O Evangelho segundo Jair: Jesus de pistola, liberdade sem oxigênio
Bernardo Mello Franco, O Globo
Em
desvantagem nas pesquisas, Jair Bolsonaro decidiu reforçar a apelo ao voto
religioso. Na última semana, o capitão teve cinco encontros com evangélicos.
Visitou templo em Orlando, participou de evento gospel no Rio, recebeu pastores
em Brasília e discursou em dois cultos em Belém. Ontem repetiria a dose num
congresso bíblico em Manaus.
A primeira parada foi na Lagoinha Church da Flórida, comandada pelo
pastor e cantor André Valadão. De camiseta Prada e relógio Rolex, ele se
arriscou como animador eleitoral. Incentivou a plateia a “fazer barulho” e dar
um “grito de alegria” em homenagem ao “nosso presidente”.
Empolgado com a recepção grifada, Bolsonaro desafiou uma lei básica da
ciência. “Podemos até viver sem oxigênio, mas jamais sem liberdade”,
enrolou-se. A TV Brasil interrompeu a programação para transmitir o falatório.
Numa tentativa de driblar a lei eleitoral, apresentou o ato de campanha como um
“encontro com a comunidade brasileira”.
De Orlando, o capitão participou do evento Esperança Rio, que reuniu
milhares de fiéis na Praia de Copacabana. Em vídeo exibido no telão, ele
comparou a corrida ao Planalto a uma “luta do bem contra o mal”. “Venceremos!
Que Deus abençoe o nosso Brasil”, discursou.
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sua base https://t.co/Dp8f13AzZ4
Na sexta-feira, a emissora oficial voltaria a cobrir dois cultos
eleitoreiros. Em encontro da Igreja Quadrangular, Bolsonaro descreveu o
exercício da Presidência como uma “missão do Criador”. “Hoje nós temos um
presidente e um governo que acreditam em Deus”, disse.
Na Assembleia de Deus, ele tentou equiparar a eleição de outubro a uma
guerra santa. “Do lado de lá, tem aquele que defende a ideologia de gênero. Do
lado de cá, aquele que quer preservar a inocência das crianças em sala de
aula”, elogiou-se.
As palavras agradaram o pastor Samuel Câmara, irmão de deputado
bolsonarista e dono de uma rede de comunicação evangélica. “É impossível a nós,
brasileiros evangélicos, não lhe apoiar”, derramou-se.
O jogo até outubro será pesado. Nesta semana, o jornal da Igreja
Universal publicou artigo acusando o PT de defender a liberação indiscriminada
das drogas. “Não podemos confiar em um partido político que negocia com
traficantes”, diz o texto, editado ao lado da coluna do bispo Edir Macedo. O
Republicanos, partido ligado à Universal, apoia a reeleição do presidente e
dará legenda a seu candidato ao governo de São Paulo, o ex-ministro Tarcísio de
Freitas.
Apesar da aliança com as grandes igrejas, Bolsonaro ainda não conseguiu
garantir a liderança entre os evangélicos. O último Datafolha mostrou que o
segmento está dividido. O capitão tem 39% das intenções de voto, e Lula aparece
com 36%.
O empate técnico pode explicar a afobação presidencial. Em encontro com
pastores na quarta-feira, Bolsonaro tentou reescrever o Novo Testamento em
causa própria. Sem corar, disse que Jesus “não comprou uma pistola porque não
tinha naquela época”. No Evangelho segundo Jair, Cristo trocaria o Monte das
Oliveiras por um estande de tiro.
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Nem tudo o
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