13 janeiro 2015

Coalizão ampla e plural

Contradições e convergências no governo
Luciano Siqueira, no Blog da Folha

Recentemente, o noticiário registrou discrepâncias importantes entre os discursos de posse dos ministros Patrus Ananias, do Desenvolvimento Agrário, e Kátia Abreu, da Agricultura, em torno do real peso da propriedade latifundiária no campo brasileiro na atualidade. Mais do que uma questão quantitativa, há elementos de conteúdo importantes, relacionados com o nível da evolução da grande propriedade rural, do ponto de vista das forças produtivas e da inserção no todo da economia nacional e em que grau persiste o latifúndio improdutivo, passivo de reforma agrária de caráter distributivo.

O tema suscita importante e oportuno debate, vez que se trata de um dos pilares do projeto nacional de desenvolvimento que se vem construindo há pouco mais de doze anos. Esse debate transcorre em círculos mais atentos, direta ou indiretamente envolvidos com a questão agrária e o desenvolvimento agrícola do país. 

A afirmação da ministra Kátia Abreu de que não há mais latifúndio no Brasil não se sustenta. Na verdade, aproximadamente 130,3 mil latifúndios ou grandes propriedades rurais, ocupam uma área superior a 244,7 milhões de hectares. Sendo que 2,3% dos proprietários concentram 47,2% de toda área disponível à agricultura – e a dimensão média das propriedades é de 1,8 milhão de hectares (18 mil quilômetros quadrados). Cerca de 50% dessas propriedades permanecem improdutivas.

Daí o ministro Patrus Ananias, no polo oposto, haver proclamado a necessidade de se debater o sentido social da propriedades rural e de se retomar, em padrão consentâneo com as conquistas sociais em curso, a reforma agrária.

Duas abordagens políticas de um mesmo tema essencialmente opostas. Perfeitamente compreensíveis num governo de coalizão ampla, plural e heterogênea. Nada que se possa considerar absurdo ou inaceitável. Até porque governo é ente vivo, comporta visões distintas entre seus integrantes, que podem concorrer para a construção da unidade em torno de questões candentes em patamar mais avançado.

O que não cabe - e aí se reconhece um limite real - é a superposição de distintas visões (partidárias, técnicas, conceituais) para além do Programa do governo, que vem a ser o ponto de convergência do heterogêneo arco de forças partícipes da gestão. 

Precisamente isso: forças distintas, portadores de diferentes visões da realidade brasileira, convergem em torno de propósitos de curto e médio prazo, sob a hegemonia de determinada corrente política. O Programa apresentado na campanha e respaldado pela maioria eleitoral conquistada há de ser a referência essencial da unidade política e administrativa possível. Sob o comando, no caso, da presidenta Dilma e da corrente política a que pertence, hegemônica na coalizão.  


Ilustração: Do site queconceito.com.br

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