O erro de Lula
Marcelo Mário de Melo
Um militante deve ter
muito cuidado nos seus pronunciamentos. Quando diz coisa errada, alimenta a
artilharia do inimigo e trás desconforto às próprias fileiras. Afloram a
tristeza, a defensiva, o desencanto. Paralelamente às atitudes de avestruz,
tipo “não foi isso que ele queria dizer”, “estão exagerando”, “deixa pra lá”,
por parte dos que confundem companheirismo, solidariedade e respeito, com
acriticismo e devoção, que somam zeros à esquerda. Quando se trata de uma
liderança que envolve milhões, as declarações malfeitas podem provocar grandes
estragos.
Mas ante fatos consumados,
a única posição decente e consequente é o antigo exercício da crítica e da
autocrítica. Coisa de comunista. Coisa boa e importante, a ponto de Lênin dizer
que “o aproveitamento que os nossos inimigos políticos possam fazer das
migalhas da nossa autocrítica é muito inferior ao benefício trazido pela
discussão pública dos nossos erros”. “Cito de memória o que deve estar está
escrito em O que fazer ou em Um passo á frente dois atrás – uma crise em nosso
partido”. E convém aqui procurar seguir a indicação de Frederico Engels em o
Antidhuring, quando diz: “o rigor, primeira condição de toda crítica”.
A seguir as palavras de
Lula em entrevista a Mino Carta, na Carta Capital. “Ainda bem que a natureza,
que a natureza, contra a vontade da humanidade, com esse monstro chamado
Coronavírus, com esse monstro, permitindo que os cegos enxerguem, que os cegos
comecem a enxergar que apenas o Estado é capaz de dar solução a determinadas
crises”.
Declaração feita num
momento em que chocavam a sensibilidade das pessoas as declarações desdenhosas
e cínicas de Bolsonaro ante as mortes, aos milhares, de pessoas contaminadas
pelo Covid-19. Com a repercussão negativa, Lula, imediatamente, fez um pedido
público de desculpas: “Eu usei uma frase totalmente infeliz, que não cabia”.
Mas o processo de crítica e autocrítica não se esgota aí, sendo necessário um
desdobramento em dois sentidos: penetrar na natureza político-ideológica do
erro cometido, tomado como modelo negativo a ser bem entendido e evitado;
estabelecer linhas de contrapropaganda para reduzir os danos políticos.
Quanto ao primeiro aspecto, temos a imagem da Mãe-Natureza disseminando o Coronavírus , ceifando vidas, semelhante ao Deus punitivo do Velho Testamento lançando as sete pragas do Egito. No exercício de uma pedagogia mortuária para esclarecer sobre os descaminhos do neoliberalismo, exacerbados no governo de Bolsonaro. Temos aqui uma versão macabra da política do “quanto pior, melhor”, sendo os custos do pretenso aprendizado – que contradição! – pagos com as vidas do povo pobre que se defende ao longo do discurso.
Quanto ao primeiro aspecto, temos a imagem da Mãe-Natureza disseminando o Coronavírus , ceifando vidas, semelhante ao Deus punitivo do Velho Testamento lançando as sete pragas do Egito. No exercício de uma pedagogia mortuária para esclarecer sobre os descaminhos do neoliberalismo, exacerbados no governo de Bolsonaro. Temos aqui uma versão macabra da política do “quanto pior, melhor”, sendo os custos do pretenso aprendizado – que contradição! – pagos com as vidas do povo pobre que se defende ao longo do discurso.
Quando ao segundo aspecto,
ressaltar que Lula, no dia seguinte ao seu pronunciamento, apresentou um pedido
de desculpas pala sua infeliz declaração. E destacar que ela constituiu um
aspecto isolado, pois o conteúdo e a extensão da sua fala se referiam à defensa
da ampliação da ação do estado na sustentação de políticas públicas voltadas
para o bem estar-social, destacando-se os direitos trabalhistas e
previdenciários e a saúde pública, com o fortalecimento do SUS.
Nestas duas linhas,
acredito que se costura bem a crítica e a autocrítica do caso. Lembrando que o
que os militantes e simpatizantes esperam dos seus líderes é que, com os seus
pronunciamentos, antecipem, iluminem e subsidiem o seu trabalho, e não que lhes
dêem trabalho, impondo-lhes exercícios emergenciais de correr atrás do
prejuízo, tapar buracos e desatar nós cegos na defensiva.
Marcelo Mário de Melo é jornalista e poeta e tem 59 anos de militância revolucionária.
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