26 junho 2022

Crônica deste domingo

Quando mente e corpo não se entrosam

Luciano Siqueira

 

Postei nas redes sociais cenas da festa junina familiar. Muita gente viu e vários arriscaram um comentário.

Pelo WhatsApp, a pergunta curiosa:

— Você dança bem o forró?

Ou o elogio falso:

— Gostei de ver seu jeito animado na quadrilha!

Na verdade, não dancei forró nem participei diretamente da quadrilha. Fotografei e filmei. Só.

Simplesmente porque não levo jeito para tanto.

Essa incompetência me acicata desde a adolescência. Nunca soube dançar, nem determinação suficiente para superar a timidez que me impede, paralisa.

O fato é que dançar propriamente não, mas participar da algazarra do carnaval no meio da multidão é talvez a minha única experiência do que se possa chamar, mesmo rudimentarmente, tentativa de mexer o corpo em sintonia com os acordes.

Na multidão o tímido se resolve, já comentei isso em algumas crônicas. Então, ali no vuco-vuco, subindo e descendo ladeiras de Olinda ou nas ruas do Recife Antigo atrás de orquestras de frevo, quem vai prestar atenção a esse precário folião?

Leia também: 'Tantos carnavais' https://bit.ly/3nkz7I4

Não tenho diagnóstico preciso, nem jamais busquei junto a algum especialista minimamente afeito ao tema... Mas é incrível a discrepância entre o meu prazer em ouvir música, me deliciar com construções melódicas bem feitas e que tais e, ao mesmo tempo, a incapacidade de traduzir com o corpo o que escuto.

— Você nunca se matriculou numa escola de dança?

— Não.

— Por que?

— Não tive vontade, ora!

E assim me encaminho para o fim (que espero ainda demore bastante) da minha modesta existência sobre o solo deste planeta alheio a essa manifestação física dos variados sentimentos humanos, a dança.

Mas gosto de ver — isso talvez me credencie pelo menos ao purgatório, ao invés da condenação inapelável por tamanha incompetência.

[Ilustração: Heitor dos Prazeres]

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Veja: A poesia em seus lugares e cores https://bit.ly/3BKdwhd     

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