Nilson Vellazquez, no blog
Verbalize
Os mais recentes acontecimentos da política
nacional, mais do que indignar, mobilizar e comover as pessoas com espírito
democrático, suscitam diversas curiosidades sobre qual o papel, poder e até
onde podem ir determinados órgãos do Estado brasileiro na condução das
investigações e, sobretudo, dos rumos de nosso país. O leitor comum, por
exemplo, muito provavelmente, nunca lidou, de maneira tão recorrente, com
siglas e palavras como STF, MPF, Polícia Federal, delação premiada, condução
coercitiva etc.
Se por um lado existe a baixa adesão para as
questões políticas nacionais, a estrutura conservadora do estado nacional
provoca uma verdadeira obscuridade nas relações com esses órgãos, cujo sentido
meritocrático das ocupações de suas cadeiras jogam uma fumaça de isenção, de um
estado pairando por sobre as relações concretas, políticas, reais.
Essa estrutura conservadora do estado brasileiro
refere-se à forma como se ergueu uma superestrutura político-ideológica para
garantir o privilégio, o status, a manutenção dos privilégios de classes
dominantes que comandam/comandaram o país por mais de 500 anos. A elite
brasileira, mais antinacional impossível, erigiu para si uma estrutura para
abrigar os seus, - aqueles que faziam os cursos superiores nas universidades de
Coimbra, Lisboa etc. - solidificando um estado inacessível aos súditos (vide a
ausência de serviços básicos como saúde, educação, saneamento básico) e
extremamente burocratizado, lento e ineficiente.
Sobre essa estrutura, já afirmara Marx: "o
estado é o poder político organizado de uma classe para opressão de outra, um
comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa". Essa
afirmação de Marx, embora não seja de todo suficiente para explicar a formação
do estado brasileiro, desmascara as concepções de que sobre a sociedade se
ergue um estado neutro, com instituições - PF, STF, MPF - cujo único objetivo é
manter a "ordem e o progresso". Combate-se, inclusive, a concepção
hegeliana de que o estado é dirigido por uma "classe universal" e que
a burocracia tem a incumbência de defender o "interesse geral" contra
os "interesses particulares e egoístas" localizados na sociedade
civil. Nesse sentido, Marx ainda jovem, afirma que essa burocracia, não sendo
uma classe universal, na verdade só esconde seus interesses corporativos.
Somam-se às concepções do estado como resultado da
luta de classes, as concepções amplificadoras de Gramsci e Althusser. Segundo
Gramsci, "o estado é o complexo de atividades práticas (materiais) e
teóricas (ideológicas) com o qual a classe dominante não somente justifica e
mantém a dominação como procura o consentimento ativo daqueles sobre os quais
governa". Para Althusser, o estado era representado pela soma dos
aparelhos ideológicos e aparelhos repressivos, em que este se utiliza da força
para manter o domínio de determinada classe, enquanto aquele, através da
escola, imprensa, igreja etc., buscam conquistar o, nas palavras de Gramsci,
"consentimento ativo" dos governados.
Esse breve resumo sobre algumas das teorias
marxistas de estado servem para ao menos tentar explicar a estrutura do estado
brasileiro. Conservador, burocratizado, a serviço de uma determinada classe
dominante - ora coroa portuguesa, ora produtores de cana de açúcar, ora
oligarquia do café, ora industriais e hoje banqueiros - e com poderosos
aparelhos repressivos (Polícia Federal, Polícias Militares, exército) e
ideológicos (Rede Globo, Veja, escolas etc.). Além disso, como se a burocracia
não fosse muita, um papel exacerbado dos órgãos de controle como tribunais de
conta e ministérios públicos. Para se ter ideia, muitas das obras recentes do
PAC são paralisadas pelos órgãos de controle, burocratizando e deixando inerte
a capacidade de indutor do desenvolvimento que o estado brasileiro poderia e
deveria ter.
A estrutura conservadora do estado brasileiro,
nesse sentido, continua exercendo o mesmo papel de 500 anos atrás: o papel de
corporação e de manutenção dos privilégios da classe dominante. Essa condição,
infelizmente, não foi alterada com a assunção de um operário ao centro do poder
da República em 2002. E muito embora tenham sido incontáveis as conquistas do
último período, diferentemente dos communards da Comuna de
Paris, que numa experiência de 70 dias tentaram mudar a estrutura do estado,
aqui, ela foi mantida, sem ao menos reformá-la.
Dessa forma, como na história da República
Brasileira sempre foram constantes os momentos de instabilidade política - ora
por contradições no seio da própria classe dominante, ora entre nacionalistas e
entreguistas -, as classes dominantes como donas do tabuleiro, qual meninos
inconformados, mais uma vez bagunçam o jogo para restabelecer seu domínio sobre
os destinos da nação.
Por isso, para os que têm clareza do que está em
jogo, o fiel da balança numa luta que é de classes, é o componente político.
Não é à toa que às classes dominantes, não cabendo mais artimanhas, sobra o
papel de apelar ao anti-político, ao fascismo. Nesse sentido, nunca foi tão
importante o exercício da política, por dentro e por fora do estado. Garantindo
a amplitude necessária para, inclusive, salvar a classe política de um abismo
que pode nos levar a um estado - na sua forma - autoritário e antidemocrático,
e estabelecendo mobilizações massivas a ponto de interferir em decisões dos que
estão jogando o jogo.
O jogo é pesado. Ter ciência da natureza que o
envolve é essencial. Vamos à luta!
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