Falta completar o discurso
Luciano Siqueira
Seria exagero dizer que as oposições se mostram vazias de
propostas alternativas ao desastroso governo Bolsonaro.
Mas é fato que, aos olhos da maioria da população, a
insatisfação com o governo e o presidente ainda não se completa com a percepção
clara de que algo consistente poderá substitui-lo.
Para além das justas e oportunas reivindicações de vacina
contra a Covid-19, retorno do auxílio emergencial e socorro às empresas
(sobretudo médias e pequenas), propor a retomada do desenvolvimento é
essencial. Em termos compreensíveis pela maioria.
Porque a insatisfação por si mesma não produz a ação
consequente. Por onde caminhar e para que completam a consciência social mínima
necessária.
Por enquanto há mais sofrimento do que esperança.
Basta ver a queda de braço entre o governo de São Paulo e o
governo federal em torno da vacina contra a Covid. Um contrato entre o Butantã
e o ministério da Saúde prevê a renovação de pedido de novos lotes do
imunizante. O ministro, orientado por Bolsonaro, protela o expediente até a
data limite legalmente prevista, na expectativa de desgastar o governador
Dória.
Um enredo absurdo para a tragédia sanitária que já vitimou
mais de 220 mil brasileiros!
Esse entrevero por si mesmo poderia estar motivando
protestos públicos, mas não está. As carreatas do último fim de semana foram um
bom sinal e devem ser ampliadas.
É como que uma letargia causada pela decepção (da maioria
que votou no presidente irresponsável) e pela descrença estivesse inibindo a
população.
Claro que as coisas não mudam na cena política da noite para
o dia. E quando isso acontece é porque as contradições já vinham se agudizando
na base da sociedade, como fogo de monturo, até a explosão social.
Entre nós há muita coisa queimando, sim; mas as labaredas
não parecem tão próximas assim.
E agora que mesmo à direita surgem vozes em favor do
impeachment, um mínimo de convergência em torno do pós-impeachment poderia inclusive
alterar a correlação de forças na Câmara e no Senado. A base parlamentar de
sustentação de Bolsonaro é frágil e volátil.
Nesse cenário, sentar à mesa para uma concertação ampla,
plural e focada na retomada do desenvolvimento reforçaria muito a tendência de
enfraquecimento do presidente e de fortificação das oposições.
Esse exercício em certa medida tem se traduzido nas mais de
seis dezenas de peças encaminhadas à presidência da Câmara dos Deputados
pedindo o impeachment, escritas a muitas mãos, todas elas muito bem
fundamentadas.
Acrescentar mais consistência a esse movimento em nada
atrapalha projetos partidários para 2022. Todos os que resistem se fortalecerão
com a vitória da resistência, a diferenciação se fará depois pelo crivo das
urnas.
Parece simples, mas não é.
O Brasil vive um instante tão crítico quanto carente de
lideranças que polarizem o entendimento nacional.
Sem perder a esperança jamais, vejamos os próximos lances.
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