Bolsonaro
mente no JN e coloca condição para aceitar resultado das eleições
Presidente deu relato falso
sobre atuação na pandemia e disse que nunca xingou ministro, mas já chamou
Moraes de 'canalha'
Matheus Teixeira, Renato Machado e Ricardo Della Coletta, Folha de S. Paulo
O presidente Jair Bolsonaro (PL) colocou condições para aceitar os resultados das eleições e mentiu, durante sabatina no Jornal Nacional, ao tratar de ações na pandemia da Covid-19 e ao negar que tenha xingado ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).
Ele
foi o primeiro candidato ao Planalto a participar da série de entrevistas com
presidenciáveis no programa da TV Globo. Durante a sabatina, houve panelaços em diversas
capitais do país.
No
ano passado, Bolsonaro chamou o ministro Alexandre de Moraes de
"canalha". Além disso, diante de apoiadores, já chamou o ministro Luís
Roberto Barroso de "filho da puta".
Após
ter dito no JN que nunca xingou algum magistrado do Supremo, o apresentador do
programa, William Bonner, recordou do episódio em que chamou Moraes de
"canalha".
Bolsonaro,
então, admitiu que atacou o magistrado, mas disse que o entrevero teria sido
apenas com ele —e omitiu o xingamento a Barroso.
No
Jornal Nacional, Bolsonaro também mentiu sobre as ações do governo na pandemia,
ao negar ter barrado a compra de vacinas.
O
mandatário começou a entrevista mais calmo, dando respostas em um tom sereno.
No decorrer do programa, porém, ficou mais irritado, principalmente após ser
questionado se tinha algum arrependimento por ter imitado pessoas sem ar ao
comentar os problemas da Covid-19.
Ele,
porém, disse que foi solidário às vítimas da pandemia. "A solidariedade eu
manifestei conversando com o povo nas ruas, visitando as periferias de
Brasília, vendo pessoas humildes que foram obrigadas a ficar em casa sem ter um
só apoio de governador ou prefeito", disse.
Bolsonaro
também voltou a levantar dúvidas sobre a segurança das urnas eletrônicas,
citando informações que já foram rebatidas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e pela própria PF.
O
delegado Victor Neves Feitosa Campos, responsável pelo inquérito sobre o ataque
hacker ao sistema do TSE que o presidente costuma citar, disse em
depoimento à corporação que não encontrou indícios de que a ação pudesse ter
resultado em manipulação de votos, fraude ou problemas na integridade das
urnas.
O
presidente foi cobrado pelos apresentados a assumir um compromisso de que
respeitará o resultado das eleições. No entanto, novamente colocou uma
condicionante de que faria isso se considerar que as eleições foram "limpas"
—o que ele nega ocorrer, já que segue colocando em dúvida o sistema eleitoral
do país.
"Serão
respeitados os resultados das urnas desde que as eleições sejam limpas",
afirmou o presidente.
Em
outro momento, Bolsonaro foi questionado sobre as ações antidemocráticas de
seus apoiadores, como a recorrente defesa da ditadura militar em manifestações
em seu favor.
Respondeu
que se trata de "liberdade de expressão". "Quando alguns falam
em fechar o Congresso, é liberdade de expressão deles. Eu não levo para esse
lado."
Bolsonaro
tem feito neste ano seguidos ataques ao sistema eleitoral e aos ministros do
STF para acusar uma suposta fraude caso não vença as eleições.
O
sistema eletrônico de votação, porém, foi exaltado e ovacionado diante de
Bolsonaro na posse do ministro
Alexandre de Moraes como presidente do TSE, na semana passada.
A
retórica golpista do presidente inclui ainda o flerte com as Forças Armadas,
que participam de uma comissão de transparência eleitoral e, na prática, têm
sido uma das linhas de frente do questionamento do presidente às urnas.
O ataque mais grave às urnas ocorreu em 18 de julho, quando
ele chamou embaixadores estrangeiros para expor suas mentiras acerca das urnas
e do processo eleitoral, repetindo argumentos já descartados após sua exposição
em uma live no ano passado.
A
reação veio no último dia 11, com um ato que reuniu milhares de pessoas para a
leitura de duas cartas de apoio à
democracia na Faculdade de Direito da USP. A primeira carta foi
endossada por entidades como a Fiesp e centrais sindicais. Já a segunda,
inspirada na Carta aos Brasileiros de 1977, ultrapassou 1 milhão de
assinaturas.
No
JN, Bolsonaro afirmou que não retardou a compra de vacinas e repetiu as
alegações de que a Pfizer pretendia impor condições impraticáveis para fornecer
os imunizantes. A CPI da Covid, no entanto, apontou que as propostas da
farmacêutica americana ficaram meses sem resposta.
O
presidente também se negou a afirmar que a aliança com o centrão foi
contraditória em relação à campanha de 2018, quando costumava criticar
duramente o grupo político composto por partidos de centro.
Bolsonaro
aproveitou a oportunidade para elogiar seus ministros, mas deixou de fora da
lista expoentes desse bloco que estão na Esplanada, como o chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e
o chefe das Comunicações, Fábio Faria.
Ao
ser questionado sobre desmatamentos, o presidente respondeu que há 30 milhões
de brasileiros vivendo na região e que isso deve ser foco de preocupação do
governo. Na sequência, Bolsonaro ainda criticou o Ibama por destruir o
maquinário das pessoas que devastam as florestas.
"A
destruição [dos equipamentos], como está em lei, é se você não puder tirar o
equipamento daquele local. O que vinha acontecendo e ainda vem, infelizmente, é
que o material pode ser retirado do local, porque se chegou lá pode ser
retirado e há o abuso de uma parte...", afirmou o presidente, sendo questionado
de quem partiria o abuso. "Por parte do Ibama", acrescentou.
Bolsonaro
também repetiu a estratégia usada em debates de 2018 e foi à entrevista com
anotações na mão, com as seguintes palavras: Nicarágua, Argentina, Colômbia,
Dario Messer.
As críticas do mandatário aos três países, que são comandados por governantes
de esquerda, são recorrentes.
Em relação a Messer, que ele não mencionou na entrevista, a anotação ocorreu
porque o doleiro já disse, em delação premiada, que realizou repasses de
dólares em espécie à família Marinho, dona do Grupo Globo.
Em nota emitida na época, os proprietários da emissora negaram as acusações de
Messer e ressaltaram que o doleiro não apresentou provas.
Eleição de deputados federais é
estratégica https://t.co/xB8HCLa4I1
Ao
final da entrevista ao JN, o presidente transmitiu em suas redes uma live, a
partir do carro onde estava. Nela, voltou a chamar apoiadores para os atos do 7
de Setembro. Lembrou que haverá desfile militar, pela manhã, em Brasília, e que à tarde estará no Rio
de Janeiro, com apresentações das Forças Armadas.
Nesta
semana também serão sabatinados pelo JN os candidatos Ciro Gomes (dia
23), Luiz Inácio Lula da Silva (25)
e Simone Tebet (26).
Apesar
de Bolsonaro fazer críticas recorrentes à Globo e de já ter até orientado sua
militância a não assistir a emissora, a entrevista ao Jornal Nacional foi
tratada pelo entorno do presidente como um dos momentos mais importantes da
campanha.
Bolsonaristas
prepararam uma grande mobilização nas redes sociais para aumentar a repercussão
da sabatina. A hashtag #BolsonaroNoJN foi usada em postagens nas redes sociais
por ministros do governo, por filhos do mandatário e por outros aliados.
O
senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o ministro das Comunicações, Fábio Faria
(PP), publicaram nas redes um vídeo no qual Bolsonaro olhava para o celular e
um interlocutor falava "olha a cara do presidente preocupado hoje com o
JN". Bolsonaro então respondia: "Vou dar um beijo no [William] Bonner
hoje."
A
aposta de estrategistas da campanha era que a participação do mandatário no
telejornal de maior audiência do país pudesse alavancar o presidente nas
pesquisas e ajudar a expor ações do governo federal.
A entrevista concedida em 2018, por exemplo, foi amplamente explorada por seus
apoiadores na época durante todo o período eleitoral.
Na ocasião, Bolsonaro defendeu a ditadura militar, espalhou fake news sobre livros
distribuídos às escolas e questionou o salário da apresentadora Renata
Vasconcellos.
O então candidato apresentou um exemplar do livro "Aparelho Sexual e
Cia." e disse erroneamente que a obra havia sido entregue em colégios
públicos. Na ocasião, porém, a Cia. das Letras, que editou o livro, afirmou que
a publicação nunca foi distribuída em escolas pelo MEC (Ministério da Educação).
A Fundação Biblioteca Nacional, ligada ao Ministério da Cultura, comprou, em
2011, 28 exemplares do título, que foram distribuídos em bibliotecas públicas
—não nas escolas.
O
MEC, em 2016, já havia negado que tivesse adquirido exemplares desse título.
Nas
negociações sobre a participação de Bolsonaro no JN neste ano, a campanha
chegou a exigir que a sabatina fosse
realizada no Palácio do Alvorada, argumentando que Luiz Inácio
Lula da Silva (2006) e Dilma Rousseff (2014) tiveram o mesmo tratamento quando
tentaram a reeleição.
O
presidente depois cedeu e aceitou ir aos estúdios da
emissora no Rio de Janeiro.
A
participação no programa acontece em um momento de crescimento de Bolsonaro nas
pesquisas de intenção de voto, que ocupa o segundo lugar, atrás do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Levantamento do Datafolha divulgado na
semana passada mostrou que o presidente conseguiu
diminuir para 15 pontos percentuais a diferença para o líder Lula. A
diferença entre os dois na pesquisa anterior, de 28 de julho, era de 18 pontos.
Essa
foi a primeira pesquisa Datafolha divulgada após o início do pagamento do Auxílio Brasil de
R$ 600.
Veja; Pedir o voto é um ato de cidadania https://bit.ly/3QUTNTT
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