O Brasil não se rende: soberania e resistência ao tarifaço de Trump
Em meio às sanções dos EUA, artigo defende união nacional, reação firme e medidas para proteger economia e democracia
Walter Sorrentino/Portal Grabois www.grabois.org.br
O Brasil está sob agressão direta e injustificada do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. De forma desrespeitosa às relações civilizadas entre ambos os países, construídas ao longo de dois séculos, Trump impôs sanções econômicas que ferem o povo brasileiro e afrontam nossas instituições democráticas, numa ingerência inaceitável nos assuntos internos da nação.
Ataque comercial e chantagem política
O tarifaço imposto ao Brasil – até o momento o mais alto do mundo – é, na prática, uma declaração de guerra comercial. Mas é mais que isso. Particularmente grave é a chantagem sobre o Supremo Tribunal Federal no julgamento dos golpistas de 8 de janeiro. A Lei Magnitsky – aplicada a terroristas e ditadores – contra o ministro Alexandre de Moraes atinge a própria soberania de nosso país. Ainda na esfera política, Trump não esconde o intento golpista de dar sobrevida à extrema-direita, indicando que o ex-presidente Bolsonaro é um “perseguido político” e que as eleições de 2026 não serão limpas.
Como tem sido seu estilo, Trump agride, recua, mas mantém o ataque. A ordem executiva assinada ontem traz inúmeras exceções para produtos brasileiros, mas, ao mesmo tempo, classifica o Brasil como uma “ameaça incomum e extraordinária” à segurança e à economia dos Estados Unidos, o que justificaria uma “emergência nacional”, e recorreu à imposição de extraterritorialidade das leis e interesses de seu Estado fora de suas fronteiras nacionais.
A estratégia do grito não colou para os brasileiros. Quem seguiu firme foi o Brasil, o presidente Lula, o Congresso Nacional e o STF, que denunciaram as ingerências e defenderam as instituições. O governo buscou negociar, recebeu apoio e dialogou com setores afetados, denunciou as sanções na Organização Mundial do Comércio e mobilizou esforços diplomáticos – inclusive com a conversa direta entre o ministro Mauro Vieira e o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, na véspera do anúncio do pacote de sanções. A postura coesa deve ter frustrado os que esperavam submissão. O apoio ao governo Lula cresceu. Mais: segundo pesquisa Quaest, 72% consideram que Trump errou ao justificar as medidas com base em perseguição a Bolsonaro.
Quais as razões de tanta agressividade que aparenta ser insânia?
Crise dos EUA e disputa pela hegemonia global
Trump reage à crise e ao declínio econômico dos EUA para buscar impor ao mundo o custo de “fazer a América grande de novo”. Evidencia que, sob seu comando, os EUA disputarão a hegemonia, a que preço for, na nova realidade multipolar que emergiu com o protagonismo crescente da China e do BRICS. Já nesta quarta-feira (30), anunciou tarifas de 25% sobre produtos importados da Índia, além de uma taxa extra pela compra de petróleo e armas da Rússia, a entrar em vigor a partir de 1º de agosto. Explicitou, para quem queira ouvir, que o BRICS é “um ataque ao dólar”. Isso pressupõe manter a América Latina sob tutela.
Nessa lógica, o Brasil é alvo principal, por seu peso e condição de pivô do continente e forte protagonista do BRICS. Isso deriva do papel altivo e independente de nossa política externa, do peso do país no G20 e nos alinhamentos Sul-Sul. A criação do Pix, as reservas de terras raras e os avanços na integração logística da América do Sul são conquistas que incomodam os EUA.
Uma guerra híbrida contra a soberania nacional
Assim vistas as coisas, no espírito do tempo, a ofensiva econômica e política do governo Trump contra o Brasil não se resume a uma mera disputa comercial, mas busca a desestabilização imperialista de nosso país, com práticas e táticas típicas de uma guerra híbrida. São exemplos disso impor sanções unilaterais, interferir diretamente nos assuntos internos do país e atacar instituições como o Supremo Tribunal Federal, à margem dos princípios do direito internacional. Trata-se de uma combinação de pressões econômicas, diplomáticas, jurídicas e informacionais com o objetivo de desestabilizar a soberania nacional e subordinar o Brasil aos interesses estratégicos de Washington.
Em tais condições, o tarifaço alerta a nação. Repito o que disse Celso Furtado: “No mundo de hoje, se você perde a soberania, é quase impossível recuperá-la. Nosso país tem a tradição de preservá-la. Conseguiu manter sua unidade com todas as forças dispersivas que havia em sua cultura e sua formação. Quando a soberania corre risco, parece que desperta um instinto de sobrevivência. No mundo de hoje, é difícil explicar um Brasil tão vasto, com tantos recursos, sem nenhum movimento de dissidência. É o entranhamento, em nós, da noção de soberania.”
Medidas para defender a economia e a democracia
O governo Lula mobilizou os três Poderes da República para defender, com firmeza e equilíbrio, a soberania e a democracia no país. Já se tem a Lei de Reciprocidade Econômica. Serão necessárias medidas econômicas corajosas para proteger o setor exportador e blindar a economia popular contra a eventual inflação importada, e ao mesmo tempo fortalecer o mercado interno e diversificar seus mercados de exportação. Num momento excepcional, é possível ajustar o arcabouço fiscal para preservar o crescimento da economia, o emprego e a reindustrialização.
Uma série de outras questões se colocarão no horizonte, para amplo debate. O Brasil precisará enfrentar as vulnerabilidades externas e reforçar sua autonomia estratégica. Nenhuma nação terá força sem um projeto nacional autônomo, com clareza estratégica e capacidade de se posicionar na disputa global em curso. Está em questão proteger seus dados e data centers, regulamentar as redes e as Big Techs conforme suas leis, fortalecer a soberania tecnológica e científica, revisar sua doutrina militar com foco em força de dissuasão, para viver em paz com as demais nações do mundo, proteger as reservas internacionais por meio da diversificação das relações monetárias, reduzindo a dependência de moedas hegemônicas.
A força do povo brasileiro na defesa da nação
O mais importante em apoio a essas medidas será revigorar a consciência nacional na sociedade. A imensa maioria dos brasileiros e brasileiras certamente se unirá em torno dos interesses nacionais e das instituições democráticas. Haverá aqueles que não se somem a esse movimento patriótico, mas o povo brasileiro não tolera traidores. Quaisquer que sejam as razões que alegam, eles não merecem respeito.
A lição histórica no Brasil é a de que quem mais defende a nação é seu povo. Como diz o trecho de Brasil Pandeiro, composta por Assis Valente: “Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor”.
Walter Sorrentino é presidente da Fundação Maurício Grabois e vice-presidente nacional do PCdoB.
[Se comentar, identifique-se]
“O Brasil
exige respeito e não cederá às pressões de Trump” https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/lula-no-new-york-times.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário