Manuel D’Ávila: “Não há alternativa fora da
política”
Revista IstoÉ, por Octávio Costa
Ao
nascer sua filha Laura, a deputada estadual Manuela D’Ávila, da Assembléia
gaúcha, comunicou à direção do PCdoB que dedicaria 1000 dias de exclusividade à
primogênita. Só assumiria compromissos oficiais vencido esse prazo. Viu-se,
porém, forçada a antecipar o fim da quarentena por motivo de força maior. Laura
ainda tem dois anos e dois meses, mas Manuela foi convocada por seu partido
para disputar a Presidência da República em 2018. Aos 36 anos e 20 de
militância, a ex-deputada federal assumiu a missão com muito gosto. “O PCdoB
tem grandes nomes e eu me sinto honrada por ter sido a escolhida”. Diante da
tendência mundial de se buscar nomes sem vínculos partidários, ela afirma que
“é contraditório dizer que alguém fora da política vá resolver a crise
brasileira”. Quanto aos comentários de que o PCdoB vai retirar a candidatura
própria no caso de o ex-presidente Lula concorrer, Manuela descarta tal
decisão: “Minha candidatura tem relação com nossas bandeiras. A unidade com o
PT pode se dar no segundo turno”. Pelo visto, a pequena Laura terá de dividir a
presença de sua mãe com a campanha à Presidência.
Sua
candidatura é para valer mesmo ou é uma tentativa de marcar posição?
O País tem 13 milhões de desempregados, 60 mil
pessoas perdem a vida por morte violenta, no trânsito ou por arma de fogo.
Seria muita irresponsabilidade lançar uma candidatura só para marcar posição. O
PCdoB é um partido com uma história muito longa e de muita responsabilidade. Nós
temos 95 anos de vida política. Apenas uma vez pela sigla, lançamos candidatura
à Presidência, com o Yedo Fiúza (ex-prefeito de Petrópolis-RJ) em 1945. Não
faríamos uma candidatura apenas para marcar posição. Achamos que é o momento de
nós apresentarmos saída para a crise.
Não é uma responsabilidade
muito grande para a senhora sair como presidente?
Sempre acho as responsabilidades que o meu partido
me deu muito grandes. Para qualquer brasileiro ou brasileira, a
responsabilidade de ser pré-candidato a presidente é infinitamente grande. Para
mim, não é maior
do que para nenhum outro que tenha noção das responsabilidades
e dos desafios que é pensar o Brasil e discutir a saída da crise para com o
nosso povo.
Por que escolheram o seu nome
já que o partido tem quadros históricos?
Eu tenho 20 anos de militância no partido e
acredito que nossa direção avaliou todos os nossos nomes. Tínhamos muitos
outros nomes com qualidade política: como é o caso de Jandira Feghali (deputada
federal) e da senadora Vanessa (Grazziotin). O próprio governador do Maranhão,
Flávio Dino, poderia ser um nome natural. Mas achamos que o desafio dele no
Estado é muito grande e pedimos para que ele não concorresse à eleição. A
direção do partido, então, chegou à conclusão de que eu aglutinaria as melhores
condições nesse momento. Para mim, é motivo de muita honra.
Qual é a principal bandeira da
sua campanha?
O centro do debate da eleição deve ser as saídas
para a crise e a construção de uma unidade da nação, que nós chamamos de frente
ampla e popular, para unir o país, nosso povo, em torno de saídas para a crise.
Acreditamos que é importante que o país debata a retomada do seu crescimento.
Qual o papel do Estado na retomada desse crescimento. Defendemos também o
debate profundo sobre medidas que Temer tomou e que prejudicam as cadeias
produtivas mais dinâmicas do Brasil e a indústria nacional, como é o caso da
TJLP (taxa de juros de longo prazo) e das operações no BNDES. Esse debate tem
muito a ver com a nossa juventude. A gente tem uma leva de jovens brasileiros
que acaba deixando o País pelo processo de desindustrialização. Queremos
debater como nós vamos fazer para encontrar saídas enquanto nação.
Num programa recente, o PCdoB
deu muita ênfase à questão do capital estrangeiro. Fez lembrar as músicas da
UNE com menção ao “entreguismo”. A senhora acha que esse é um ponto importante?
Quando falamos sobre a revogação dessas medidas de
Temer, a gente discute justamente isso: o que o Temer tem feito com a economia
brasileira. Como essas saídas vão reforçar a nação, garantir a nossa soberania
e desenvolvimento? Não existe nação desenvolvida sem soberania e sem indústria.
É preciso investir nas nossas indústrias.
A senhora deve ser a candidata
mais jovem. Acha que isso pode atrair o apoio dos jovens a sua candidatura?
Como a política brasileira é composta por gente
muito acima da minha idade, parece que estou sempre jovem. Acho que os jovens
brasileiros têm preocupação em qual país eles vão viver. A eleição não pode ser
um espaço de acirramento de crise, mas um espaço de construção e soluções. Os
jovens terão interesse em discutir isso porque nós também temos essa
preocupação.
Ao mesmo tempo, fala-se muito
da tendência de buscar um nome novo para a política, o que faz surgirem nomes
fora da política, como o do apresentador Luciano Huck. A senhora acha que isso
pode prejudicar sua campanha?
Todos esses nomes merecem respeito. Mas a gente
precisa entender que não existem nomes por fora da política. O problema do
Brasil é político. Não vai se resolver essa crise por fora da política. É
contraditório dizer que alguém fora da política vá resolver a crise brasileira.
Essa pessoa não vai se sentar com os presidentes de outros países? Não vai se
sentar com setores econômicos do nosso país? Isso é fazer política.
O PCdoB tem 95 anos e, além
disso, é um partido marxista. Isso não conflita com a atual tendência de se
buscar nomes novos na política?
Eu acho que nós somos o novo. A crise que estamos
vivendo é a crise do capitalismo, esse sistema que tem
levados milhares de
jovens brasileiros à morte, por causas violentas, que se mantém a partir da
desigualdade social.
A senhora é marxista?
Eu sou. Se não fosse, não seria filiada ao PCdoB
desde os meus 16 anos.
A Revolução Russa nesse cenário
ainda serve de exemplo para sua militância política?
Marcou esse século. Óbvio que nos inspira. Mas os
erros do processo da revolução também nos ensinam. Tem gente que não aprende
com os erros. Sobretudo, aqueles que tentam repetir as saídas para a crise
iguais as de 1929. Não há modelo de socialismo de um país para o outro. Foi
isso que aprendemos com a Revolução Russa.
Se o ex-presidente Lula tiver a
candidatura confirmada, a senhora vai continuar com a sua?
Nossa candidatura não tem relação com os debates
dos outros partidos. Ela é fruto da relação com as nossas bandeiras: dos
problemas que nós identificamos no Brasil e das soluções que nós acreditamos
serem possíveis para o país. A não participação de Lula no processo eleitoral
seria o símbolo do agravamento da crise institucional. Essa unidade com o PT
pode se dar num segundo turno das eleições.
Mas essa decisão não seria da
senhora. Seria da direção do partido?
Todas as decisões nossas são do partido. Como
aconteceu na minha candidatura. Fazemos as coisas de forma coletiva. Isso é o
mais adequado: que as pessoas não se julguem salvadoras da pátria. Não sou uma
candidata de mim.
A senhora afirmou que não
admitiria ser vice do Lula. Por quê?
Não falei isso. Falei que sou candidata a
presidente. Ninguém se lança candidato a presidente, com o seu programa, para
ser vice.
Existe um fato novo nessa
eleição que é um candidato assumidamente de direita, com posições que batem de
frente com o pensamento da esquerda, que é o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ).
Como a senhora avalia a candidatura dele?
Na verdade, ele bate de frente com as ideias de uma
direita liberal. Representa um tipo de direita que é ultraconservadora e que
beira o fascismo. Muitas vezes, se manifesta dessa forma. Ele fere tudo que nós
conquistamos de positivo, do respeito às instituições, do reforço aos direitos
individuais. O mais grave nisso é a ideia de que a crise não tem uma saída e
que precisa ser acirrada. Isso que ele estimula na sociedade.
A senhora acha que a
candidatura dele não prospera?
Eu acho que, na hora que começarmos a fazer um
debate sobre o Brasil, as pessoas perceberão que ele é uma antítese da
esperança que nós precisamos ter para a construção de um Brasil melhor. Ele é o
agravamento da crise.
E quanto aos tucanos, que são
tradicionais adversários, sempre no segundo turno contra o PT, a senhora acha
que pode ocorrer novamente esse enfrentamento?
É uma eleição absolutamente aberta. Não me
precipitaria em fazer uma análise sobre esse bolo todo de uma eleição que ainda
não tem nem o seu primeiro turno consumido, com todas as peças.
Os candidatos principais do
PSDB, que são o prefeito João Dória e governador Geraldo Alckmin, têm a
vantagem de sair de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país…
Eles nem se acertaram entre eles. Como é que a
gente vai falar sobre a candidatura deles?
A senhora tinha largado
Brasília dizendo que queria voltar a sua terra. Como é que se explica sua
entrada numa disputa acirradíssima e que envolve a possibilidade de voltar à
capital federal?
Adoro ser deputada estadual. Voltei para cá porque
tenho compromisso com meu estado, que vive uma situação econômica bastante
difícil. Não concorri à prefeita e nem para deputada federal porque minha filha
tinha seis meses de vida. Eu achava que aquilo seria errado para o que eu
acredito sobre a maternidade. A minha filha agora tem dois anos e dois meses.
Ela já conversa. Ontem (quinta-feira 8), quando eu fui a Brasília, ela me
mandou um vídeo dizendo: ‘a mamãe tá num trabalho grande’. Quase se passaram os
meus 1000 primeiros dias (de exclusividade à primogênita). Como, por duas
vezes, eles foram acolhedores com as minhas decisões pessoais, eu também achei
que era o momento de eu ouvir o debate que eles estavam fazendo sobre o meu
nome com tranquilidade.
Como a senhora pretende lidar
com a questão do machismo?
A gente não lida. A gente enfrenta o machismo. O
tempo inteiro, nós vivemos com isso. Não tenho orgulho de dizer isso, mas eu me
tornei alguém forte para lidar com o machismo porque eu tenho mandato desde os
22 anos.
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