Internet entre a virtude e a culpa
Luciano Siqueira
Publicado no Jornal da Besta Fubana
Outro dia ouvi Carlos Heitor Cony comentar uma crônica de Machado de Assis a propósito de um acidente fatal com um bonde elétrico recém-implantado no Rio de Janeiro. Machado se queixava dos riscos do novo meio de transporte, sugerindo ser preferível o bonde puxado a cavalos, que pelo menos não ameaçava os usuários com eventuais choques elétricos. “A Humanidade avança às cegas”, arrematava Cony, afirmando que o progresso inevitavelmente vem com virtudes e defeitos.
O grande Machado se mostrava resistente ao progresso. Cony talvez exagere em sua assertiva. Mas a verdade é que nada que o homem crie sob esse céu de Nosso Senhor é perfeito, cem por cento bom, zero em riscos e agravos. Nem por isso vamos deixar de fazer bom uso do produto do progresso da ciência e da tecnologia.
Caso da internet. Explodem revoltas no Oriente Médio: tome elogios às redes sociais, alçadas à condição de arma poderosa e decisiva na mobilização de vontades, como se base objetiva e contradições sociais e políticas reais não estivessem na base da insurgência.
Psicopatas invadem escolas, cinemas ou supermercados e atiram a esmo matando e ferindo dezenas de inocentes: tome maldição à internet, agora acusada de grande vilã, pois os assassinos deixam registros em seus computadores dando conta de que frequentavam comunidades malignas e que tais.
Nem uma coisa, nem outra: a internet nem é a solução para todos os nossos problemas, sequer o da comunicação entre as pessoas; nem a raiz dos males sociais que nos afligem. É apenas – apesar de sua extraordinária dimensão e imensurável rapidez – uma ferramenta que, como todas as ferramentas construídas pelo homem, desde os primórdios da Humanidade – pode ter bom ou mau uso. Foi assim com o tacape, a flecha, a pólvora, a energia atômica e com tudo mais que se possa contabilizar aqui como descobertas ou invenções marcantes.
Também não cabe “culpar” a internet pelo baixo índice relativo de leitura de livros entre as novas gerações. Biblioteca que não esteja informatizada, hoje, leva uma enorme desvantagem. Assim como internauta que não se sinta estimulado a ler livros é porque naturalmente já não tinha essa predisposição. É próprio do ser humano abstrair a realidade, seja para melhor compreendê-la, seja para dela fugir (em certos casos). O livro é, sempre foi e será instrumento dessa abstração. Do mesmo modo, quando o interesse do internauta é o conhecimento mais circunstanciado sobre algum tema, na internet ele encontra artigos, teses, estudos vários e até livros em pdf que logo tratará de “baixar” e imprimir para a leitura atenta e a consulta.
Não sou nenhum fanático da web, dela faço uso por dever de ofício e por prazer – moderadamente, de acordo com a necessidade. Agora mesmo não teria a menor chance de me comunicar com vocês, meus talvez poucos e generosos leitores, se não existisse o Jornal da Besta Fubana que tanto bem nos faz, não é mesmo?
Nenhum comentário:
Postar um comentário