27 setembro 2018

Ingente tarefa


País irremediavelmente dividido?
Luciano Siqueira, no portal Vermelho

A presente divisão da sociedade brasileira em polos diametralmente opostos há de ser compreendida para além da superfície.

Pois na superfície muita gente navega, tanto à direita como à esquerda, fazendo uso de construções simplistas. 

Lulismo versus antilulismo é o rótulo mais cômodo para alguns. Ou, aparentemente menos personalista, petismo versus antipetismo.

Para o bolsonarismo emergente - conforme soluços ouvidos da caserna ou do generalato da reserva, e de "analistas" agrupados em órgãos da grande mídia - o Brasil se dividiria entre os que querem o uso da Justiça (sic) para combater a corrupção e os que dela fazem uso para preservar a corrupção.

Claro que nas grandes refregas as multidões se guiam por símbolos. Palavras de ordem traduzem isso. São um meio de galvanizar aspirações e sentimentos e de sintetizar propósitos políticos.

Exemplo histórico emblemático é a do Revolução Russa, que brandiu a consigna "Pão, Terra e Paz", capaz de ser compreendida pela maioria dos russos segundo diferentes gradações de consciência política e não apenas pelos que já compreendiam o caráter socialista da sublevação dirigida pelos bolcheviques com Lênin à testa. 

No Brasil de agora, o próprio Lula deu o mote ao afirmar que se transformara numa ideia. Alvo de condenação injusta, se consolidara como símbolo a distinguir, no imaginário popular, a luta das forças de esquerda e progressistas contra a elite retrógrada, o todo poderoso Mercado, o estamento policial-judiciário e o complexo midiático.

O desenrolar do pleito presidencial, que aponta para um segundo turno entre o capitão Bolsonaro e o escolhido pelo próprio Lula, Fernando Haddad (que tem a comunista Manoela D'Ávila como vice), parece dar razão aos que simplificam a compreensão da polarização social e política e ao próprio Lula, em sua hábil argumentação simbólica.

Mas, supondo uma vitória de Haddad ao final da peleja, impõe-se uma abordagem da divisão da sociedade brasileira mais profunda e mais pé no chão, tendo a correlação de forças como pedra de toque.

Nunca tão somente como uma vitória da esquerda sobre a extrema direita.

O conflito é entre as necessidades e as aspirações do povo— que sobrevive do trabalho — versus imposições de cunho neoliberal, do interesse das elites hegemonizadas pelos que vivem da exploração e da usura. E no meio do caminho diversas camadas sociais e interesses diversos. E ainda, como pano de fundo, a soberania nacional.

Em outras palavras, vencendo Haddad a tarefa imediata será a construção de um novo pacto político e social que considere essa complexidade que alimenta, feito fogo de monturo, a polarização política e eleitoral da sociedade brasileira. 

Uma tarefa hercúlea a ser enfrentada a muitas mãos e através de alianças diversificadas e amplas. 

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