10 setembro 2025

Abraham Sicsú opina

Comércio exterior: a versão dos fatos
Abraham B. Sicsú  

Os dados são conhecidos. A Agência Brasil publicou detalhes em 4 de setembro último. Não há grandes novidades no que vou dizer, mas faço questão de ressaltar. O que chama a atenção é como são divulgados os resultados. Ou melhor, o que eles são realmente divulgados. Refiro-me ao Tarifaço e seus impactos no Balança Comercial brasileira.

Em 9 de julho de 2025, Trump enviou uma carta ao presidente Lula informando sobre as tarifas de 50% para produtos brasileiros a partir de agosto.

Uma medida que não tinha nenhuma justificativa econômica ou comercial, com uma nítida conotação política. Uma medida que poderia afetar muito a economia brasileira e que definiria estratégia para enfrentá-la.

Um estudo da Federação das Indústrias de Minas Gerais (FIEMG) previu uma catástrofe, uma queda de mais de 26 bilhões no PIB brasileiro em dois anos e uma perda de quase 150 mil postos de trabalho, além de uma redução de cerca de 3 bilhões na renda das famílias.

Não se nega que tenha, como vem tendo, impactos relevantes na nossa economia, mas medidas tomadas a serem tomadas.

Em primeiro lugar a busca por novos parceiros comerciais é aprofundada. Depender de poucos mercados nos fragiliza. Os Estados Unidos são o segundo parceiro comercial brasileiro. Em alguns setores tem importância crucial. Na indústria manufatureira, nossa competitividade é abalada pela baixa produtividade de muitos produtos que para lá enviamos e um impacto desse tamanho nos preços quase nos inviabiliza. Também, em alguns produtos agrícolas ou agroindustriais, nosso principal mercado externo é a América do Norte, e se viram fortemente afetados.

Um segundo ponto que se tornou claro é a necessidade de aumentar nossa produtividade para competir nesses novos mercados. Estratégias de médio e longo prazo começam a ser esboçadas e aprofundadas pelas empresas para melhor se posicionarem. Seja na digitalização e automação de seus processos, seja em parcerias e joint ventures com fornecedores de tecnologia de ponta.

Um terceiro ponto, evidentemente, foi a aceleração da antecipação das entregas já contratadas para julho. Tinha-se um mês para fugir do Tarifaço. Muitos fizeram com bons resultados.

Por fim, os esforços deram resultados na articulação, com o setor empresarial estadunidense, quando da criação de uma lista de propostas, definida pelo governo americano, que não foram inseridas na tarifa de 50%, como aeronaves, suco de laranja, combustíveis, alguns tipos de metais e madeiras, e muitos outros. Quase setecentos produtos estão nessa lista e pagam uma tarifa de apenas 10%. 

Saem os primeiros resultados, do primeiro mês de vigor do imposto escorchante, agosto.

A mídia se atém quase que exclusivamente ao resultado com os Estados Unidos, mesmo assim, focando apenas um aspecto, a queda de 18,5% no volume das exportações.

Numa análise mais aprofundada, observa-se que não houve exportação de minérios de ferro, verdade. Além disso, também houve forte queda na venda de aeronaves (84,9%), que já conseguiu um acordo na lista de propostas, açúcar (88,4%), grande impacto para o Nordeste, motores e máquinas elétricas (60,9%), que afeta fortemente o Sul do país. 

Esquece-se de ressaltar que muitas dessas vendas foram antecipadas no mês anterior. Em julho tivemos um crescimento das exportações para os Estados Unidos de pouco mais de 7%.

Pouco se falou de um fato altamente positivo para a economia brasileira. Foi anunciado um superávit de mais de 6,1 bilhões de dólares no mês, com exportações de 29,9 bilhões e milhões de 23,7 bilhões. Note-se que as exportações de agosto cresceram 4% em relação ao mesmo período do ano passado, sendo que a agropecuária cresceu mais de 8% e a indústria extrativa, mais de 11%. Tipo sim uma queda pequena na indústria de transformação de menos de 1%.

Outro dado interessante do levantamento feito pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços - MDIC foi a diversificação do destino de nossas exportações. Houve um crescimento expressivo para outros países, 11% para o Reino Unido, 44% para o México, 40% para a Argentina, 31% para a China e 58% para a Índia. Vai se configurar um novo perfil de países parceiros que diminuem nossa vulnerabilidade a medidas tresloucadas que podem ser tomadas contra o multilateralismo e o comércio internacional. O bloco dos BRICS passa a ter um papel focal.

Com esses dados, ainda muito preliminares, pode-se questionar se uma catástrofe será descomunal.

Se consolidarmos novos parceiros estratégicos com alianças de médio e longo prazo, se abrirmos uma parceria tecnológica nacional e internacional que aumenta muito a nossa produtividade, se consolidarmos uma estratégia de comércio internacional como um dos mecanismos de sustentação de nosso desenvolvimento, o resultado pode ser bem diferente do que vem sendo desenhado.

O Tarifaço pode até se tornar um fator importante para alavancarmos a economia brasileira. Evidentemente que estamos passando por uma fase conjuntural delicada, mas nada que não possa ser superado e dele tirar vantagens efetivas. Parece ser o quadro que se deseja.

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Leia também: Vulnerabilidade estrutural  https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/09/pauta-de-exportacoes-em-xeque.html

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