17 fevereiro 2019

Essencial ao futebol


Sistema tático é uma referência aos atletas de que há ordem
Há treinadores estudiosos que não se tornam excelentes porque não têm a técnica sobre como fazer
Tostão, na Folha de S. Paulo

Contra o Talleres, a atuação do São Paulo foi desastrosa, um horror. O time jogou com cinco atrás, colados à grande área (dois laterais, dois zagueiros e um volante), quatro na frente, perto do gol, e apenas um armador, Hernanes, em um imenso espaço. Ele corria com a bola e a perdia. Certamente, não era o que Jardine queria. 
Assim como existem jogadores extremamente habilidosos, que não se tornam craques porque têm pouca técnica, há treinadores estudiosos, que não se tornam excelentes porque não têm a técnica sobre como fazer. É o que Jardine terá de aprender.
Corinthians jogou mal contra o mistão do Racing, mas muito melhor que o São Paulo contra o Talleres. Neste domingo (17), quem será o menos ruim?
Na vitória sobre o Flamengo, o Fluminense se destacou pela pressão em quem estava com a bola e pelo bom posicionamento defensivo, uma evolução de Fernando Diniz. O time teve mais posse de bola, mas faltou talento para trocar passes e chegar ao gol. Já o Flamengo não jogou, por causa da marcação do Flu e pela própria ineficiência técnica e tática. O fato serve para o torcedor flamenguista descobrir que os jogadores são bons, mas não são craques.
As comparações sobre quem foi melhor são cada vez mais frequentes nos programas esportivos. Devem dar muita audiência. Algumas comparações são difíceis, como as entre atletas de gerações diferentes, ainda mais quando um deles não terminou a carreira.
Nas análises, mais importantes que as estatísticas e os títulos conquistados, individuais e coletivos, são o repertório e o nível técnico dos atletas. Pelé foi o melhor de todos, porque possuía, no mais alto nível, todas as características e virtudes de um grande atacante. As conquistas dependem de inúmeros fatores. Os mais premiados nem sempre são os melhores, mas os que atuaram nas equipes campeãs.
A regularidade também é importantíssima, mas, muitas vezes, não depende da vontade e do profissionalismo do atleta. Não se deve confundir tempo de carreira com esplendor técnico. Muitos craques brilham em alguns anos e, depois, administram a fama. 
Se Ronaldinho Gaúcho tivesse jogado por uns dez anos o que jogou em dois ou três, estaria na história entre os melhores depois de Pelé.
As avaliações deveriam ser somente técnicas, pelas conquistas, e não pelo comportamento fora de campo. Os grandes talentos, de todas as áreas, são especiais por suas obras. Às vezes, chamam a atenção pelo estrelismo e pela esquisitice. Faz parte do show. Não se deve misturar o comportamento histriônico, fora de campo, com profissionalismo.
Por causa de seus chiliques, Neymar tem sido bastante criticado. Vi as imagens das seguidas pancadas recebidas por ele, até fraturar o pé. Em um programa esportivo, quase só se falava no excesso de dribles do jogador, que facilitariam as faltas violentas, como se o culpado fosse seu talento. 
Apesar de gostar de firulas, Neymar, na maioria das vezes, dribla em direção ao gol. Além disso, após a Copa do Mundo, quando foi, merecidamente, criticado e ironizado, ele parou de simular e de fazer gestos teatrais.
Os grandes craques, inventivos e transgressores, são as estrelas do jogo, do espetáculo. O sistema tático, importante, é uma referência aos atletas de que existe uma ordem, um planejamento. Funciona como um superego, uma ação repressora. 
Da mesma forma, nós racionalizamos nossas emoções, desejos, para tentar nos proteger do acaso, do espanto e do mistério.
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