29 fevereiro 2016

Campo minado

Uma semana marcada pelas articulações golpistas, envolvendo a Operação Lava Jato em cumplicidade com a mídia reacionária e a fragilidade política do governo. Ambiente pleno de riscos. Leia análise de Luis Nassif http://twixar.me/6PP

Apesar da crise

Só em 2015, o governo federal aplicou R$ 251,7 bilhões no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 2015-2018, em parceria com estados, municípios e o setor privado. O valor equivale a 24,2% do total que deverá ser investido até 2018, estimado em R$ 1,04 trilhão. Leia mais http://twixar.me/7PP

Ação fascista

O Partido Comunista do Brasil-PCdoB de Sergipe repudiou o ato de vandalismo praticado contra a sua sede estadual, em Aracaju, no último final de semana. O muro do prédio, localizado no centro da capital, foi pichado com a frase “Volta CCC”, numa referência ao grupo paramilitar Comando de Caça aos Comunistas, que atuou no período da ditadura militar e foi responsável pelo sequestro e assassinato de pessoas contrárias ao regime de exceção no país. Leia mais http://twixar.me/PPP

Rasgando a Constituição

A Operação Lava Jato e a disseminação do fascismo

Aldo Fornazieri, no Jornal GGN
Hoje em dia é quase proibido ser petista no Brasil. Qualquer pessoa que seja identificada como militante ou simpatizante do PT é agredida verbalmente e corre o risco de ser agredida fisicamente. As agressões verbais de que foi alvo Chico Buarque são apenas um exemplo do que vem ocorrendo com milhares de pessoas pelo país a fora. Esse clima de violência verbal e física, de linchamento, vem sendo estimulado pelo juiz Sérgio Moro, pelos procuradores da Lava Jato, por setores da Polícia Federal, por políticos como Aécio Neves, Carlos Sampaio e Ronaldo Caiado, por grupos de extrema direita que pedem a volta dos militares e por setores da mídia. Petistas e simpatizantes honestos, que não praticaram nenhum crime, são criminalizados e perseguidos por essa onda fascista que se alastra na opinião pública.
É certo que o PT, pelos seus erros e pela arrogância exclusivista de se pretender a expressão da verdade num passado recente, também contribuiu para a geração desse ambiente. A virulência com que atacou Marina Silva na campanha, por exemplo, deixou muitos ressentimentos. Mas em favor dos petistas há que se dizer que não criaram um movimento persecutório e excludente, verbal e fisicamente, de adversários como este que se vê agora.
A operação Lava Jato, de ação mais republicana da Justiça brasileira, por ter prendido ricos poderosos envolvidos com a corrupção, descamba rapidamente para uma ação persecutória a serviço de interesses partidários e econômicos. O juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato são, cada vez mais, a expressão de um paradoxo que mistura terror jacobino e reação termidoriana.
Em nome do moralismo, por um lado, agem cada vez mais como um grupo de Robespierres, deixando de lado a técnica jurídica, a imparcialidade, a prudência que se requer de suas funções e a conduta comedida. Emitem juízos e prejulgamentos em despachos, ofícios e justificativas de operações e prisões, promovendo uma verdadeira suspensão das garantias individuais e do direito à defesa, atribuindo-se um poder excepcional que fere claramente o Estado de Direito. Neste lado da coisa, é como se o juiz Moro se elevasse à condição de “presidente do Comitê de Salvação Pública”.
Robespierre à luz do dia, o juiz Moro nega esse personagem à noite e se transveste de Paul Barras que quer instaurar um governo do Diretório através de um golpe de Estado para restituir o poder às elites com o apoio da Polícia Federal. Quer liquidar toda a ameaça representada pela “revolução petista”, pela participação do povo, coisas identificadas com a corrupção.
As decisões de Moro e de seu grupo são politicamente orientadas. As operações visam provocar dano político ao PT e ao governo. Na semana passada era aniversário do PT e desencadeou-se a operação para prender João Santana logo depois deste ter-se oferecido para depor. Não foi a primeira coincidência. Entre outras, na véspera da viagem de Dilma aos Estados Unidos em 2015, divulgou-se que os ministros Edinho Silva e Aloísio Mercadante estariam envolvidos com o escândalo da Petrobrás.
Moro e os procuradores assumiram um ativismo político e moral incompatível com a imparcialidade que se espera de um juiz e do Ministério Público. Transformaram a Lava Jato numa peneira, com vazamentos calculados, seletivos e politicamente orientados, num conluio inescrupuloso com setores da mídia, com o objetivo de produzir danos políticos ao governo e ao PT e de estimular o processo de impeachment.
O caminho da violência política
A estratégia de Moro e dos procuradores consiste no seguinte: lançam-se suspeitas, desencadeia-se operações, prende-se pessoas, promove-se uma pressão psicológica visando delações, e, em muitos casos, quando a pescaria é frustrada pelos fatos,  liberta-se os presos sem maiores explicações. A síntese: primeiro acusa-se, depois buscam-se provas. Na boa técnica policial e jurídica, antes buscam-se fatos e depois acusa-se. Em muitos casos da operação Lava Jato, isto tudo está invertido.
  Por tudo o que se sabe acerca do processo penal, o Ministério Público não pode ser visto nunca como parte formal do processo. A finalidade do Ministério Público não é obter a condenação, mas a de conduzir-se pela objetividade estrita dos fatos. Moro e os procuradores não só se toraram parte da operação Lava Jato, mas se alçaram à condição de juízes subjetivos  dos suspeitos emitindo condenações, antes do devido processo legal. Moro foi mais longe: tornou-se o juiz universal da corrupção no Brasil.
Se é verdade que o juiz precisa ter garantida a sua independência em face do poder político e da estrutura administrativa superior do próprio judiciário, ele está submetido também aos sistemas de impedimento e suspeições para que seja garantida a sua imparcialidade. No caso do juiz Moro, pelos juízos subjetivos emitidos e pelas decisões politicamente orientadas que vem adotando, parece evidente que ele se coloca cada vez mais na linha de suspeição de que não é imparcial. É legítimo, portanto, que se questione a sua presença no processo.
O terror moralista dos condutores da Lava Jato e seu engajamento político tem como face complementar o clima de linchamento político e de violência verbal e física que cresce e se dissemina em vários setores sociais. As pregações persecutórias dos grupos de extrema-direita a la Bolsonaro, de Aécio Neves, de Ronaldo Caiado e de Carlos Sampaio são como a infantaria de vanguarda das atitudes e condutas protofascitas que se verificam tanto em setores sociais, quanto em setores de mídia. Na mídia, os suspeitos também são previamente condenados.
As práticas fascistas se viabilizam pelas ameaças veladas ou abertas, acusações sem fundamento, afirmações infundadas, condenações subjetivas, violação ao direto de argumentar e interdição ao debate. Os xingamentos  a quem pondera as decisões dos operadores da Lava Jato, a quem cobra a imparcialidade da Justiça, a quem defende a investigação igual de todos os partidos e de todos os casos de corrupção são consequências desse movimento articulado dos operadores da Lava Jato e do sentimento de poder absoluto que eles emanam e que setores da mídia promovem. O estado de exceção que eles instauraram no processo investigatório e judicial se dissemina como direito excepcional que a mídia se dá de condenar previamente e que as pessoas se dão de agredir verbal e fisicamente os que pensam de forma diferente sobre a Lava Jato ou que simpatizem com o PT e o governo.
No século XX, os movimentos e práticas fascistas sempre se viabilizaram em confronto com a lei. A violência verbal e física, o clima de linchamento político e moral, a intepretação própria do conjunto de leis estabelecidas, a parcialidade de juízes e de agentes públicos foram práticas que visaram negar os consensos jurídicos, legitimar a ilegalidade e viabilizar a arbitrariedade e o medo. Em nome da justiça e da condenação da corrupção, caminha-se para negar a legalidade. O legado destes processos, todos sabem: é a violência política e a desmoralização do próprio judiciário enquanto instrumento da justiça e da legalidade. Parece que é isto o que querem os protofascistas incrustrados no judiciário, no Ministério Público, em setores da política, da mídia e da sociedade.
Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo
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Mesmo sob fogo cerrado...

Em qualquer cenário, seja com Aécio Neves, Geraldo Alckmin ou José Serra como candidato do PSDB, o ex-presidente Lula aparece no segundo turno pelo PT, segundo novo levantamento Datafolha, com 20% das intenções de voto, em média; dados marcantes da pesquisa são o mau desempenho dos tucanos e a rápida ascensão do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que figura como quarto colocado; ele deve ir para o PSC para se candidatar; em um quarto cenário com 3 tucanos na disputa, caso Alckmin se lance pelo PSB e Serra pelo PMDB, Aécio ficaria tecnicamente empatado com Lula na liderança, com 20 e 19%, respectivamente; Alessandro Janoni, diretor de pesquisas do Datafolha, destaca a capacidade de recuperação do ex-presidente: “A taxa de rejeição dele é alta hoje, mas ainda há um contingente grande (37%) que o considera o melhor presidente que o país já teve e uma percepção do eleitor de que haverá melhoras na economia". Leia aqui http://twixar.me/2RP

28 fevereiro 2016

Radioatividade

Há um tópico no vasto currículo da radioatividade que nem todos conhecem: esse fenômeno nuclear, descoberto em 1896, vem, nos últimos cerca de 100 anos, ajudando profissionais da saúde a salvar um sem-número de vidas. Leia no artigo publicado na CH 333. Há pouco mais de 250 isótopos estáveis na natureza, e são conhecidos mais de 3 mil deles instáveis. Entre estes últimos, pouco mais de 80 são de ocorrência natural, e o restante é produzido artificialmente. Chama­-se isótopo radioativo ou radioisótopo aquele que é instável, ou seja, passível de sofrer um processo chamado decaimento radioativo  ou desintegração radioativa. Leia aqui http://twixar.me/XRP

Ameaça

Após Pré-Sal, direita já possui planos de privatizar a Petrobras  = Poucos dias depois da aprovação, no Senado, do projeto do senador José Serra (PSDB-SP) que determina o fim da participação obrigatória da Petrobras na exploração do pré-sal, o que abre o negócio para empresas estrangeiras, a direita brasileira, empolgada, já quer privatizar a estatal. Leia aqui http://twixar.me/SRP

Presença de Umberto Eco

Apocalípticos e integrados

Eduardo Bomfim, no portal Vermelho

O mundo literário lamenta o falecimento do grande pensador italiano Umberto Eco (1932-2016) e ao mesmo tempo celebra a rica produção intelectual de homem lúcido no mundo ocidental e dos tempos contemporâneos.
Especializado em filosofia, semiologista, medievalista, autor de vários tratados, obras de ficção de repercussão, Umberto Eco também foi, de várias maneiras, um crítico e ensaísta sobre a globalização, a matriz neoliberal e a ideologia dominante no atual período Histórico que vivenciamos.
Autor de O Nome da Rosa e o Pêndulo de Foucault, entre vários best-sellers, lançou em 2015 outro livro polêmico, Número Zero, uma narrativa ácida sobre o atual papel da grande mídia hegemônica global.
Com Apocalípticos e Integrados (1964) traça uma crítica à grande mídia mergulhada numa visão elitista e nostálgica da cultura, ao tempo em que numa atitude cúmplice divulga os produtos culturais ocultando o modo como são produzidos.
Em Número Zero mostra como a chantagem política seria o motor de um jornal que jamais seria publicado, mas sua edição experimental era o próprio mote de uma sórdida trama que, embora ficcional, correspondeu, de fato, à vida política italiana no final do século XX.

Para um dos seus personagens, essa grande mídia não é feita para revelar mas para encobrir as notícias que interessam aos grupos oligarcas que em última instância ditam as regras na sociedade.

As reflexões de Eco têm valor universal já que a preponderância das forças do Mercado financeiro, das corporações legais, ou mais ou menos subterrâneas, continuam dando as linhas editoriais da mídia hegemônica.

É o que acontece no Brasil, e na América Latina, quando os mesmos atores arquitetam o retorno econômico para a via ultraliberal e o democrático rumo a um Estado de Exceção.

Sob a idealização de que a retomada da democracia por si só resolveria os nossos grandes problemas, o País procura agora, imerso em substancial crise institucional, o norte que afirme um projeto nacional de desenvolvimento estratégico, as grandes reformas sociais inadiáveis, o Estado de Direito indeclinável, a soberania ameaçada.

Assim, nessa peleja não há uma terceira via. Ou se está com o progresso social, a autonomia nacional, ou, de um jeito ou de outro, alinha-se com o retrocesso econômico e institucional.
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Boa noite!


Moro hoje como os ditadores de antes

Na República de abril

Nagib Jorge Neto*

Nesta República do “teje preso”, ou de “um abril sem fim”, em tempos de ditadura ou de democracia, os intérpretes ou guardiões da lei agem quase sempre certos de que as suas decisões ninguém questiona ou deixa de cumprir. Assim a deusa “Themis, que nada teme” tentou reagir aos atos arbitrários do governo militar, com cassações de parlamentares, prisões e torturas de servidores públicos, professores, religiosos, líderes sindicais e estudantis. 
Diante da violência, o presidente do Supremo, Ministro Ribeiro da Costa, entregou as chaves ao General Presidente, Marechal Castelo Branco, por discordar da “intenção de fazer com que o STF desse a impressão de ser composto por onze carneiros, que expressam sua debilidade moral, fraqueza e submissão”. 
O General Castelo não aceitou o fechamento do STF, mas sob pressão de seus aliados - Costa e Silva, Carlos Guedes e Mourão Filho - decidiu aumentar para 16 o número de ministros. Depois puniu os ministros Victor Nunes Leal, Hermes Lima, Evandro Lins e Silva (cassados); Gonçalves de Oliveira, Lafayette de Andrada (saíram por discordar das cassações); e Adauto Lúcio Cardoso (deixou a corte por discordar da lei de censura prévia). 
Na época o STF ficou com 11 ministros, que aceitaram passivamente as denúncias, prisões, torturas, desaparecimentos e mortes em tiroteios simulados. Os “revolucionários” aceitavam qualquer delação, prendiam sem provas ou forjavam provas, numa espécie de aceitação do “domínio do fato”, teoria do alemão Klaus Roxim, que exige provas e entre nós foi deformada pelo ex-ministro Joaquim Barbosa, que condenou com base em indícios, testemunhos, com aprovação de quase todos integrantes da corte. 
Essa medida, tal como no regime militar, vem sendo a norma das ações do juiz Sérgio Moro, dos procuradores, que agem à revelia da lei, da Constituição, com base em denúncias típicas do regime militar, agora sob a forma de “delação premiada”. A rigor são bandidos que atuam na base do ouvi dizer, ou que ele ou alguém tem provas e daí são louvados como heróis, pessoas de bem, pela mídia e pela oposição, por políticos como Aécio Neves, Ronaldo Caiado, Roberto Freire, Jarbas Vasconcelos, Eduardo Cunha e Agripino Maia. Eles são partidários de um golpe de Estado pelo Congresso ou pelo Tribunal de Contas da União, com respaldo do STF – Corte com a primazia de errar por último, segundo Nelson Hungria – e que de forma subliminar vem tentando forçar o governo a aceitar um aumento absurdo para os servidores do judiciário. Enfim persiste a república do “teje preso” ou do país que começa e termina em “um abril sem fim”, visto como um país ocupado, criticado pelo grande poeta Joaquim Cardozo.
* Nagib Jorge Neto é jornalista, Prêmio Esso Nacional de Informação Econômica, bacharel em direito e escritor.   
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Boi na linha

Agenda classista

André Singer

Ao dar centralidade à reforma da Previdência, o governo força divisão que dificultará a formação do pacto pró-retomada do desenvolvimento. Sindicalistas e empresários produtivos, que haviam se reaproximado no final de 2015, tenderão a se dividir. Não é para menos: a seguridade social está no centro da luta de classes contemporânea.
Marx demonstrou que, no capitalismo, a mais-valia, parcela do trabalho não paga e que aparece sob a forma de lucro, contrapõe de modo inconciliável patrões e empregados. Onde há venda da força de trabalho, existe exploração. Poder-se-ia dizer, então, que o assalariamento, em si, seria o pomo da discórdia.
Ocorre que o desenvolvimento histórico real deslocou a peleja para mecanismos que, sem eliminar o salário, compensam parcialmente a exploração. Usa-se parte dos fundos públicos para devolver ao assalariado algo do que lhe foi sonegado no processo de produção. A disputa fica em torno de quanto do recurso comum será destinado a essa compensação.
O empresariado quer limitar a expansão do total disponível (corte de impostos) e carrear a maior parcela do mesmo para a remuneração do próprio capital, por exemplo, via juros (superavit primário). Os sindicatos buscam sempre aumentar a parcela destinada a proteger os que vivem apenas do próprio labor.
Analistas de diversas tendências advertem, sem prejuízo de alguns reconhecerem as premissas acima, que a parcela da riqueza destinada ao fundo público tem limitações físicas. Não adianta tentar distribuir o que não existe. Acentuam, também, que o aumento da expectativa de vida implica gastos crescentes pelo simples fato de as pensões terem que ser pagas por muito mais tempo. Somados os dois fatores –disponibilidade real e envelhecimento prolongado–, concluem pela necessidade de repactuar o tema previdenciário.
Do ponto de vista teórico, eles têm parcela de razão. O que não nega o caráter classista que o debate vai, inevitavelmente, adquirir. Constatado que o tamanho relativo do bolo diminuiu, fica mais acirrada a disputa pela parte que cada um vai receber.
Será que o melhor momento para deflagrar este embate de soma zero –os que uns ganham, outros perdem– é o de uma economia em profunda recessão? Não seria melhor esperar período de expansão para, com maior margem, impor perdas menores a quem quer que seja? Ou será que o capital avalia que, em virtude do desemprego, a resistência do trabalho será agora menor? Neste caso, compete a um suposto governo de trabalhadores cumprir o papel de aríete? 
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Golpismo

O caminho e o desaste

Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo
O Brasil experimentou uma democracia frustradamente reformista, passou por golpe de estado, sofreu a tragédia da ditadura militar, voltou à democracia caótica, e chegou. Chegou outra vez aos primeiros anos da década de 1950. O golpismo, o "entreguismo" ameaçador e a "república do Galeão" foram os estigmas daqueles anos. O golpismo volta no estilo PSDB; acompanha-o o "entreguismo" apontado na retirada de pré-sal da Petrobras, aprovada pelo Senado; e a versão civil da "república do Galeão", sob o nome insignificante de Lava Jato, evidenciam juntos o estágio em que o Brasil de fato está.
Mas, se é desculpável a imodéstia de quem se aproximava da vida de adulto naquela década, o pequeno Brasil que não era então menos discriminatório e menos elitista, no entanto era mais inteligente, culto e criativo, menos incivilizado em suas cidades e muito, muito menos criminal.
O mundo se mediocriza, é verdade. A França o prova e simboliza. Mas o Brasil exagera, iludido por uns poucos e duvidosos avanços econômicos. Como a indústria automobilística, por exemplo, que sufocou os transportes públicos e deformou as cidades, dois efeitos antissociais no sentido menos classista da palavra. A degenerescência entra, porém, em fase nova. E acelerada.
São já os esteios do esboço de democracia a sofrerem investidas corrosivas. Ainda que sob outras formas, são prenúncios de repetição, se não contidos em tempo, dos desdobramentos lógicos que períodos como os anos 50 produzem, historicamente.
É melhor, e é urgente, que se comece a forçar o Congresso a ser menos infiel às suas finalidades institucionais e mais responsável com suas funções, seja em apoio ou oposição ao governo. Muitos poucos estão ali, em especial entre os deputados, para serem parlamentares. Dividem o seu tempo entre ser massa de manobra de interesses alheios e agir por interesses subalternos próprios. Uns e outros cada vez mais contrários à instituição e à democracia pretendida pela maioria do país.
A ministra Cármen Lúcia foi muito aplaudida pela invocação, em seu literário voto por liberdade biográfica, ao bordão "cala a boca já morreu". Ninguém observou que o complemento foi omitido: "quem manda aqui sou eu". O bordão é, na verdade, de extremo autoritarismo. Amputá-lo valeu como definição pessoal.
Mas não é o meio bordão, é o autêntico, realista, que os fatos já justificam: partes do Judiciário e do Ministério Público agem como se respondessem aos direitos civis (e por tabela a quem os defenda): cala a boca já morreu, quem manda aqui sou eu. E mandam mesmo, pela reiteração e pela indiferença, porque as instâncias com autoridade e meios de corrigir as deformações não o fazem, acomodadas no seu próprio poder ou intimidadas pela parcela da sociedade adepta do bordão. E os direitos e a Justiça se esvaem.
Crises políticas não se agravam sem imprensa. Crises econômicas expandem-se menos e menos depressa sem imprensa. Hoje em dia a imprensa brasileira pratica uma solidariedade de modos com as deformações no Congresso, no Ministério Público e no Judiciário. Assola-a nova onda de relaxamento dos princípios éticos, para não falar em qualidade jornalística. E cresce a cada dia uma grande dívida de autocrítica, para relembrar as responsabilidades dos jornalistas profissionais. Com medo da internet, a imprensa brasileira foge de si mesma.
O Brasil não é bem-vindo aos anos 1950. 
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Na luta

Lula, na festa de aniversário do PT, ontem, no Rio deJaneiro: “Eles pensam que, com essa perseguição, vão me tirar da luta. Eles não conhecem o PT. Se quiserem me derrotar, não vão me derrotar mentindo. Terão que me enfrentar nas ruas, conversando com o povo brasileiro”, disse Lula. “Se eles quiserem voltar ao poder, vão ter que aprender a ser democráticos, disputar eleições e acatar o resultado. Se eles quiserem, se preparem para 2018. Afiem suas garras." 

27 fevereiro 2016

Boa notícia

Embraer na contra mão da crise: investe R$ 6,8 bilhões e lança nova família de jatos comerciais.

Quem é ele

. O nome dele é Newton Ishii, mas ficou mais conhecido como o "japonês da federal", porque tem aparecido em praticamente todas as fotos ao lado de empresários e políticos investigados na Operação Lava Jato. Segundo informações levantadas pelo jornalista Marcelo Auler, em seu blog, Ishii foi preso, em março de 2003, na primeira entre as grandes operações policiais do governo Lula, chamada Sucuri.
. O japonês e outros 22 agentes da PF, sete auditores da Receita Federal e três Policiais Rodoviários, junto com contrabandistas e intermediários, foram acusados de participar de um esquema, em Foz do Iguaçu, na fronteira do Paraná com o Paraguai, que permitia a entrada de veículos no país com valores altos em dólares sem o pagamento de impostos. (Brasil 247)

26 fevereiro 2016

O peso da juventude

UJS: com nossos princípios, pelo Brasil

Nilson Vellazquez, em seu blog
Nestes momentos, as ideias são como bússolas. Umas a indicar orientação firme e duradoura; outras, impotentes frente à violência do maremoto, conduzem para o naufrágio
Aldo Rebelo - primeiro presidente da UJS

Em meio à gravidade de crises como a que o Brasil vive atualmente, cujos riscos de desmantelamento da economia nacional, de perda de direitos conquistados a duras penas e, principalmente de perda dos direitos democráticos, é muito comum, sobretudo entre os mais jovens, reações radicalizadas, longe do equilíbrio necessário para entender a natureza da crise. De um lado, aqueles que sucumbem às pressões da ideologia neoliberal, que, no caso do Brasil atualmente ignoram os fatores externos e atribuem todas as mazelas ao "mal da corrupção"; do outro, os que acreditam que uma "guinada à esquerda" que faria todas as mudanças que os povos e trabalhadores precisam depende única e exclusivamente da vontade, desprezando-se a correlação de forças e as idiossincrasias nacionais e sua história.
A UJS, organização de jovens fundada em 1984, assim como o PCdoB, nunca agiu para que fossem agradados os ânimos do senso comum, mas em comunhão com seus princípios, de defesa da juventude, do socialismo e do Brasil. Esses princípios permitiram que durante, seus mais de 30 anos de história, essa organização, embora jovem, buscasse o equilíbrio, ousadia e táticas corretas para enfrentar os desafios de seu tempo. Segundo Aldo Rebelo, "a UJS nasceu como necessidade da retomada de um projeto de organização da juventude em torno das ideias avançadas, da luta pela democracia, pela independência nacional e pelo socialismo."
Esses princípios permitiram que a UJS, sempre que necessário, assumisse a linha de frente nos mais variados episódios da história recente de nosso país em que foi chamada à luta. Mesmo que vários brasileiros tenham sucumbido à micropolítica da "popularidade", ou às pressões midiáticas que diuturnamente jogaram contra os projetos de mais liberdade, justiça social e soberania nacional.
Assim, sem titubear, a UJS apoiou a candidatura de Lula em 89, assim - entendendo o papel central da defesa da soberania nacional - promoveu diversas campanhas em defesa da Amazônia, assim defendeu o impeachment de Collor, por entender o projeto que o mesmo tentava aplicar - o neoliberalismo. Foi através da prática que foram demonstrados os princípios em defesa do socialismo, nos diversos atos anti-imperialistas, contra a guerra do Iraque, contra G.H Bush, etc.
Essas decisões políticas estão centradas num inquebrantável sentido de classe dado às decisões políticas que a organização toma. É na justa comunhão das palavras juventude, socialismo e Brasil que se impulsiona a defesa de Lula, da figura valiosa que o mesmo representa para o Brasil, para a esquerda e para a juventude. Foi por entender o caráter de classe das lutas políticas travadas no Brasil desde a eleição de Lula que defendemos o seu governo em 2005 no auge da crise do mensalão.
Por isso, mais do que nunca, as ideias são como bússolas. Em tempos de dificuldade, ter certeza do projeto que pretendemos construir é central, para não sucumbir a posturas liberais, esquerdistas ou pragmáticas. Os princípios de classe, anti-imperialistas e nacionalistas precisam estar acesos para fazer explodir ainda mais a vontade de milhares de jovens invadirem as ruas em defesa do Brasil. Dias assim valem por anos. Exércitos como a UJS valem por milhões. Com nossos princípios, pelo Brasil, vamos à luta!
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Bom sinal

O comércio eletrônico registrou crescimento nominal de 15% no faturamento, movimentando R$ 41,3 bilhões em 2015. A previsão é que, até o fim do ano, o e-commerce nacional fature R$ 44,6 bilhões, o que representa um acréscimo nominal de 8%, em relação ao período anterior, de acordo com a 33ª edição do relatório WebShoppers, elaborado pela E-bit/Buscapé http://migre.me/t6haT

25 fevereiro 2016

Anti terror?

Os deputados rejeitaram, nesta quarta-feira (24), o texto do Senado ao projeto antiterrorismo, mantendo o texto aprovado pela Câmara em agosto do ano passado. O projeto tipifica o terrorismo como a prática, por um ou mais indivíduos, de atos por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou religião. A bancado do PCdoB rejeitou o projeto do Senado, mas critica a nova lei. Leia aqui http://migre.me/t68jb

"O petróleo é nosso"

Petrobras é do povo

Jandira Feghali, no portal Vermelho

“O que será da Petrobras?”, questionam muitos. Ler os jornais faz crer que a estatal, uma das maiores petrolíferas do mundo e com reservas para mais de quatro centenas de anos, está próxima da derrocada. Depreciação que só interessa à oposição entreguista e às empresas estrangeiras. É o motivo da pancadaria sistemática.
É uma imoralidade alegar que a estatal – maior vítima de uma operação construída de forma subliminar a atingir o Governo Federal e a Esquerda brasileira – tenha se desvalorizado. Empresa forte e estratégica, a Petrobras impulsionou o Brasil a patamares exclusivos de autossuficiência energética e soberania a partir dos governos Lula e Dilma.
Alcançou esse cenário confortável e de respeitabilidade internacional com investimentos diretos. Os que se assustam e alardeiam a dívida da Petrobras se esquecem que ela é fruto de uma estratégica guinada para potencializar suas atividades em território nacional e internacional, com visão de futuro – e isso incomoda muita gente. Não só aqui, mas em vários países desenvolvidos, essas empresas são parte central da estratégia de poder da nação. Aqui, a mesma prática é vista com um desprezo cínico e oportunista.
Em 2002, no pós-FHC, nosso país ainda era covardemente dependente de energia importada da Bolívia e da OPEP. Era explícito que o governo tucano resultou em desastre no que se refere à estatal. Sua inabilidade na condução das políticas de matriz energética no país durante a década de 90, aliada ao entreguismo do patrimônio nacional, fez da Petrobras um gigante de “pés de barro”. Éramos dependentes de tudo nesta época quanto à geração de energia, por exemplo, reféns de fornecedores externos e até da boa vontade de “São Pedro” para sustentar nossa principal matriz hidroelétrica.
O que se seguiu na gestão de Lula foi a aposta no conteúdo nacional e o fortalecimento da estatal como motor do desenvolvimento nacional. Ampliação de recursos na estatal, aumento da competitividade no mercado externo, a construção de uma malha de dutos ampla, como o gasoduto-tronco que interliga todo o território nacional (do sul à Fortaleza), o aproveitamento de grandes reservas de óleo e gás natural das águas ultra-profundas que banham Sergipe, três terminais de regaseificação, um gasoduto de 650 km através da floresta amazônica ligando as reservas da Província de Urucú a Manaus e as imensas e famosas reservas do pré-sal no litoral atlântico. Isso é apenas parte dos avanços obtidos.
Ainda há uma imensa rede de pesquisa em parceria com universidades públicas para química, gás, petróleo e engenharia e, até 2019, estima-se investir mais de R$ 400 bilhões em seu Plano de Negócios. Mais de 80% direcionados à exploração e produção da matéria prima, inclusive no exterior, além de abastecimento interno. A saúde da Petrobras é um pesadelo para quem aposta contra, mas os ataques se sucedem.
Há alguns meses, tucanos tramam por meio de projeto do senador José Serra, a modificação do regime de participação da Petrobras no pré-sal. O mesmo senador que manteve conversas com a petrolífera Chevron vazadas na internet, em acordo para venda e ataques à estatal. Na Câmara tentam aprovar um projeto que acaba com o avançado marco regulatório da partilha. Essas iniciativas integram o pacote de maldades da oposição com sua desestruturante agenda neoliberal contra o Estado brasileiro, e vale ressaltar: derrotada nas urnas. Querem impor o projeto deles.
A bancada do PCdoB se articula contra essa tentativa e disputará a opinião pública com coragem e altivez, porque acredita no desenvolvimento do país através de patrimônio nacional forte, consolidado e competitivo.
Se hoje alguns jornais contam mentiras em prol de um projeto neoliberal, amanhã os livros de história revelarão todas elas.
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Agenda regressiva

Aprovar na surdina projetos que fragilizam as estatais brasileiras e abrem caminho para a privatização parece ser a orientação no Senado Federal. Entre as prioridades da Casa estão a votação dos Projetos de Lei do Senado (PLS) 555 e 131, este de autoria de José Serra (PSDB), que poderá ser votado nesta quarta-feira (24). Representantes do movimento social denunciam a falta de debate. Na opinião deles, é o retorno da pauta neoliberal. Leia aqui http://twixar.me/SXP

Mídia cúmplice

Miriam Dutra abre o quarto de despejo dos anos 90

A cumplicidade entre o dinheiro, a soberba e a mídia contém uma atualidade demolidora. A mídia foge desse garimpo porque é parte indissociável da lama.
Saul Leblon, na Carta Maior
Por que só agora que o PT está a um degrau do cadafalso?
A suspeição que o jornalismo tucano consegue balbuciar em meio às alvejantes declarações de Mirian Dutra sobre a parceria público privada para silenciá-la no governo FHC, carrega um efeito bumerangue demolidor.
Pode ser respondida com uma arguição.
‘Quem publicaria antes, a história que furou um cerco de 23 anos de obsequiosa cumplicidade da mídia brasileira com esses acontecimentos, para somente agora vir a público num relato demolidoramente crível? (‘Só eu tenho condições de levar este país’, dizia o príncipe à jovem plebeia, há um mês da conquista).
Mirian Dutra abriu o quartinho de despejo dos anos 90. E mostra o que tem lá dentro.
Sua fala carrega a credibilidade de quem –convencida ou conivente-- fez parte do acervo.
O que avulta nessa visitação retrospectiva  são os bastidores de um projeto de poder e de interesses que se blindaram para mudar a lógica do desenvolvimento brasileiro.
‘Coveiros do ciclo Vargas’ não era assim que se jactavam aos mercados?  Terceirizar o timão brasileiro ao mercado internacional requeria um método para vencer a travessia politicamente espinhosa.
O método, baseado num pacto granítico entre a mídia, os interesses afluentes e o vale tudo ético, é o que guarda o quartinho escuro escancarado agora.
Mirian, num dado momento, tornou-se um cisco no olho guloso do visionário do neo- renascimento bancado pelo capital financeiro global, e que se via como o Micheangelo Buonarroti  da Capela Cistina brasileira.
Foi preciso expurga-la. O que se fez com a mesma determinação ética e a coesão grupal dos interesses que se fundiram na travessia preconizada para o país.
Surpreende que a mídia isenta tenha fugido dessa personagem por 23 longos anos, dispensando-lhe  uma mordaça de silencio e dissimulação conivente?
Que veículo ou editor da chamada grande mídia teria bancado antes, e com o destaque merecido, a nova e demolidora entrevista concedida pela ex de Fernando Henrique Cardoso, neste final de semana, a um veículo alternativo?
Será necessário lembrar que na anterior, feita pela Folha de São Paulo, perguntas e nominações essenciais  envolvendo a mídia foram evitadas?
E que depois disso o veículo dos Frias –cumprida a formalidade das aparências— suprimiu o assunto da primeira página mostrando estranha inapetência investigativa diante de pautas que gritam?
Quais?
Por exemplo,  a história do jornalista lobista, já falecido, Fernando Lemos. Personagem expressivamente próximo de FHC, cunhado de Mirian Dutra, foi ele que mediou a participação da Brasif na operação para tirar Mirian do país e assim salvaguardar o tucano de constrangimentos na reeleição.
Lemos fez dinheiro no governo FHC com serviços de consultoria. Muito dinheiro. Participou do círculo estrito do poder que decidia inclusive as campanhas políticas de FH. Sua viúva,  Margrit Schmidt, segundo a própria irmã contou ao Diário do Centro do Mundo,  possui  ‘apartamentos, um terreno em Trancoso que vale  ‘um milhão’ e conta no Canadá’.
Mas ainda recebe recursos públicos como funcionária lotada no gabinete de José Serra, onde nunca comparece. Resquícios da ‘modernização’ das capitanias hereditárias pelo avanço neoliberal.
Eterno aspirante à presidência da República, Serra se declara  velho amigo e parceiro de ideias da funcionária-fantasma, que  brada contra a corrupção e a  ‘corja’  do PT’  no  facebook. Serra também é amigo muito próximo do pecuarista Jonas Barcellos, que bancou Mirian e ganhou rios de dinheiro
com o monopólio dos freeshops no governo do PSDB.
Guarda esse tipo de álbum de recordações o quartinho de despejo dos anos 90 agora entreaberto, mas que a mídia quer lacrar e implodir.
A indiferença ética, o tráfico de influência e a lubrificação do dinheiro público a serviço do interesse particular condensados no episódio Mirian Dutra, não formam, como se vê, um ponto fora da curva  no modo tucano de governar as relações entre Estado e mercado; entre capitalismo e democracia, enfim, com papel subalterno ao segundo elemento da equação.
Se pouco disso transparece ainda no debate político, deve-se ao protagonista ubíquo dessa trama.  
A mídia figura como o grande Rasputin a coordenar os personagens desse ambiente farsesco em que as aparências não apenas são avalizadas, mas diretamente modeladas, conduzidas mesmo pelo poder midiático até a asfixiante rendição à narrativa pronta nas redações.
Ou Mirian Dutra não foi ‘induzida’ a dizer à Veja a frase para a qual Veja já tinha espaço, lugar e título, antes que a personagem soubesse que sua boca iria emiti-la?
Esse o paradigma da isenção que ordenava e ainda rege o sistema do monopólio emissor consolidado sob as asas do ciclo do PSDB na presidência do Brasil.
O maior conglomerado de comunicação do país e a principal revista semanal do mercado brasileiro –as Organizações Globo e a semanal Veja--   não apenas informaram um script conveniente à reeleição de FH.
Elas ajudaram ativamente a produzi-lo --a exemplo do que fez a Folha nos anos 70, quando cedeu carros à repressão.  
O tour de force para despachar Mirian é só um exemplo em ponto pequeno do empenho que movimentou grandes massas de interesses para o ciclo privatizante que viria então.
Nenhuma delação extraída pelo método da chantagem coercitiva, tão bem manuseado pela República do Paraná, carrega a delicadeza convincente desse desabafo –ao que tudo indica apenas iniciado—de uma mulher que talvez não tenha mais nada a perder.
Recém demitida pela Globo, Mirian provavelmente perdeu também a mesada que recebia de FHC e viu a relação com o filho ser trincada pela intempestiva intervenção do tucano que –em troca de um DNA polêmico--  supriu Tomás com mesada própria, comprou-lhe um apartamento, pagou-lhe os estudos em caras universidades norte-americanas.
A mãe do filho que FHC lhe dizia que não poderia ter em seu nome decidiu agora reagir com o que tem de mais letal: a memória.
Mirian Dutra apenas começou a falar. Parece que tem muito a dizer: ’Serra eu conheço bem...’, cutucou de relance na última entrevista.
Desde o início desse episódio Carta Maior tem insistido em que as relações entre um homem e uma mulher formam um assunto privado.
Mas a participação da mídia, de concessionárias públicas, bancos estatais e paraísos fiscais no caso fazem dele um tema público.
Foi a cobiça  e a ganância econômica  que politizaram o encontro entre o sociólogo cinquentão e a jornalista jovem;  não o inverso.
A descrição impressionantemente crível, repita-se,  do método tucano que Mirian Dutra relata em detalhes dá materialidade a tudo o que o PSDB ora denuncia e atribui aos adversários, sobretudo ao PT.
É um revés de dimensões esfarelantes.
As revelações em conta gotas trazem um olhar de dentro do fastígio das elites no poder nos anos 90.
Um olhar de alguém que circulou nas vísceras do condomínio cristalizado na farra da privatização, quando se desferiu um dos mais virulentos ataques à luta pelo direito a um  desenvolvimento justo e soberano.
Conhece-se o custo contábil do desmanche patrimonial que fragilizou a capacidade articuladora do
Estado e definhou a governabilidade democrática,  subordinada  desde então à supremacia dos capitais desregulados.
Abre-se  a possibilidade agora de se iluminar o interior da  engrenagem  rapinosa.
Não para produzir uma arqueologia do revide.
Não para se nivelar ao vale tudo dos que buscam aniquilar  as forças e lideranças empenhadas na reversão do desmonte para construir uma democracia social no coração da América Latina.
O que está em jogo não é o passado; é a urgência de se devolver esperança ao futuro.
O passo seguinte do desenvolvimento brasileiro enfrenta uma encruzilhada histórica. Um ciclo de crescimento se esgotou; outro precisa ser repactuado em novas bases.
Muitos dos personagens e interesses econômicos que atuaram no episódio Mirian Dutra –  FHC, Organizações Globo, Veja, Jorge Bornhausen, José Serra  etc—   compõem a linha de frente da ofensiva conservadora atual, determinada a retomar o poder, custe o que custar, para concluir o serviço  dos anos 90.
O mapeamento dessas peças do xadrez ganha luminosidade desconcertante nas revelações  de Mirian Dutra.
Elas permitem recompor a seta do tempo que une a lógica e a ética dos anos 90 ao projeto intrínseco ao golpismo em 2016 .
Detalhar essa cruzada é uma das tarefas  jornalísticas mais importantes do momento.
A ela se debruça Carta Maior na matéria  ‘Lei para Todos’, desta edição.
Estão radiografados ali  elos explícitos  e dissimulados.
É impressionante como os elementos se interligam e convergem, muitas vezes para um mesmo espaço: os paraísos fiscais:    FHC, Brasif, negócios e propriedades dos Marinhos, BNDES, lobistas, empresas de fachada, mansões, helicópteros e personagens referenciais da extrema direita brasileira, como Jorge Bornhausen.
O colunismo da indignação seletiva não fará esse garimpo do qual é a parte mais comprometida cascalho.
O ressentimento autoexplicativo de Eliane Cantanhede (‘ que sempre soube dessa história’, fuzilou Mirian Dutra) mostra como o jornalismo ‘isento’ sentiu o golpe de uma peça lateral do acervo, que mobilizou a parte graúda do tabuleiro para ser deslocada há 23 anos, e agora volta ao jogo revirando  a mesa.
Ao falar é como se Miriam gritasse: 'O Rei está nu'.
Não só ele, porém; toda a corte ao seu redor e, sobretudo, o seu projeto de volta ao poder.
Daí o alvoroço dos mensageiros do trono.
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Rodolfo

Foto: DP
Lamento a morte, ontem, do artista plástico pernambucano Rodolfo Mesquita. Permanece viva sua singular e arrojada obra. 

Quase milagre

A ligeira melhora – de 8,8 a 11,4% - na avaliação do governo Dilma, na última pesquisa CNT/MDA, chega a ser uma proeza, tamanha a carga diária de combate em todas as mídias. 

Reincidentes

Circula que a banda do PMDB liderada por Eduardo Cunha estaria estudando novo pedido de impeachment da presidenta Dilma, com base nas denúncias contra o publicitário João Santana. Articulações com o PSDB e aliados estariam em andamento. Golpismo explícito.

Debater e resistir

Nossa sina, nosso rumo

Luciano Siqueira, no portal Vermelho

Não está fácil, amigos: as vinte e quatro horas do dia, por todas as mídias, a ofensiva da direita é total. Feito operação militar de cerco e aniquilamento.
O mote inarredável é: o Brasil vai inevitavelmente para o buraco, a culpa é da presidenta Dilma, as finanças públicas estão falidas porque o PT roubou as estatais e até o galinheiro do vizinho!
Tem comentarista de rádio que começa assim: “Este é mais um caso de deterioração de nossa economia, vou explicar... Mas é preciso dizer logo: a culpa é do governo” e por aí vai.
A crise global, para estes, é como se não existisse. Toda a desgraça se passa tão somente aqui.
Os jornais trazem em si um defeito congênito: abandonaram a notícia e se assumiram propandista das oposições e do mau humor.
Ora, que tomem partido e façam a campanha oposicionista que optaram por fazer. É lamentável mas até compreensível, desde que o fizessem com um mínimo de honestidade intelectual e respeito pelo leitor, telespectador, ouvinte, internauta.
O consolo é que, dialeticamente, não se afirma consistentemente uma opinião sem confrontá-la com o seu oposto. Essa cantilena parcial e monocórdica tem alcance limitado na formação da consciência social.
Basta lembrar que o consórcio tucano-midiático perdeu quatro eleições presidenciais seguidas, a despeito do grandioso e sofisticado aparato mobilizado.
Impõe-se o desafio da luta no terreno das ideias.
Ao militante do PCdoB, então, essa luta implica pauta ampla, complexa e ao mesmo tempo passiva de ser abordada de modo compreensível.
Vai desde a peleja pelo socialismo com feição teórica e política atualizada ao exame dos fatos cotidianos, passando pela defesa da democracia e do mandato da presidenta Dilma, sem entretanto abrir mão de nossa opinião crítica.
Defender e desenvolver a teoria marxista é uma exigência da época atual - proclamou João Amazonas em artigo na revista Princípios número 20, em plena débâcle da ex-União Soviética.
O militante há de viver pedagogicamente, a partir da experiência concreta do dia a dia, junto ao povo, a aventura de conectar fatos locais com o que ocorre em âmbito nacional, identificando nexos e revelando o sentido geral dos acontecimentos – ensinava Lênin.
Enfim, amigos, a luta no terreno das ideias é hoje indispensável e decisiva, ao lado da luta social propriamente dita e da ação nas diversas instâncias que convencionamos chamar “institucionais”.
Escrever é preciso. Debater é preciso. Esclarecer é preciso. Mobilizar é preciso.
Resistir agora, juntar forças e passar à ofensiva adiante. É a nossa sina e o nosso rumo.
Nas redes, nos salões e nas ruas.
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24 fevereiro 2016

Defender a Petrobras

Uma luta urgente e necessária

O plenário do Senado aprovou na noite de ontem (23) a manutenção do regime de urgência do PLS 131/2015, de autoria do senador José Serra (PSDB/SP). O PLS prevê, dentre outras coisas, a retirada da garantia da Petrobras atuar como operadora única da exploração do petróleo nos contratos futuros do pré-sal. Não há dúvida que a aprovação deste projeto não traz nenhum benefício para a Petrobras e para o Brasil.
Por André Tokarski*
 “A Petrobras, desde a sua criação, foi mais que uma empresa pública. Surgiu como um emblema da nacionalidade, a sigla mística que podia abranger e reunir o maior número possível de brasileiros fiéis à sua pátria. Petrobras era um símbolo que, por si só, despertava emoções, como se a sua missão fosse a de acender estrelas, para iluminar o céu do futuro do Brasil”. (Barbosa Lima Sobrinho)
A pretexto de defender os interesses da empresa, os que buscam retirar a Petrobras da exploração do petróleo no pré-sal querem é enfraquecê-la. As imensas jazidas de petróleo localizadas na região do pré-sal são a garantia de que a Petrobras terá reservas de comprovada produtividade para explorar pelo próximos 20 anos. Uma empresa produtora de petróleo vive de produzir petróleo e de buscar repor suas reservas. Por que então retirar essa garantia da Petrobras?
Não há nenhuma vantagem tática, muito menos estratégica, na aprovação deste projeto. O PLS 131/2015 é parte de um pacote de medidas que visam implementar a chamada “Agenda Brasil”. Nesse pacote incluem-se a autonomia do Banco Central, o PLS 555/2015, que prevê a venda de parte de todas as estatais ao mercado de capitais, o PL 4330/2004, da terceirização e precarização do trabalho, entre outros. Aprovar o PLS 131/2015 é dar força para setores da oposição de direita avançarem em sua agenda neoliberal, além de fragilizar e dividir a base de apoio ao governo Dilma no Senado. Dilma se comprometeu publicamente em preservar as regras do regime de partilha, foi um dos principais compromissos de sua campanha de reeleição.
É inoportuna também a proposta de flexibilizar a participação da Petrobras no pré-sal, deixando a cargo do Conselho Nacional de Política Energética definir quais blocos a estatal seria operadora ou não. Por mais bem intencionada que seja tal medida, ao deixar a decisão ao governo de ocasião, abre um perigoso flanco no caso de uma vitória da direita nas eleições presidenciais de 2018. Os interesses da Petrobras e do país estariam igualmente prejudicados.
Poderia se argumentar que tal medida visa acelerar a exploração de petróleo no pré-sal, ao desobrigar a Petrobras de atuar enquanto operadora única. Ocorre que em nenhum lugar do mundo está se planejando aumentar a produção de petróleo neste momento. Pelo contrário, Rússia e Arábia Saudita, dois grandes produtores mundiais, debatem o congelamento da produção e até a redução da oferta, como meio de recuperar o preço do petróleo no mercado internacional.
A aprovação do PLS 131/2015, portanto, não se relaciona com a necessária agenda da recuperação da economia brasileira. Num momento de baixa de preços no mercado internacional os planos de expansão da produção estão praticamente paralisados. O principal objetivo das grandes petroleiras no curto prazo é assegurar novas reservas, para voltar a aumentar a produção quando os preços do petróleo retomarem uma trajetória ascendente. Portanto é falso o argumento de que retirar a Petrobras da operação do pré-sal pode reaquecer a indústria de petróleo e gás no Brasil e ajudar na retomada do crescimento.
Outro dado flagrante do excesso de oferta de petróleo no mundo, e que atinge o Brasil, foi a baixa procura pelos blocos exploratórios ofertados na 13ª Rodada de licitações da ANP, realizada em outubro de 2015. Apenas 14% das ofertas foram arrematados.
A pauta prioritária e emergencial para retomar a indústria de petróleo e gás e a indústria naval, e preservar os milhares de empregos que estas geram, é aprovar a MP da Leniência e impedir a falência das grandes construtoras envolvidas nos escândalos da Petrobras, sem prejuízo da punição individual aos agentes que praticaram atos ilícitos.
A Petrobras foi envolvida no epicentro da grave crise política que o país atravessa. É vítima dos desvios cometidos há quase duas décadas por alguns de seus ex-dirigentes e por empresários. Deve ser ressarcida e não punida. A jogada no Senado aproveita a fragilidade passageira da empresa para justificar um atentado aos seus interesses e aos de seus verdadeiros acionistas, o povo brasileiro.
Como defende o Programa Socialista do PCdoB, “o Brasil vive uma encruzilhada histórica: ou toma o caminho do avanço civilizacional, ou se submete ao jugo das grandes potências e à decadência socioeconômica.” A defesa da Petrobras e do pré-sal é uma batalha incontornável para o caminho de um Brasil soberano e desenvolvido.

*André Tokarski é secretário de Juventude e de Movimentos Sociais do PCdoB
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Encarando as dificuldades

Palavra altiva em tempo de crise

Luciano Siqueira, no Blog de Jamildo/portal ne10

Dias atrás, em artigo no jornal O Globo, Paulo Nogueira Batista Jr., vice-presidente do Novo Banco de Investimento, advertiu sobre o pessimismo exagerado predominante na cena brasileira, em face da crise atual.
Segundo ele, “o país, que há poucos anos era um sucesso internacional, parece ter perdido a autoconfiança definitivamente. Esquece seus pontos fortes e proclama aos quatro ventos seus pontos fracos. E, pior, demonstra satisfação masoquista em proclamá-los. Em outras palavras, o complexo de vira-lata voltou com força total. Era de se esperar. Um complexo assim secular não se supera num passe de mágica, em poucos anos de sucesso.”
Ora a crise é global, pior do que a grande débâcle de 1929, entra em sua quarta fase, atinge duramente os países emergentes, inclusive o Brasil. Exige análise multilateral e, sobretudo, atitude combativa.
Ontem, no Recife, na solenidade de posse do novo presidente da seção regional do Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva), tivemos uma mostra dessa atitude aguerrida tão necessária.
O presidente empossado, empresário Pedro Pereira, em seu discurso – uma peça consistente e de elegante estilo – após registrar a gravidade da situação econômica atual, que atinge inclusive o setor (38.601 postos de trabalho extintos em todo o país em 2015), sugeriu a seus pares “não vestir a roupa da crise”.
Para Pedro, “deixar–se levar pelo redemoinho que a crise causa é se entregar às suas consequências, permitindo que destrua os nossos ativos pessoais,familiares,profissionais, empresariais e sociais.”
“Vamos aproveitar a crise como uma grande oportunidade para criar soluções inovadoras, deixar morrer o velho e suas mazelas para que o novo surja pujante em outro patamar de evolução dos preceitos econômicos, ambientais, sociais, empresariais, profissionais e pessoais.”, disse ele.
E a palavra do presidente do Sinaenco não é apenas retórica.
Ele anunciou ontem a instituição do Concurso “Projeto de Intervenções Urbanas Não Solicitadas”, destinado a “lançar um olhar para a cidade do Recife e propor projetos de intervenções urbanas com foco em dois cenários: na estruturação de espaços urbanos para práticas esportivas, de lazer e de educação, visando a transformação social da comunidade do seu entorno; e na melhoria da mobilidade urbana e transformação de Recife numa cidade mais saudável.”
Serão premiados os três melhores projetos, segundo avaliação criteriosa, em parceria com o CREA e o CAU.
Um belo exemplo de atitude proativa.
Um sinal de compromisso com o desenvolvimento de uma cidade mais humana -  economicamente progressista, fisicamente organizada e socialmente justa.
De fato, ao invés de “vestir a roupa da crise”, cabe a cada um contribuir para superá-la, contornando a instabilidade política e unindo forças pela retomada do crescimento econômico a partir da correta exploração de nossas imensas potencialidades.
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Sem caos

A situação da economia brasileira é difícil, mas está longe do caos. Esta foi a conclusão dos economistas Luiz Carlos Bresser-Pereira, Leda Paulani e Guilherme Mello, que participaram, segunda-feira (23), do Ciclo de Debates Que Brasil é Este?. Cada um deles, contudo, apresentou seu próprio diagnóstico para a crise atual e propôs distintos caminhos para enfrenta-la. Leia aqui http://twixar.me/czP

23 fevereiro 2016

Semeando o fascismo

Como a mídia cria os fanáticos da Lava Jato

Doutor Sérgio Moro. É assim que muitos incautos pelas ruas se referem ao juiz que comanda a ação persecutória que recebeu o nome de “Operação Lava Jato”.
Por Osvaldo Bertolino*, no portal Vermelho
Há um culto ao doutor no Brasil, especialmente nas camadas médias, envolvidas por lances patéticos da mídia para divertir o público, como se neles não estivesse hipotecado nosso futuro como nação. Cria-se, desse modo, legiões de incautos, cegos e fanatizados, sem a menor noção do que há por baixo de um tapete cuidadosamente vigiado pelos setores dominantes da sociedade.
Essa fanatização tem a finalidade de conter o crescente questionamento ao poder inflado dos setores ideologicamente dominantes, tendência que vem da Abolição, da Independência, da proclamação da República e da Revolução de 1930. O ciclo de governos Lula-Dilma deu mais um impulso nessa
tendência ao engajar milhões de brasileiros que se multiplicavam à margem da sociedade organizada, sem cidadania e sem poder aquisitivo, ao universo político e econômico do país.
Povo empreendedor e criativo - Culturalmente, por mais que certos historiadores e antropólogos digam — corretamente, registre-se — que nossas antigas raízes coloniais e escravistas continuam crescendo, já mudamos muito. Somos hoje um povo empreendedor e criativo na vida cotidiana; um povo informal, iconoclasta, sempre propenso a diluir hierarquias rígidas de status ou de função. Mas os “doutores” não estão dispostos a entregar a rapadura.
Um caso recente, que ganhou certa repercussão na mídia, explica porque figuras obscuras, como Sérgio Moro, de uma hora para outra são alçadas à condição de autoridade suprema, com direito a pisotear as leis e garrotear o Estado Democrático de Direito.
Trata-se do juiz Antônio Merreiros, de São Gonçalo (RJ), que entrou na Justiça exigindo ser tratado por “senhor”, ou “doutor”, pelos porteiros do prédio onde mora e ganhou a causa. Se um porteiro tiver a pachorra de chamá-lo de “você”, terá de pagar multa de 100 salários mínimos. Merreiros (doutor Merreiros, desculpem) teria dito: “Doutor é uma palavra que significa pessoa formada e é assim que quero ser chamado.”
Origem no passado escravagista do país - Antes de prosseguir, é preciso esclarecer, embora sucintamente, o conceito de “doutor”. Segundo o doutor Cláudio Moreno, do site “Sua Língua”, só pode ser chamado assim aquele que cumpriu as etapas constantes no curso de doutorado, incluindo a defesa de uma tese original diante de uma banca composta por cinco outros doutores. Fora do mundo acadêmico, ainda segundo o doutor Cláudio Moreno, são também chamados de “doutores” os médicos e os advogados.
De acordo com ele, isso deve ser resquício do ensino colonial, quando os jovens brasileiros abonados iam à Europa estudar medicina e direito. Hoje em dia, em um ambiente em que historicamente pouca coisa acontece sem a marca da discriminação social “doutor” também é qualquer um com algum estudo ou cuja aparência sugira que pertence às classes dominantes. É o “doutor” usado por guardadores de carro, porteiros, vendedores dos semáforos.
Muitos desses “doutores” — os acadêmicos e os informais — agem como se o simples fato de ostentar símbolos de poder desobrigasse alguém de prestar contas, a si mesmo ou à sociedade, dos passos que executa. O doutor Sérgio Moro é um exemplo típico. Ele se enquadra naquela categoria de gente que se beneficia da fragmentação social — que tem origem no passado escravagista do país — para impor seu autoritarismo. Moro é daqueles que veem a grande massa de brasileiros pobres como seres primevos, por serem negros, índios, mestiços.
Escravidão até as barbas do século 20 - Para eles, os brasileiros pobres devem ser despossuídos a ponto de não ter direito sobre seu próprio corpo e cuja vida deve ser definida pelo trabalho cruciante e pelos suplícios impostos pelos patrões. A submissão funciona como sucedâneo da lei — uma anomalia no Estado Democrático de Direito. Em um país que manteve a escravidão até as barbas do século 20 — caso único no mundo — é, de certa forma, natural que esta ideologia esteja impregnada na carne dessa elite.
E por isso há entre os dois extremos sociais brasileiros uma desconfiança recíproca, uma indisposição a selar contratos sociais, uma oposição natural a qualquer tentativa de organização conjunta, nacional. A tradição brasileira é de rompimento violento desses tratados sempre que a direita se acha no direito de proteger suas benesses, suas maracutaias. Vem daí o inconsciente coletivo do país de que a política e a Justiça obedecem sempre a interesses minoritários e poderosos, de que Estado é sinônimo de opressão, de que pactos democráticos nunca favorecem o cidadão comum.
Em dois ou três séculos, pouco mudou na essência do modo como a elite e o povo se veem e se relacionam. Uns continuam abusando do seu poder inchado, sabotando a trama social existente no país e nutrindo ódios de classe. Outros continuam lutando com todas as forças pela sobrevivência. O pobre sentindo muita revolta por se perceber confinado na base da pirâmide social e o rico achando que a solução mais eficaz para erradicar a pobreza é o extermínio dos pobres.
Nunca se denunciou tanto - O mais revoltante, no entanto, é que brasileiro rico não teme a lei: ou ele salta a barreira ou passa por baixo, mas poucos se detêm na fronteira do direito. Tomemos como exemplo o resultado do noticiário da mídia, que certamente leva os incautos — os fanáticos da “Lava Jato” — a imaginar que logo o Brasil será um dos países mais honestos do mundo. Isso ocorre porque as redações publicam livremente as mais duras denúncias em relação a quaisquer denúncias.
Tomemos ainda a quantidade comissões de inquérito no Congresso Nacional, com poderes equivalentes e recursos superiores aos da Justiça para convocar pessoas e requisitar informações, se sucedem na investigação de tudo que se possa imaginar. E o Ministério Público, que dia sim, dia não, acusa alguém de alguma coisa. E ainda a Polícia Federal, que está sempre tocando operações com algum nome de meter medo: Anaconda, Albatroz, Lince, Vampiro, Farol da Colina, Satiagraha e assim por diante.
Levemos em conta, por fim, que vimemos em um mundo no qual parlamentares, promotores ou delegados de polícia têm facilidades inéditas para quebrar o sigilo legal que protege as contas bancárias, os telefonemas ou as declarações de imposto de renda das pessoas. Nunca se denunciou tanto, e nunca tantos foram denunciados. Conclusão: quem é que teria peito, num país como este, de fazer alguma coisa errada? A resposta é: cada vez mais gente. A prova disso está, precisamente, na própria quantidade de denúncias que a cada dia surgem no noticiário. O problema é que há denúncias e denúncias.
Dinheiro, relacionamentos e esperteza - Quando se mistura tudo no mesmo balaio de gatos, o resultado desse ambiente de inquisição geral, irrestrita e permanente, é que o delinquente envolvido de fato em delitos contra o erário ou a função pública tem aparição fugaz na primeira página dos
jornais ou no noticiário da TV e do rádio — em contraste com a superexposição dos presos seletivos com base em acusações de fontes de quinta categoria surgidas em farsas como o “mensalão” e a “Operação Lava Jato”.
A seletividade dos chefes das investigações mais o filtro da mídia separam o joio do trigo. E aí joga-se o trigo na cadeia e libera-se o joio; com estômago firme, bons advogados e a ajuda da mídia o acusado com indícios de provas robustas acaba saindo vivo da confusão. Com o passar do tempo, seu caso vai sendo esquecido e a partir daí tudo se resume a aproveitar as vantagens incomparáveis que o sistema judicial brasileiro oferece aos acusados que dispõem de dinheiro, relacionamentos e esperteza. Possivelmente não existe no mundo civilizado um sistema judicial tão bem preparado para não fornecer justiça como o do Brasil.
A parceria de inquéritos malfeitos, promotores e delegados cujo desempenho é julgado pelo número de acusações que fazem e por suas aparições na mídia, e não pelas condenações baseadas na lei que conseguem, e tribunais que a própria legislação tornou paraplégicos só pode mesmo resultar nisso. Resumo da ópera: o caso já não é de esperar que a aplicação da justiça seja mais rápida; é pedir, simplesmente, que se torne possível. Que se repeite o Estado Democrático de Direito.
*Osvaldo Bertolino é jornalista, editor do Portal Grabois e colaborador da revista Princípios. Publicado no Blog O Outro Lado da Notícia.
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