Editorial do Vermelho:
A luta contra a inflação compromete o crescimento econômico?
Desenvolvimento com melhoria do emprego e da renda dos trabalhadores provoca inflação? Este é aparentemente o tema do debate visto nos últimos meses e o pretexto das pressões para o governo aumentar juros, conter gastos públicos e desaquecer o consumo.
O debate, entretanto, precisa ir além das aparências, e também dos dogmas conservadores que relacionam diretamente crescimento econômico e inflação.
Para os conservadores, o país vive uma “inflação de demanda” – aquela que resultaria do aumento de consumo popular e, portanto, da procura dos produtos, provocando o aumento dos preços.
Mas há outros argumentos para explicar o crescimento dos preços. Um deles é o aumento dos preços das commodities (matérias primas) negociadas no mercado mundial, como açúcar e petróleo. Seus aumentos de quase 10% no ano passado se traduziram, no mercado interno, em preços mais altos principalmente para os alimentos e combustíveis.
E há também as pressões inflacionárias provocadas tanto pela decisão do governo dos EUA de inundar o mercado mundial com dólares, para forçar a valorização de moedas estrangeiras (entre elas o real) e facilitar assim as exportações americanas, quanto também pelo volume de moeda americana posto em circulação em consequência do aumento de preços das commodities.
Tudo é motivo para as pressões conservadoras sobre o governo. Mas seus argumentos não se baseiam – como parece – numa teoria econômica supostamente neutra, mas em interesses concretos. E o espantalho da inflação é usado não contra os preços, mas para garantir e reforçar os aumentos nos juros, mesmo que causem desemprego, desvalorização da renda dos trabalhadores e diminuição do consumo da população. O importante para os conservadores é assegurar a escandalosa fatia que a especulação financeira abocanha, improdutivamente, da riqueza nacional.
As pressões do chamado “mercado” (isto é, os agentes financeiros que operam a espoliação baseada nos juros) são fortalecidas por outros interlocutores interessados. Nesta semana, os dirigentes dos 21 maiores Bancos Centrais do planeta, reunidos em Basiléia, na Suíça, cobraram a “colaboração” dos países “emergentes” (entre eles Brasil, Índia e China) para conter o crescimento da inflação mundial que aumenta as dificuldades que eles próprios, países ricos, enfrentam. E receitam a mesma desacreditada medicação neoliberal e monetarista que provocou desastres econômicos e sociais nos países pobres: fim de políticas desenvolvimentistas, aumento dos juros e corte nos gastos públicos.
Isto é, os conservadores de dentro e de fora do Brasil cantam pela mesma cartilha ultrapassada: abandonar o caminho da retomada econômica a pretexto de uma “saúde econômica” necessária para salvar os ricos e os especuladores.
O debate é mesmo complexo; os caminhos da economia não são simples e a retomada dos aumentos nos preços tem sido uma realidade neste começo de ano. Mas seu entendimento precisa levar em conta, em primeiro lugar, o fato elementar de que o confronto envolve mais interesses de classe e menos ciência econômica: a economia não é uma ciência exata; é política. E é a correlação de forças na sociedade que determina a maior ou menor participação de cada classe na divisão das riquezas produzidas.
E é justamente esta realidade palmar que o debate sobre a inflação tenta ocultar. E, nele, a presidente Dilma Rousseff revela seu lado quando diz preferir enfrentar antes “os problemas do crescimento do que os do desemprego, da falta de renda e da recessão econômica", mostrando-se imune às pressões conservadoras antidesenvolvimentistas – apesar de haver no governo quem pareça convertido à opinião de que aumento de salário provoca inflação e peça, assim, que os trabalhadores tenham “maturidade” em suas reivindicações.
Os desajustes da produção, que podem provocar alta de preços se a oferta for menor que a procura ou pelos desajustes provocados por oscilações cambiais com impacto no valor da moeda nacional, são problemas concretos que o governo precisa enfrentar com decisão.
O que está em questão são as maneiras diferentes de enfrentá-los e os interesses de classe que envolvem. O governo tem sinalizado a disposição de combater a inflação sem comprometer o crescimento econômico. É uma opção correta, apesar de todo interessado alarme do “mercado” contra o despertar do dragão que corrói o valor da moeda. Mesmo porque a inflação (que, pelo IBGE, foi de 6,51% nos últimos doze meses, superando o número mágico do mercado, 6,5%) dá sinais de queda e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, assegure que ela vai terminar o ano dentro da meta e sob controle. E sem que a luta contra ela prejudique o crescimento econômico projetado para este ano para 4,5%.
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