24 outubro 2021

Na trilha do trabalho humano

Carta de quatro itens a um empregado brasileiro

Cristina França*

 

Infelizmente a carta não é para uma empregada brasileira. Ou empregade. Uma pessoa brasileirx. E este é o primeiro item desta missiva. Exigir total apoio institucional, estatal, pessoal a esta possibilidade, colocá-la na ordem diária, em cada ação, em cada discurso, para que aconteça novamente em outro cenário, em outras condicionantes, sem preconceitos de cor ou gênero. Empenhe-se para que logo uma sociedade esclarecida esteja encravada na mente e no coração, no orçamento e nas obras públicas deste país. 

O segundo item é um apoio condicionado pela transparência. Faça o que for preciso para nos reaver a dignidade sabendo que estamos de olho em cada passo. Não se esconda. Não crie pensamentos nebulosos. Não dê motivos para fofocas. Seja claro, preciso nos discursos. Somos capazes de entender que há outros projetos sendo gestados, que há quem não seja suficientemente humano, quem seja idiota o suficiente para defender, sem limites, o capital. Caro presidente, o senhor não está sozinho, não é herói, não é salvador, não é o tal. É um empregado brasileiro.

Terceiro, pense em comida 24h por dia. A soberania alimentar das/os patroas/ões é a prioridade zero e só é o terceiro item da carta porque antes deves ser contratado/eleito e a transparência é condição sine qua non para que tenhamos certeza de que as 24h do dia são empregadas corretamente. Tudo começa e acaba na comida: a saúde, o aprendizado, o poder trabalhar, a alegria. Agricultura ecológica, sem agrotóxicos, a terra como fonte de vida, não de lucro. Comida para dentro. É de umbigo estufado, não de ar, que queremos olhar o mundo.

Neste quarto item o bicho pega. É ululante. Mulheres como caminho. Qualquer solução para a crise humana na qual estamos nos queimando passa pela geração da própria humanidade. E gera quem tem útero. Sexualidade separada da maternidade, direitos reprodutivos implementados, educação sexual nas escolas. Respeito à vida sem que ela nem mesmo exista é a revolução necessária. Úteros demandam voz para gritar que não são fornecedores de corpos precarizados a serem sugados pelo sistema. Entenda, presidente: qualquer homem que queira mudar a realidade deve combinar o jogo com quem tem o poder de gerá-la. Incline-se. Este poder é nosso e não abrimos mão do total controle sobre ele. Dito isto, a faixa é tua.

Antes de concluir quero deixar hipóteses que a Ciência coloca sobre o fim do homem de Neandertal, que dominou a Europa por 250 mil anos, com a chegada do africano Homo Sapiens há 30 mil anos. O sapiens, mais longilíneo e talvez mais belo, agradaria mais às neandertais que com eles copulavam mas tinham filhas/os estéreis dado que descendiam de espécies diferentes. O sapiens dividiu as tarefas entre machos e fêmeas, aprendeu a comercializar, enriqueceu seu horizonte ganhando a batalha final e dominando tudo. Há uma hipótese porém extremamente interessante: é possível que com taxa de natalidade 2% superior, e mortalidade 2% inferior, os neandertais tivessem sobrevivido mais alguns milhares de anos ou existissem até hoje. Ou seja, diríamos, no final das contas a coisa ficou entre a mulher e Deus (ou a natureza, o que na minha opinião dá no mesmo).

*Jornalista

 Veja: Congresso aponta rumos para salvar o Brasil da crise https://bit.ly/3m3IpbJ

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