Sindicatos e governo como água e óleo
Por Luciano Siqueira
As comemorações do 1º. de Maio, ontem, tiveram o dom de fundir a bandeira central do movimento sindical com a principal consigna do governo Lula: "desenvolvimento econômico com distribuição de renda, valorização e defesa do meio ambiente." Mas isso não significa que os movimentos sociais e o governo agora são a mesma coisa, um só corpo, uma só alma.
É natural, e positivo, que haja confluência de objetivos entre ambos, no contexto de um governo de centro-esquerda cujo presidente é um ex-líder operário e sindical. No mínimo significa que o governo procura ajustar suas diretrizes fundamentais às expectativas dos que vivem do trabalho. E, dessa maneira, tenta romper com a dicotomia entre crescimento econômico e bem-estar social, típica das políticas neoliberais.
Mas é oportuno sublinhar a irrecusável necessidade de se preservar a autonomia e a independência dos movimentos sociais em relação ao governo. A História, aqui e alhures, tem ensinado que quando isso não é observado as coisas não dão certo, inclusive onde a construção da sociedade socialista mais avançou, na ex-União Soviética.
Lá, em quatro décadas, observou-se o maior progresso material e espiritual que um povo já conquistara na história da sociedade humana. Mas a partir do instante em que se fundiram, na prática, e também na teoria, Estado e partido, e organizações sindicais e populares e Estado, o sistema perdeu vigor, burocratizou-se e se tornou infenso à crítica. A energia que vem das fábricas, do campo e das ruas paulatinamente se esgarçou. E veio o retrocesso social e político, de conseqüências sabidamente nefastas.
O governo Lula, obviamente, nada tem de socialista - embora da coalizão que o sustenta façam parte partidos que lutam pelo socialismo. É um governo progressista, que procura avançar no sentido de um modelo de desenvolvimento nacional e democrático. Enfrenta dificuldades externas e internas, reflexo do conflito de idéias e interesses, tal a amplitude e a pluralidade que o conforma.
Para que avance, corrigindo equívocos e aprofundando acertos, não pode prescindir da legítima e salutar pressão de movimentos sociais, o sindical inclusive, que resguardem seu espírito de luta e sua capacidade de ação independente.
Assim, governo e sindicatos podem estar juntos, porém feito água e óleo: sem diluição nem perda de identidade.
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