30 abril 2009

Artigo semanal no site da Revista Algomais*

Ampla pressão sobre o setor rentista
Luciano Siqueira

Sociedade desigual, marcada pelo contraste de interesses, o Brasil não dá passos seguros na direção do seu futuro se não for capaz de romper com amarras que impede seu pleno desenvolvimento. Não é apenas uma tese, mas algo muito concreto – especialmente neste instante em que, afetado pela crise global, o país resiste como pode, com chances de sair fortalecido adiante.

Como pode, em termos. Pode muito mais do que se tem feito, desde que os poderosos interesses do setor dominante na economia – o rentista – sejam arrostados pelo conjunto da sociedade e, desse modo, se possa lastrear decisões políticas tão ingentes quanto necessárias.

Outra não é a conclusão a partir de mais um lance relativo ao conflito entre a especulação financeira e as atividades produtivas. Levantamento feito pelo Departamento de Competitividade e Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), apoiado em dados do Banco Central, revela que o aumento do spread bancário em pleno ambiente de crise custou R$ 8,2 bilhões aos brasileiros. Ou seja: o correspondente a 1,5% do total de investimentos em produção realizados em 2008, ou cerca de 0,5% do consumo das famílias, foi pago a mais por causa dos aumentos do spread acima do valor relativo à inadimplência entre setembro de 2008 e fevereiro deste ano.

Como se sabe, o spread - custo de captação balizado pela taxa básica de juros (Selic) – equivale à diferença entre a taxa de juros cobrada por bancos e financeiras nas operações de crédito e a que eles pagam para captar os recursos. A taxa Selic tem caído, mas sem maiores repercussões sobre o valor do spread.Usura pura e simples. Escandalosa imposição dos interesses do setor financeiro sobre os superiores interesses da Nação.

O estudo da FIESP demonstra a falsidade do argumento dos bancos, que dizem ter aumentado o spread por causa do maior risco de inadimplência. Isto porque a inadimplência aumentou em 19,5% entre setembro de 2008 e fevereiro de 2009, porém com um detalhe: esse aumento justificaria uma elevação de apenas 7,3% no spread, quase a metade dos 13% aplicados pelos bancos. Mais: no período dos cinco meses analisados, as despesas dos brasileiros com pagamento de juros somaram R$ 152,6 bilhões, de acordo com informações do Banco Central. Esse gasto – assinala o estudo da FIESP - deveria ter sido de R$ 144,3 bilhões – sobrando aí nada menos do que R$ 8,2 bilhões correspondentes aos aumentos injustificados do spread.

Faz sentido, diante de tudo isso, o pronunciamento conjunto das centrais sindicais de trabalhadores e a CNI e FIESP– divulgado há mais ou menos dois meses, sem maiores repercussões na grande mídia – propondo a redução do spread em combinação com a aceleração da taxa Selic, como forma de dar conseqüência às medidas de estímulo à produção e ao consumo adotadas pelo governo. Uma aliança temporária, pontual – mas de grande alcance para o futuro imediato do país.
* Excepcionalmente publicado também em minha coluna no portal Vermelho www.vermelho.org.
www.lucianosiqueira.com.br

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