Por que a “República
de Curitiba” pode responder por crime de traição à pátria
Jornal GGN
Intermediar negociações entre
delatores da Lava Jato e autoridades dos Estados Unidos sem a devida
observância às regras pode custar caro à chamada "República de
Curitiba". Segundo artigo publicado pelo advogado Anderson Bezerra Lopes,
especialista em Direito Penal Processual da USP, o conteúdo do que é oferecido
a agentes estrangeiros em acordos de cooperação precisa, sim, ser de
conhecimento do Estado brasileiro, para evitar riscos à soberania e economia
nacional. Mas não é o que ocorre com a Lava Jato.
Ao GGN, a
secretaria do Ministério Público Federal responsável por intermediar acordos de
cooperação internacional entre estrangeiros e o Estado brasileiro admitiu que a
força-tarefa de Curitiba "negocia" sozinha com o Estados Unidos. Ou
seja, os procuradores agem à revelia do próprio comando do MPF.
Essa situação foi escancarada após a
defesa de Lula apontar que o juiz Sergio Moro vem ajudando a força-tarefa a
esconder os detalhes desse acordo de cooperação com os EUA, ao permitir que os
delatores não sejam obrigados a oferecer detalhes nas audiência do caso
triplex.
Ontem, o GGN mostrou que além de se preocupar com
as delações que a Lava Jato anda exportanto para os EUA, a defesa de Lula
também suspeita que a força-tarefa recebeu ajuda de estrangeiros em solo
nacional, talvez até oferta de tecnologia, para investigar o ex-presidente.
Leia mais aqui.
Para Lopes, "caso estejam
fornecendo informações e documentos de caráter estratégico às autoridades dos
EUA, tais indivíduos podem estar cometendo crimes contra o Estado, previstos na
Lei n° 1.802/53, também conhecidos como "crimes de traição à pátria".
Aqueles que porventura estejam instigando ou auxiliando tais indivíduos a
praticarem tal conduta também podem ser penalmente responsabilizados, na
qualidade de partícipes."
Ilustração: Blog do Esmael
Colaboração
de réus da Lava Jato com os EUA pode virar traição premiada
Anderson Bezerra Lopes, no UOL
Começou a fase de produção de provas
na ação penal movida pelo Ministério Público Federal contra o ex-presidente
Lula e outros réus na 13ª Vara Federal de Curitiba, no Paraná. É certo que tal
acusação já gerou muita discussão nos cenários jurídico e político nacional
quanto à efetiva descrição de conduta criminosa por parte dos envolvidos, bem
como a existência de elementos probatórios mínimos para sustentá-la, conforme
exige a legislação processual penal.
No entanto, uma situação inédita e
extremamente grave ocorreu em todas as audiências até aqui realizadas. Trata-se
da recusa, por parte de algumas testemunhas, em responder sobre a existência de
negociações (ou acordos já firmados) com autoridades dos Estados Unidos para
figurarem como colaboradores premiados daquele país.
Não se pode negar a importância dos
mecanismos legais de cooperação jurídica Internacional em matéria penal, o que
contribui para que os países disponham de ferramentas para combater a
criminalidade que avança para além de suas fronteiras. Todavia, em nenhuma
hipótese tal cooperação pode ocorrer às margens da lei ou com ofensa à
soberania política dos Estados.
Nesse sentido, o silêncio que algumas
testemunhas têm oposto às perguntas sobre as negociações com autoridades dos
EUA e o conteúdo das informações eventualmente transmitidas àquelas
autoridades, a um só tempo, revelam grave ofensa tanto à legislação nacional
quanto à soberania política do Estado brasileiro, prevista no art. 1°, inciso
I, da Constituição Federal.
O sigilo previsto na Lei n°
12.850/13, que trata da colaboração premiada, vale para os acordos negociados
ou celebrados no Brasil, cessando tal sigilo tão logo seja recebida a denúncia.
Assim, não cabe invocar uma restrição imposta por autoridade estrangeira para
impedir a plena vigência da lei brasileira nos processos judiciais que tramitam
em seu território. Do contrário, temos a esdrúxula situação de um juiz
brasileiro afastar a soberania política do Brasil em seu território para, em
seu lugar, admitir aqui a vigência da legislação estrangeira. Não bastasse
isso, duas sérias razões reforçam a ilegalidade dessa situação.
Em primeiro lugar, de acordo com
expressa disposição do Código de Processo Penal, as testemunhas que prestam
compromisso têm a obrigação de dizer a verdade sobre tudo que lhes for
perguntado, não podendo calar ou omitir fatos e circunstâncias segundo seu
juízo de conveniência. As exceções a essa regra geral ocorrem quando, em
virtude de relações de parentesco ou por sigilo profissional, a própria lei as
exime de prestar compromisso ou mesmo as proíbe de depor.
Igualmente, em razão da garantia
constitucional que exime o cidadão de produzir prova que poderá ser utilizada
em seu desfavor (artigo 5°, inciso LXIII, da Constituição Federal), a
testemunha pode se calar quando isto representar uma autoincriminação. Ilustram
bem essa situação as reiteradas decisões do STF assegurando aos depoentes de
CPIs no Congresso Nacional o direito de permanecerem em silêncio quando a
resposta puder prejudicá-los nesse sentido.
Contudo, tal ressalva não se aplica
àquele que firmou acordo de colaboração premiada, obrigando-se a dizer a
verdade, tendo sido regularmente admitido como testemunha em juízo. Esse é
justamente o caso das testemunhas que são réus colaboradores e têm se calado
perante o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Por fim, essa recusa das testemunhas
implica cerceamento de defesa, pois impede que a defesa técnica tenha amplo
conhecimento sobre fatos e circunstâncias que ostentam relevo para o julgamento
da causa, a fim de exercer sobre eles o indispensável contraditório, o que
também é garantia constitucional (artigo 5°, inciso LV, da Constituição
Federal).
Em segundo lugar, tal quadro pode
revelar algo ainda mais grave. Uma das testemunhas revelou ter se encontrado
com agentes dos EUA em território brasileiro. Caso isto tenha ocorrido em
desacordo com o Decreto nº 3.810/01 (Acordo de Assistência Judiciária em
Matéria Penal entre Brasil e Estados Unidos da América) configura-se ofensa à
soberania política do Estado brasileiro.
Em nenhuma hipótese é admissível que agente
de Estado estrangeiro ingresse no território brasileiro para atividades de
investigação criminal sem expressa celebração de acordo de cooperação. Vale
recordar que há precedente de suposta inobservância da legislação sobre
cooperação jurídica internacional na Operação Lava Jato.
Ocorre que não basta o mero
cumprimento a tais formalidades, há restrições ao conteúdo das informações que
podem ser transmitidas às autoridades estrangeiras. Não é admissível o
fornecimento de informações e documentos de caráter estratégico que estejam
relacionados com a defesa nacional. Neste ponto, é preciso recordar que algumas
dessas testemunhas ocuparam os mais altos postos de direção da Petrobras e,
nessa condição, tiveram acesso a informações e documentos sigilosos acerca dos
recursos naturais (por exemplo, gás e petróleo) e da política energética
brasileira.
Caso estejam fornecendo informações e
documentos de caráter estratégico às autoridades dos EUA, tais indivíduos podem
estar cometendo crimes contra o Estado, previstos na Lei n° 1.802/53, também
conhecidos como "crimes de traição à pátria". Aqueles que porventura
estejam instigando ou auxiliando tais indivíduos a praticarem tal conduta
também podem ser penalmente responsabilizados, na qualidade de partícipes.
Portanto, longe de configurar
filigrana jurídica, tal situação deve ser melhor esclarecida e, a depender das
informações e documentos que estão sendo transmitidos, é preciso instaurar
investigação para apurar a responsabilidade penal de tais réus colaboradores e
seus partícipes.
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