocar uma figura mais comprometida com uma política desenvolvimentista à frente do Banco Central, o que pode comprometer as ambições do governo de promover um crescimento econômico mais robusto e inclusivo. “Eu tenho a impressão que o Lula perdeu uma oportunidade de formar uma trincheira lá dentro do Banco.”

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/08/minha-opiniao-alta-agiotagem.html

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Estima-se em 14,2% o crescimento dos gastos dos governos estaduais com a segurança pública. Sem ações preventivas da violência criminal isso significa quase nada.

Leia: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/05/violencia-freia-turismo-no-rio-de.html 

29 agosto 2024

Minha opinião: jogo midiático

Debates na TV, pra quê?
Luciano Siqueira  

Desde o histórico confronto entre Kennedy e Nixon nas eleições presidenciais dos EUA, em 1960, em que se atribuiu em boa parte a vitória do democrata ao desempenho superior ao adversário em debate na TV, essa passou a ser uma das principais referências das campanhas eleitorais. 

Inclusive no Brasil, mesmo quando engatinhávamos no formato televisivo.

Muita coisa evoluiu desde então. 

E as campanhas foram incorporando cada vez mais o elemento midiático se sobrepondo à abordagem direta do eleitor.

O debate Lula x Collor, em 1989, recebeu da rede Globo, no dia seguinte, no Jornal Nacional, versão manipuladamente favorável ao candidato da direita, ao final vitorioso nas urnas.  

No último pleito presidencial, visível era o esforço de Bolsonaro, no confronto direto com Lula, em pronunciar frases desconectadas do contexto e praticar gestos ofensivos diante das câmeras, como que de encomenda, para edição e divulgação imediata nas redes sociais.

É onde a forma importa mais do que o conteúdo, o eleitor é submetido a um jogo de aparências e privado da percepção da essência de cada candidatura. 

E os tais "analistas" da grande mídia, deliberadamente, completam esse jogo de artifícios dando mais atenção a frases de efeito e a gestos histriônicos do que ao conteúdo.

Tudo a ver com a dominante comunicação digital, superficial e instantânea, que mais explora as aparências e a emoção do que o conteúdo — em sintonia com um ambiente da chamada guerra cultural, onde navega em plena ofensiva extrema direita. 

Em certa medida, as tais “sabatinas” a que são submetidos os candidatos nas diversas mídias se prendem ao mesmo conceito.

Ao G1, arguido pela jornalista Natuza Nery, o deputado Guilherme Boulos foi insistentemente pressionado a explicar em detalhes sua posição sobre os acontecimentos na Venezuela, como se esta fosse uma questão crucial para a governança da capital de São Paulo.

Às forças que pelejam nessas eleições com um olho na cidade e o outro nos destinos do país cabe explorar competentemente, e a seu modo, todas as possibilidades da campanha conjugada nas ruas, nos salões e nas redes.

Texto da  minha coluna desta quinta-feira no portal Vermelho

LeiLeia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2022/10/minha-opiniao_17.html 

Sylvio: Tartufo

Daqui de longe acompanho com apreensão a eleição para prefeito de São Paulo. Só o fato de ter um candidato de baixo nível e agressivo como o influencer Pablo Marçal, disputando e aparecendo nas pesquisas, é motivo de muita preocupação. A maior e mais importante cidade do País não pode correr o risco de cair nas mãos de tão despreparado e perigoso concorrente. Tenho certeza que a população nordestina da periferia não permitirá que isto aconteça.

Sylvio Belém

Arte é vida: John Koch

John Koch

 

Enio Lins opina

“Abaixo a censura” é a nova bandeira da velha direita?
Enio Lins   

Nos dias em curso, antigas consignas dos setores democráticos, as bandeiras “Liberdade de Expressão”, “Liberdade de Opinião” e “Contra a Censura” vieram a ser defraudadas (e desfraldadas) por quem defende mentira, calúnia, infâmia, difamação, fraude como direitos inalienáveis do ser desumano. Com o advento do oceano de oportunidades ofertadas pela internet, as indústrias das Fake News e dos crimes virtuais de todos os tipos passaram a nadar de braçada, embolsando fortunas e ganhando poder.

DECISÃO JUDICIAL

Vejamos o exemplo recente envolvendo o postulante do PRTB à prefeitura de São Paulo. Se a Justiça Eleitoral tivesse cassado a candidatura do dito cujo, pouca polêmica causaria, mas o fuzuê acontece porque o Juiz da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, Antônio Zorz, deferiu liminar solicitada pelo PSB de Tabata Amaral suspendendo temporariamente perfis operados pelo candidato Pablo Marçal nos canais Discord, Facebook, Instagram, Meta, TikTok e X (ex-Twitter). Corretamente, o magistrado fundamentou: “Destaco que não se está, nesta decisão, a se tolher a criação de perfis para propaganda eleitoral do candidato requerido, mas apenas suspender aqueles que buscaram a monetização dos ‘cortes’ por meio de terceiros interessados”. Mo-ne-ti-za-ção: aí está o nervo exposto! Os mais novos “inimigos da censura” temem me smo é a perda de receitas (mais das vezes enquadráveis em várias modalidades do Código Penal) e se apavoram frente à “intromissão ditatorial” da justiça nessa mina de ouro que é a internet sem qualquer regulação.

CONTRATAQUE

Pouco relevante, eleitoralmente falando, é o efeito dessa decisão liminar para as atividades digitais do ex-coach candidato à prefeitura paulistana, que praticava, às escâncaras, um formato digital da velha compra de votos, através de prêmios e recompensas para seus seguidores engajados em tarefas identificadas no linguajar informático como “cortes”. No mesmo dia da concessão da liminar, o político “censurado” espalhou um magote de “contas reserva” em substituição às silenciadas temporariamente. Segundo a mídia, ele recompôs, em apenas 72 horas, três milhões de seguidores nesses novos endereços. Eleitoralmente, a decisão judicial não rendeu grandes prejuízos ao candidato infrator, mas acendeu o sinal amarelão para todo mundo que se beneficia do desregramento amplo, geral e irrestrito que campeia no mu ndo digital, onde a monetização é muito importante – mas não único – modo de se ganhar bastante dinheiro.

LIBERDADE DE DESINFORMAR

Não é por acaso, muto menos de graça, que um notório adepto da Ditadura Militar como Jair Messias se esmera em defender a “liberdade de expressão e de opinião”, berrar “abaixo a censura” quando o regime fardado por ele defendido apaixonadamente teve na censura prévia um dos pilares de sua dominação. O ex-capitão teria mudado de ideia nesse item? Por que mudou? Mudou por quê? Na verdade, nunca mudou. Continua sendo um autocrata deslavado e um miliciano praticante, mas o fato é que as milícias se diversificaram e alcançaram os meios digitais e o mito achou melhor jair mergulhando neste novo setor, onde o crime compensa, e muito, até pela inexistência de uma legislação específica. O importante para a cidadania, entretanto, é que as velhas leis ainda encontram espaço, mesmo entrevadas pela idade, para pegar esses delinque ntes virtuais. Basta não se intimidar, perseverar e seguir a monetização – é por ali que a porca torce o rabo.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2024/08/historia-viva.html

28 agosto 2024

No X (ex-Twitter) @lucianoPCdoB

Big techs relutam ou retardam lançamento de inovações na Europa em razão das leis regulatórias. Ou seja, querem plena liberdade para exercer o seu poder à margem da soberania dos Estados nacionais.

Leia: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2023/04/o-peso-das-gigantes-tecnologicas.html 

Dilemas e desafios da esquerda

Walter Sorrentino: “inquietação é com a atual situação da nossa esquerda”
Entrevista com o presidente nacional da FMG, Walter Sorrentino, sobre a criação dos Grupos de Acompanhamento e Pesquisa (GAPs).
Portal da Fundação Maurício Grabois  

Em entrevista exclusiva, o presidente da Fundação Maurício Grabois e vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, demonstra preocupação com o futuro da esquerda brasileira. “Apesar das vitórias eleitorais democráticas, essas forças não têm estratégia mais clara ou unitária para tirar o Brasil da condição estrutural de dependência econômica e cultural num horizonte definido”, argumenta. Para superar esse desafio, a FMG começou a constituir, sob a sua liderança, os Grupos de Acompanhamento e Pesquisa (GAPs).

Nesta entrevista, Sorrentino explica como funcionarão os GAPS e quais são as suas expectativas. “Consideramos que só sob orientação socialista poderemos realizar o pleno potencial da nação brasileira e estamos dispostos a debater isso com todo mundo, principalmente com os trabalhadores e trabalhadoras”.

Walter, uma das apostas na reconfiguração do plano de trabalho da FMG parece ser  a criação dos Grupos de Acompanhamento e Pesquisa (GAPs). Você pode nos explicar de onde surgiu essa ideia?

Parece e é de fato. A Grabois terá esse projeto como um dos eixos estruturantes nesta nova fase. A ideia nasceu de profunda inquietação e de uma reflexão de fundo. A inquietação é com a atual situação da nossa esquerda política e social e as forças progressistas. Primeiro, porque, apesar das vitórias eleitorais democráticas, essas forças não têm estratégia mais clara ou unitária para tirar o Brasil da condição estrutural de dependência econômica e cultural num horizonte definido; aliás, hoje, há até mesmo dispersão nesse terreno quando se debate como superar a relativa estagnação destes últimos 40 anos. Segundo, porque tardamos a compreender que a luta política hoje se dá em grau muito elevado no palco da luta de ideias, em especial por meio das redes, onde as cor rentes neofascistas se inseriram com força e profundidade, enquanto nós seguimos nas velhas fórmulas de eleições, presenças institucionais, movimentos sociais e na agitação e propaganda, como dizíamos, com cultura muito letrada e abstrata. Ou seja, precisamos nos organizar mais e nessa dimensão, investigar mais essa nova realidade societária, estudar mais, formular sobre temas de fronteira, produzir conhecimento para oferecer soluções originais e exequíveis para os dilemas das pessoas e, sobretudo, disputar essas ideias por novos meios e formas na sociedade.

O projeto do GAPs quer ser esforço modestíssimo para ajudar a enfrentar essa inquietação. Porque se não há clareza e convicção de que há alternativas ao atual mal estar social, não se oferece esperanças, nem se conquista consciência e motivação daqueles que é necessário mobilizar. Gosto de pensar no projeto como sendo pequenas usinas produtoras de conhecimento transformador sobre temas que nos indagam.

Bem, em certo sentido isso sempre se colocou para os marxistas…

Sim, é verdade, sempre. Mas a inquietação se relaciona com reflexão de fundo. Nós, a esquerda, vivemos situação muito exigente. Não é hora de me alongar sobre isso. Dizer apenas que a grande questão desta quadra histórica é a das alternativas ao atual sistema dominante no mundo. Após 4 décadas da derrota estratégica do socialismo, o colapso do socialismo soviético, o mundo mudou. O que está em crise estrutural é o neoliberalismo e a ordem da globalização imperialista: é a crise do célebre aforismo “Não há alternativa!”, da Thatcher. Crise que provoca tensões e guerras sobre povos e nações, agrava todas as contradições provindas da desigualdade e falta de direitos. Aliás, está incubando as próprias vias neofascistas, vitimando a democracia. Enfim, o& nbsp; mundo capitalista produz profundo mal estar social em busca de saídas

Por outro lado, ao mesmo tempo vivemos num mundo grávido de profundas e rápidas mudanças, com desenvolvimentos revolucionários das forças produtivas e, positivamente, a teoria do socialismo amadureceu, avançando no enfrentamento dos problemas com soluções desbravadoras como ocorre na China.

Então, a questão precisa ser respondida de modo contemporâneo: quais as alternativas? Por quais caminhos e meios? Como elas alcançam formar maioria social e política, ou seja, o bloco político-social hegemônico? Essa é a questão, e ela envolve superar não só dilemas de formulação estratégica, caminhos e meios, que já referi, como também ultrapassar insuficiências teóricas já evidentes a esta altura. Dou três exemplos históricos sumariamente que demonstram essa exigência de superação, todos eles de sentido contra hegemônico: o êxito do nacional-desenvolvimentismo brasileiro e o grande marco da CEPAL e Celso Furtado; os êxitos atuais da China e o descortino teórico e político de Deng Xiaoping, que se desenvolve até hoje; as experiências do ciclo progressista no Brasil e Am&eacut e;rica Latina no século 21, demonstrando a não superação dos dilemas do desenvolvimento, até hoje, diria.

Penso que essas insuficiências se apresentam como exigências do desenvolvimento da teoria marxista. Mais propriamente: superar o descompasso na ciência social frente à realidade em mutação. Para ficar em poucos exemplos gerais, no campo da Economia Política e do novo desenvolvimentismo, da acumulação e regulação do capital sob a égide da financeirização, do valor-trabalho na era digital que se abre, da lei do desenvolvimento desigual em tempos de globalização financeira, do caráter e papel do Estado, bem como da disfuncionalidade de formas institucionais, novas formas de planejamento de projetos estratégicos…  Enfim, por que não dizer, atualizar a teoria da revolução e do socialismo, na melhor acepção da palavra, que para mim é a Revolução Brasileira. 

Como isso se relaciona com os GAPs?

Os GAPs se inserem aí. A proposta é estudar a realidade, o Brasil e os brasileiros, os desafios em tela, os temas essenciais para o projeto nacional no contexto internacional. O que é mais decisivo é formular nova agenda para o país, ambiciosa, mas exequível. O método é o de acompanhamento e pesquisa interdisciplinar, de temas de fronteira, sob a ótica conjuntural e estrutural, nacional e internacional, teórica e política. Tudo vai ligado ao novo projeto nacional e ciclo de desenvolvimento no Brasil.

Firmamos 7 eixos temáticos, interdisciplinares, voltados para o desenvolvimentismo em dimensão macro e microeconômica, as questões de Estado e conflitos institucionais, estudos sobre a sociedade brasileira, a transição digital envolvendo os impactos sobre o capital e o trabalho, a diversificação e segurança energética do país em meio à transição ecológica, o enfrentamento contra a extrema-direita e as guerras culturais e, finalmente, o observatório internacional, designando o contexto de potencialidades e limites do novo projeto nacional brasileiro. Cada qual tem sua ementa e todas elas dialogam entre si.

Os GAPs também terão uma intervenção mais conjuntural com a produção de opiniões e notas técnicas sobre debates atuais, certo?

É isso mesmo, e a pergunta é oportuna. Os GAPs se plugam na luta política, na mais elevada acepção da palavra, de poder político para um projeto político, não é? E, claro, as formulações precisam ser disputadas na sociedade e chegar aos sujeitos políticos que sustentam as lutas, certo? Fora disso, seria diletantismo eclético ou apenas conhecimento acadêmico. 

Nesse terreno precisamos ser mais ambiciosos, sem exclusivismo. Penso assim: não devemos ser os juízes de nós próprios, mas acho justo dizer que os comunistas brasileiros cultivam pensamento de vocação estratégica, marxista, internacionalista e centrado na questão nacional como eixo das demandas democráticas e sociais. Creio que isso é muito importante para toda a esquerda política e social brasileira. Os GAPs terão o desafio de dar continuidade em novo patamar a essa vocação e mostrar que temos muito a dizer. Daí o afã em produzir e organizar mais a disputa pelas ideias avançadas e promover publicamente os integrantes nas telas dos radares da luta política em curso.

Aproveito para dizer que os GAPs não são exclusivos para quadros do PCdoB. Não. A consigna da Grabois é a de espaço de pensamento marxista e progressista, e isso não é slogan: a gente se alimenta do conhecimento coletivo avançado. A Grabois quer ter protagonismo na interlocução com esses amplos setores sociais e intelectuais, ajudar a ser ponto de encontro e de união dessas vastas forças num sentido convergente. Vamos acolher opiniões e produções amplamente. O que nos une é o novo projeto nacional, não a sigla, qualquer que seja.

Por isso dedicamos atenção muito grande a uma nova estratégia de comunicação, que será o maior investimento da gestão da Grabois este ano. A linha central será exatamente a de transformar suas mídias sociais e o Portal em direção fortemente opinativa.  

Assim, as pequenas usinas que são os GAPs disporão de todo o arsenal da Grabois, o Portal, a TV Grabois e as mídias sociais, os boletins informativos, as malas diretas, revistas eletrônicas… Disse em ocasião anterior que é preciso promover algo como choque de oferta de opiniões avançadas e é o que tentaremos fazer. Conhecimento é para partilhar, difundir e mobilizar consciências, não para legar à história ou promover auto congratulações. É para disputar politicamente as ideias na sociedade.  

… e além de contribuir com a formulação do novo programa do PCdoB?

Isso, exato. A ideia de atualizar o Programa partidário é um polo magnético, tropos que dá eixo e estimula o trabalho dos GAPs. Mesmo assim, insisto, não é para debate apenas interno ao PCdoB. Vocês sabem, consideramos que só sob orientação socialista poderemos realizar o pleno potencial da nação brasileira e estamos dispostos a debater isso com todo mundo, principalmente com os trabalhadores e trabalhadoras. Nosso caminho para isso é forjar a agenda transformadora para o Brasil, novo ciclo da formação da nação, de autodeterminação, desenvolvimento soberano, socialmente inclusivo, ambientalmente sustentável, de integração regional sul-americana, sob direção de poder político de Estado de caráter democrático e popular.

Há também uma preocupação com a atualização da teoria marxista. Pode falar sobre isso?

Sim, como disse acima, quando mencionei a reflexão de fundo. Haverá a Comissão voltada ao exame das tendências e exigências de desenvolvimento da teoria marxista e da teoria do socialismo. Isso sempre foi eixo central da Grabois, todo o período que me antecedeu foi organizado em torno da crítica do capitalismo contemporâneo e a nova luta pelo socialismo. Isso agora vai enriquecido pelo contexto dos GAPs, trabalhando em sintonia, porque é a realidade concreta o ponto de partida para pautar desenvolvimentos da teoria, ou seja, o pensamento marxista precisa avançar focado em totalidades concretas como forma de impulsionar o sentido histórico universal do socialismo. No plano imediato, me parece claro que os projetos do governo Lula III representam eixos e vetores desafiadores. Num plano maior, acho também que é isso que o PC da China vem fazendo com o socialismo com características pr&oacut e;prias. 

E o que você nos diz sobre este momento dos GAPs e qual sua previsão dos próximos passos?

Finalizamos a fase de implantação, foi bem gratificante. Acredito em serendipidade: o projeto encontrou grande acolhida e motivação, era uma necessidade sentida, ainda não formulada. Formamos aqueles 7 núcleos, com orientação acadêmico-científica, que já contam com mais de centena de integrantes, ao lado da Comissão de Estudos Teóricos que já mencionei. Cada qual tem um plano e sistemática de trabalho. Construímos as coordenações, com viés assumido de estimular os quadros jovens e mulheres com formação acadêmica e científica para se integrar ao esforço, sem que esse nível de formação seja critério para participação no GAP.

A próxima fase será concretizar a pauta de trabalho regular. Vamos reunir regularmente os coordenadores para isso. Estamos estudando a formação de convênios e parcerias para projetos de pesquisas e dinamizar os trabalhos. E repito: fazer com que os integrantes sejam assíduos participantes da difusão da Grabois por seus meios de comunicação.  

Minha expectativa? Espero que os e as integrantes tenham paciência e diligência para pensar grande e longe. Diligência porque só com esses avanços teóricos, políticos e de projetos para a nação brasileira podemos reformular as estratégias e sustentar que há, sim, alternativa transformadora que convença a maioria da sociedade. Sinceramente creio nisso, não é apenas palavreado. Paciência porque a luta de ideias é muito exigente e sofrida, depende muito de cada indivíduo, do ardor e fome de conhecimento. Mais ainda no nosso caso, que travamos luta de sentido revolucionário. Acho, entretanto, que sempre foi possível combinar isso com a boa e necessária ambição política.

Enfim, a frente da luta de ideias é trincheira das mais necessárias hoje nas lutas de classes. Já ocupa lugar imenso e será crescentemente central para sustentar que há alternativas, sim. A Grabois vai fazer dela o prato de resistência na disputa política.

Leia também: https://lucianosiqueira.blogspot.com/2023/05/minha-opiniao_18.html