Glórias da pré-história
Um dia, as imagens de Daniel
Craig, Scarlett Johansson e outros ídolos de hoje serão figurinhas do passado
Ruy Castro/Folha de S. Paulo
Uma pequena coleção de cartões postais achados num sebo. São sete retratos em preto e branco de artistas antiquíssimos do cinema americano: Lon Chaney, Ramon Novarro, Adolphe Menjou, William Haynes, Emil Jannings, Max Linder, Maurice Chevalier. Calculo que sejam de 1930 ou por aí. Eram os ídolos de meu pai quando garoto. Quase 30 anos depois, ele me falava deles com justa empolgação, sem saber que nem todos haviam tido um futuro à altura de seu glorioso passado.
Lon Chaney
(1883-1930) era "o homem das mil faces": "O Corcunda de
Notre Dame", "O Fantasma da Ópera", "O Monstro
do Circo". O cartão o mostra na vida real, sem maquiagem, o que tornava
ainda mais incríveis suas caracterizações. Ramon Novarro (1899-1968), herói do
primeiro "Ben-Hur"
(1925) e de "O Príncipe Estudante" (1926), o maior musical do cinema
mudo (sim, existiam!), era o galã que as mães queriam como genro. E Adolphe
Menjou (1890-1963), o homem mais elegante da América em seu apogeu, teria papel
lamentável no macarthismo, como dedo-duro.
William
Haynes (1900-73), grande revelação, viu sua carreira destruída por Louis B.
Mayer, chefão da MGM, por ser gay. O alemão Emil Jannings (1882-1950), famoso
por "O Anjo Azul" (1930), com Marlene Dietrich, foi para os EUA,
ganhou um Oscar de melhor ator e voltou para a Alemanha para servir a Hitler. E
Max Linder (1883-1925), fabuloso comediante francês pré-Chaplin, não teve em
Hollywood nem sombra da carreira americana de seu patrício Maurice Chevalier
(1888-1972).
Ao ouvir meu
pai sobre eles, suas glórias me pareciam vir da pré-história. Para mim, os
deuses, na tela e nas figurinhas da Editora Vecchi, eram Marilyn Monroe,
Elizabeth Taylor, Marlon Brando, Burt Lancaster, Glenn Ford –hoje tão remotos
para você quanto Lon Chaney era para mim.
Mas não se
iluda. Um dia, Daniel Craig, Robert Downey
Jr., Scarlett
Johansson, Leonardo
DiCaprio e Brad Pitt também serão encontrados por
um cinéfilo num sebo, em arcaicos cartões postais ou figurinhas digitais.
[Ilustração: Istvánné Horváth]
[Se comentar, assine]
Leia sobre a inovação tecnológica em nosso cotidiano https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/01/minha-opiniao_45.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário