Eros & Dionísio
Adalberto Monteiro
Os amigos pensavam que o amor que os unia
Tinha o buquê e a resistência de um bom vinho.
Todavia, em tom de magistrado
Ela sentenciou que ele não a procurasse mais
E que buscasse ser feliz com outra...
Ele ficou sem fala como quem recebe
Um soco na boca do estômago.
O telefone fora do gancho, ele caído no assoalho.
A cena era uma fotografia de um crime.
Ali nocauteado, ele concluiu que
O amor, por mais forte que seja,
É igual ao vinho: até o mais tenro tinto,
vinagra.
Se metade do meu coração está aqui, doutor,
A outra metade está na China,
No exército que desce em direção ao Rio Amarelo.
E depois, todas a manhãs, doutor,
O meu coração é fuzilado na Grécia.
E depois, quando os prisioneiros mergulham no
sono,
quando a calma regressa à enfermaria,
O meu coração parte, doutor,
todas as noites
parte para uma casa
velha de madeira em Tchamlidja.
E depois, já faz dez anos, doutor,
que nada tenho nas mãos para oferecer ao meu
pobre povo,
só uma maçã,
uma maçã vermelha: o meu coração.
É por isso, doutor,
e não por causa da arteriosclerose, da nicotina,
da prisão,
que tenho esta angina de peito.
Olho a noite por entre as grades
e apesar de todas as paredes que me pesam no
peito,
O meu coração bate ao ritmo da estrela mais
longínqua.
Leia também um poema de Mia Couto https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/palavra-de-poeta_29.html

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