Hegemonia, hegemonismo
Luciano Siqueira
A hegemonia é condição sine qua non da direção – na luta política, sobretudo. Palmas para a corrente, grupo ou partido que a alcança. Sinal de competência, reflexo da capacidade de se sobrepor em ambiente complexo, pleno de contradições e entrechoques. Produto da clareza de propósitos e da habilidade tática.
À semelhança da conquista do poder, mantê-la todavia em certo sentido é mais difícil do que conquistá-la. Porque o exercício da hegemonia requer descortino largo, para além do imediato, perspectiva estratégica. E uma boa dose de paciência, proporcional à dimensão do processo em curso.
O bom exercício da hegemonia requer amplitude e flexibilidade. Afinal, a hegemonia se faz em relação a um conjunto em geral heterogêneo, comportando interesses díspares e via de regra legítimos.
No polo oposto, exercer a hegemonia mirando o próprio umbigo é a negação da conquista, o atalho mais fácil para perdê-la adiante. A exacerbação dos próprios interesses, esmagando as forças aliadas sobre as quais a força hegemônica se sobrepõe resvala para o hegemonismo.
O hegemonismo é a antessala do autoisolomento.
Parece uma tese, mas não é. Apenas um comentário modesto, fruto da observação empírica de quase três décadas de envolvimento com a chamada grande política e a propósito desse instante em que, no plano federal e nos estados, está em andamento a montagem dos novos governos.
Frentes partidárias amplas lograram o êxito eleitoral. Agora se preparam para governar, presumivelmente de modo compartilhado. Todos os partidos desejam tomar parte na administração, consideram que têm uma contribuição a dar. E, óbvio, prestigiados, supõem que se fortalecerão perante suas bases. Mas a porca pode entortar o rabo se os entendimentos forem contaminados pelo vírus hegemonista. Aí uma assimetria exagerada, em favor do partido hegemônico, só trará dificuldades, inclusive à governabilidade. E, em médio prazo, por mais que sacie o apetite por cargos e posições, a corrente preponderante se enfraquecerá. Autista, verá trincar-se a coligação construída para a disputa eleitoral.
Ascensão e queda, nesses casos, parecem compor uma curvainescapável. Com todas as consequências que possam advir, até mesmo encurtar a vigência do ciclo transformador em curso.
Daí, equilíbrio e uma dose de bom senso só fariam bem aos que têm as rédeas da montagem dos governos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário