Marolinha e galego de olhos azuis
Luciano Siqueira
O antecessor, FHC, tido como príncipe dos sociólogos (sic), se esmerava no uso de linguagem escorreita e não perdia a oportunidade de dialogar em idioma estrangeiro, num ridículo exibicionismo poliglota esquecido do dever de todo chefe de Estado de se expressar na língua pátria quando em colóquio com autoridades de outros países.
Lula prefere a linguagem do povo, o uso de imagens compreensíveis e de fácil assimilação em qualquer bate papo de esquina – mesmo quando trata de assuntos complexos, como a atual crise global e suas repercussões sobre o Brasil (inclusive diante de auditórios tecnicamente qualificados). Para ele vale a máxima de que comunicação é quando alguém fala e todos entendem.
Admitamos que em alguns casos tenha se descuidado – quando chamou de marolinha a crise que se iniciava, por exemplo. O descuido está em abrir o flanco para quem quer fugir da questão essencial: as condições que o país hoje reúne para sobreviver à crise fruto de múltiplas ações do atual governo e do rumo que vem trilhando. Ao invés de discutir as medidas anticrise e a aposta nas próprias potencialidades do país, os investimentos estatais em infra-estrutura, os esforços para manter o nível da produção e do emprego, os críticos contumazes (analistas da grande mídia ou próceres oposicionistas) fazem chacota ou distorcem o sentido das palavras do presidente. E como desejam que a crise de fato se aprofunde e que as conquistas populares se esvaiam, centram fogo na expressão marolinha.
Em linha semelhante, o comentário de um tal Alexandre Garcia, transmitido anteontem em rede nacional de rádio, desperdiçando preciosos sete minutos (se não foi mais) com a bobagem de que, ao contrário do que afirmara o presidente, há banqueiros, sim, negros – e não apenas loiros e de olhos azuis. Ora, qualquer cidadão medianamente informado compreende que a alegoria feita por Lula tem o sentido de que a crise nasceu nos EUA, centro do sistema capitalista mundial, e não em países periféricos. O senhor Garcia preferiu tergiversar e fazer graça (sem nenhuma graça), ao invés de opinar sobre este ponto, sim, essencial.
Mas o que importa é que o povo entende. E a verve do presidente se mostra excepcionalmente útil à popularização de idéias e conceitos complexos e, por conseqüência, à elevação da consciência política da população. Ontem mesmo um taxista me dizia concordar com o prolongamento da redução do IPI para manter aquecida a venda de automóveis, a atividade das empresas acessórias das grandes montadoras e o nível do emprego. “É uma mão lavando a outra, doutor”, concluiu, sem deixar de completar: “Lula está certo.”
Com marolinha e galego de olho azul e tudo, tive vontade de completar.
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