18 setembro 2024

Enio Lins opina

Quando uma cadeirada quer dizer muita coisa
Enio Lins 

Reinaldo Azevedo, hoje nosso principal colunista nacional, destacou a impropriedade, e riscos, dos debates eleitorais realizados com normas que não só permitem, mas estimulam as práticas de provocação e agressão entre as candidaturas. Verdade também é o interesse da assistência pelo confronto pessoal, apesar das declarações em contrário. E quem organiza o pugilato anuncia “regras rigorosas” para evitar excessos. Mas o traçado avança privilegiando o engalfinhamento, numa sequência clássica de “pergunta, resposta, réplica, tréplica, e seja o que Deus quiser”. Nesse ritmo de “luta na lama”, a cadeirada na contenda da TV Cultura, finalmente, produziu um êxtase que tem ocupado febrilmente todo noticiário por dias a fio. Isso quer dizer algo.

DEBATE NÃO É BATE-BOCA

Em guerra permanente por audiência, as emissoras não arredarão pé das chances de transmitir ao vivo, e de obter incontáveis retransmissões, um insulto mais pesado, um tapa, ou uma nova cadeirada. Dificilmente mudarão essas regras, pois a estupidez vende. Daí a importância de se cobrar, em crescente veemência, a definição de mudanças capazes de proporcionar um debate político de nível cidadão, centrado em propostas e análises. A jornalista Cristina Serra cutucou a ferida: “No fundo, estão todos satisfeitos. Políticos, comentaristas que precisam de assunto pra falar 24 horas seguidas, as TVs e sites que saem do anonimato de suas existências medíocres nessa época, e, claro, o esgoto digital que precisa sempre e cada vez mais de matéria podre pra alimentar as feras. O que vemos nessa campanha em São Paulo é a vitimização do  grotesco’ elevada à enésima potência, conceito há muito estudado, mas agora radicalizado pela extrema direita, oferecido pela mídia como espetáculo e avidamente consumido mesmo por aqueles que o criticam”.

PROVOCAÇÃO-VITIMIZAÇÃO

Vitimizar-se é um dos objetivos dessa política de provocação continuada. E, na primeira chance, o machismo brutalizado cede lugar ao coitadismo delicado em fração de segundos. Nessa toada, antes, aquele “militar treinado para matar”, mostrou-se incapaz de se defender de uma faca de cozinha, mesmo protegido por dezenas de áulicos (todos armados e treinados para mamar), e cenografa caras e bocas até hoje, depois de seis anos que a “facada milagrosa” o catapultou para a presidência da República. Antes da cadeirada recebida, ao vivo, no debate da TV Cultura, o elemento cadeirado se esmerou em todos os debates anteriores em agressões verbais diretas, desrespeitosas, sem economizar baixarias, mentiras, calúnias e difamações contra seus adversários. Quando, enfim, conseguiu tirar um deles do sério, e levou (de raspão) uma lapada, passou ao mimimi radical, posando a inalar oxigênio e deixando-se fotografar numa cama de hospital, “feridíssimo”, apesar da pulseira verdinha indicar atendimento sem urgência. E, diziam seus assessores, teria fraturado uma (ou mais de uma) costela; e, segundo as imagens disponíveis, mesmo “ferido” continuou a trocar insultos, sem demonstrar quaisquer incômodos físicos. E, enquanto isso, nos Estados Unidos, Trump trombeteava que poderia ter sido vítima de um segundo atentado, coitado... É o marketing da vitimização dos brutos especializados em baixarias e arroubos. Deu resultado, no Brasil, em 2018, na mídia e no voto, mas – pelo menos em São Paulo – o pífio resultado da cadeirada 2024, rendendo nada para a campanha do agente provocador vitimizado, diz que esta fórmula de sucesso midiático está em declínio eleitoral. Aguardemos os próximos capítulos.

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