Blog de Jamildo (exBlog do JC):
O sentido das palavras
Luciano Siqueira
O carnaval do Recife e de Olinda foi durante muito tempo, e ainda é, uma oportunidade de reencontro dos amigos e militantes do movimento estudantil da chamada geração meia oito. Muitos, por força de suas opções profissionais e de vida, estão espalhados pelo país.
Nosso encontro foi efusivo:
- Aí, homem, como anda a nossa luta?
- A luta continua, como a gente sempre diz. E você, menina, o tempo passa e continua assim, recauchutada.
Vaidosa, ela retribuiu com um abraço afetuoso e saiu toda fogosa atrás da bandinha de frevo. Não demorou muito, retornou brava:
- Que história é essa de recauchutada, cara! Acabei de saber que recauchutado é pneu velho.
- Não é isso, menina. Eu quis dizer que você continua linda de verdade. Acredite.
O incidente fez lembrar uma frase muitas vezes repetida por Miguel Arraes em nossas numerosas conversas desde que ele retornou do exílio: “O tempo passa e parece que as palavras perdem o sentido. A gente tem que dizer as coisas com muito cuidado para ser compreendido.”
De fato. Não basta a intenção, importa os termos em que se a traduz. Para evitar mal-entendidos que podem ser desastrosos. Caso agora do período pré-eleitoral. Papel aceita tudo e os jornais estão cheios de declarações que é preciso ler nas entrelinhas, pois às vezes a mesma pessoa diz coisas diferentes de um dia para o outro. Fica difícil para o leigo. Tem que fazer parte do mundo da política para entender.
Outro caso é o da economia. Saiu a CPMF e desde então autoridades governamentais e parlamentares aliados se revezam no disse não disse sobre o aumento das alíquotas do imposto sobre o lucro líquido (a CSLL) e sobre as operações financeiras (IOF), cobrados junto aos bancos – matéria de iniciativa do Executivo que tramitará no Congresso no reinício dos trabalhos legislativos. Ao que alguns, insinuando sintonia com o Palácio do Planalto, procuram contrapor com a possibilidade de reedição da CPMF com outra roupagem; e se deparam com declarações em sentido contrário advindas da mesma base governista.
Realmente as palavras terminam perdendo o seu sentido e adquirindo feição furta-cor. Todo cuidado é pouco – para não perder as amizades e para evitar erros políticos.
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