Rio de todos os Brasis
Por Eduardo Bomfim, no Vermelho
No dizer de Carlos Lessa o Rio de Janeiro encontra-se no imaginário do brasileiro como a síntese de características e potencialidades nacionais, espaço aberto a todos que lá chegados seriam cariocas, muito mais um estado de espírito que a dependência de naturalidade.
A década de noventa caracterizada pela hegemonia absoluta e a intervenção avassaladora do neoliberalismo no Brasil feriu a face do brasileiro e também deixou a cidade maravilhosa estagnada, com perda de auto-estima.
Apesar das alterações econômicas e políticas atuais a nova ordem mundial continua determinando ideologicamente, culturalmente, as práticas neoliberais através da chamada governança global e da hegemonia midiática internacional.
Mas eis que nesta semana assisti ao incrível documentário "As batidas do Samba" uma reflexão sobre o Rio de Janeiro, o samba, as suas raízes lá do tempo da escravidão, da resistência nas senzalas e como foi desenvolvendo suas maneiras cosmopolitas.
Incorporando, em magistral sincretismo, outras tendências musicais até se transformar em uma das fundamentais manifestações do povo carioca e um verdadeiro itinerário da construção de uma cultura genuinamente popular com os seus mestres guardiões da mais autêntica identidade nacional.
Com os depoimentos de Monarco, Ismael Silva, Wilson das Neves, Marçalzinho, Moacyr Luz, histórias sobre Noel Rosa, Pixinguinha, Donga, Cartola, Bide, mestre Marçal e a beleza plástica dos ritmos, da paisagem do Rio.
Os testemunhos como o de Monarco de que "a força do povo não tem prazo de validade", uma cultura que sobreviveu a inúmeras perseguições, discriminações de toda ordem até se afirmar incontestável em linguagem e estilo de vida.
Atualmente o Rio passa por grandes transformações, "um verdadeiro canteiro de obras" gerando emprego, renda, no curso de dois mega eventos mundiais.
Mas cercada por decretos, leis, esquemas internacionais de repressão, "controle social" e tantos outros que tendem a enquadrá-la definitivamente em uma cidade da artificiosa globalização.
O preço a pagar por esse tipo de desenvolvimento será o distanciamento desse Rio enfatizado por Carlos Lessa, apartado das suas identidades e raízes populares, uma rara especiaria a ser consumida por uma elite mundial privilegiada. O que vai implicar na continuidade histórica da resistência cultural e política do povo carioca.
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