Não deixar o adversário
jogar se tornou obsessão
Tostão, na
Folha de S. Paulo
Se o Cruzeiro for
eliminado da Copa do Brasil,
nas semifinais contra o Inter, entrará em crise, dentro e fora de campo.
Provavelmente, haverá mudanças de elenco, de técnico e de mais dirigentes, que
já deveriam ter saído.
A equipe está muito burocrática, previsível. A esperança é o
sistema defensivo não levar gols, como nos dois jogos contra o River Plate, pela Libertadores.
A estratégia do Cruzeiro e de vários outros times brasileiros e
também de alguns da Europa, de amarrar, empobrecer o jogo, de não deixar o
adversário jogar e de ganhar nos pequenos detalhes, no limite, deu certo em
muitos momentos, tornou-se uma obsessão, um desejo, um prazer maquiavélico,
masoquista, como se fosse ainda melhor vencer sem brilhar. Isso está se
esgotando. Aos poucos, aumenta, em todo o mundo, a busca por vencer e por jogar
bem.
Individualmente, falta ao Cruzeiro, principalmente, um
meio-campista de talento, que jogue de uma intermediária à outra, que marque,
construa e avance. Os dois volantes, Henrique e Ariel Cabral (ou Romero, que voltou
para a Argentina), desarmam e tocam para o lado. Parecem zagueiros no
meio-campo. Falta um Edenílson, do Inter, um Bruno Guimarães, do Atlhetico.
Algumas equipes brasileiras, como Santos, Inter e Fluminense, seguem o modelo
das principais equipes europeias, de jogar apenas com um volante centralizado e
com um meio-campista de cada lado, como Edenílson, no Inter,
Sanchez, no Santos, e Ganso, no Fluminense. No Liverpool, os
três do meio-campo defendem e atacam. O mesmo ocorre no Santos. Pituca, ótimo
volante, o mais recuado, aparece também na frente.
No Grêmio, não existe primeiro e segundo volante. Os dois,
Maicon e Matheus Henrique, marcam como volantes e avançam como meias.
Ganso, quando jogava no Santos e no São Paulo, era um meia ofensivo. Quando
não brilhava, era tratado como lento, preguiçoso, e como um meia que não
entrava na área. No Fluminense, é um meio-campista, de uma intermediária à
outra.
Apesar de Ganso estar jogando bem, raramente, é elogiado. No
Brasil, ainda predomina o conceito arcaico do meio-campo dividido entre os
volantes que marcam e que jogam do meio para trás e os meias que atacam e que
jogam do meio para frente. O meio-campista não existe.
Como Ganso não é um clássico volante nem um clássico meia, passa
despercebido. Outro dia, um jornalista esportivo disse que Jair, do Atlético,
jogava no meio-campo e que, agora, passou a ser a volante, como se volante não
fosse jogador de meio-campo.
Além disso, como todos nós nos decepcionamos com Ganso, que não
se tornou o craque mundial que imaginávamos, temos receio de elogiá-lo, para
não ficarmos novamente frustrados. Ele não é o craque que pensávamos, mas não é
um jogador qualquer.
Repito, pela milésima vez, que, se Ganso tivesse sido formado na
Europa, especialmente no Barcelona, se tornaria um excepcional meio-campista.
Quem sabe um Xavi, um Iniesta, um De Bruyne, um Pogba?
Em compensação, se Pelé tivesse
nascido na Europa, jogaria em um time que priorizasse o chutão, para ele correr
atrás da bola, como era habitual. Agora, não é mais. Isso ainda prevalece em
algumas equipes brasileiras. Pelé não teria também, na Europa, os excepcionais
companheiros que teve no Santos nem a brisa gostosa do mar da Baixada.
Do encontro do acaso com a oportunidade, nascem o desejo e
o talento.
[Ilustração: LS]
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