28 abril 2020

Atenção às crianças


A pandemia e a Primeira Infância
Rogério Morais*

A pandemia, a crise, a recessão, o colapso. A liderança, a transformação, a cooperação. A indecisão, a inércia, o medo. As redescobertas, as relações, a solidariedade, a esperança. A gente vive um momento de volatilidade e incerteza diária, um contexto complexo e ambíguo. Há múltiplos lugares de fala e contemplação, obviamente limitados pela capacidade de amplitude e de dimensão do olhar. Escolho aqui o olhar sobre os impactos desta crise para a Primeira Infância.

No curto prazo, a ciência já sabe que o grupo com maior risco de morte para a contaminação com o vírus Covid-19 é o dos idosos. As estatísticas escancaram o tamanho do perigo para a população acima dos 60 anos. Em relação ao longo prazo, ainda não temos estudos científicos específicos, mas apontam para outro grupo de risco: os nossos bebês e crianças, do zero aos seis anos, podem ser alguns dos mais impactados com as consequências da pandemia.

No horizonte, ao sairmos desta fase, observamos a forte possibilidade de o mundo estar mais pobre. No entanto, em crises econômicas, quem historicamente perde mais? Os dados apontam para uma diminuição dos ganhos dos ricos e um aprofundamento da pobreza. Quem sai crescendo sempre é a desigualdade. Quem tem renda se protegerá mais, precisará se endividar menos. Quem já não tem o suficiente para viver poderá perder o emprego e demorar um bom tempo para recuperá-lo ou reforçar as estatísticas da informalidade.

Assim, as crianças destas famílias mais afetadas nascerão em contextos com maior vulnerabilidade social e econômica. Com relação às que já nasceram, certamente, estas estão encarando este mesmo contexto com mais estresse e menos estímulos. Pois, até as que têm a chance de possuir acesso à creche, provavelmente, passarão mais de um mês sem a mesma intervenção qualificada. Aliás, esse foi um ponto de atenção do relatório publicado pelo Banco Mundial, no último 25 de março: “A quantidade e a qualidade do apoio dado à criança para manter seus estudos fora da escola varia criticamente por contexto familiar” (Guryan, Hurst, Kearney, 2008). O desenvolvimento cognitivo não esperará o ritmo da recuperação econômica.

No Recife, a Secretaria Executiva para a Primeira Infância criou um grupo de trabalho em parceria com o governo do estado, com a Universidade Federal Rural de Pernambuco e profissionais especialistas que atuam na área. A intenção é promover campanhas e orientações para as famílias que vivem nas periferias, normalmente em cômodos pequenos, nem sempre com acesso à internet e brinquedos. É fundamental que estas famílias recebam a mensagem de que, mesmo diante de tamanha dificuldade, muitas atividades simples podem ser feitas para promover o desenvolvimento dos infantes, como: conversar ou cantar uma música para seu bebê ou reutilizar caixas de leite, garrafas PET e outros objetos domésticos para criar jogos e brincadeiras.

A quarentena é para todos. Os desafios são desiguais. Vamos trabalhar para chegar junto de quem mais precisa, desenhando intervenções mais aderentes às distintas realidades, para que possamos, assim, contribuir para um futuro melhor para nossas crianças.
* Secretário Executivo para a Primeira Infância do Recife

Saiba mais https://bit.ly/2ySRLkm

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