A
divergência tática está na estratégia
Luciano Siqueira
Errado quem pensa que no processo cumulativo de uma frente
ampla em defesa da democracia antes há que se celebrar a união de todas as
forças de esquerda.
Nunca foi assim.
Basta ver que em nossa história recente, quando do lance
final que derrotou a ditadura militar, a vitória de Tancredo sobre Maluf no Colégio
Eleitoral -, da Aliança Democrática, então constituída justamente para inverter
a correlação de forças, correntes à esquerda se omitiram, inclusive o então
ascendente PT.
Não funciona, portanto, nem aqui nem alhures, esse roteiro esquemático.
Porque prevalecem, em alguns partidos, incompreensões e mesmo uma concepção da
luta jamais vitoriosa, mas suficiente para encarcerá-los no ciclo estreito e
estéril do principismo.
Ao quase centenário PCdoB, especialmente do início dos anos
sessenta em diante, a compreensão arguta e astuciosa da luta destinada a
corroer as bases do adversário principal não tem faltado. É uma das marcas de
sua lucidez tática.
Não são poucos, entretanto, no dramático cenário de agora, que
se perguntam sobre o porquê da rejeição, pelo PT e pelos seus principais
líderes, a uma conjugação de forças ampla indispensável para isolar,
enfraquecer e derrotar o governo Bolsonaro de tantas desgraças.
Afinal, Lula se elegeu e governou por oito anos quando,
enfim, adotou a amplitude e a pluralidade para alcançar a maioria.
Dilma se elegeu e se reelegeu nesse mesmo diapasão. Sofreu o
impeachment em parte quando se descuidou da correlação de forças real.
Onde está, afinal, o cerne da discórdia?
Está no programa partidário, vale dizer, no projeto
estratégico – uma diferenciação importante entre comunistas e petistas.
O PT – pelo menos suas correntes internas majoritárias - vislumbra
como objetivo estratégico a reconquista do governo central, ainda que o Estado
mantenha a sua essência, escala de poder suficiente para alterar o sentido de
políticas públicas em favor da maioria da população, dentro dos marcos do bom
funcionamento das instituições democráticas.
Nada errado nisso, porém insuficiente – nas atuais
circunstâncias críticas do mundo, sobretudo - para a superação da prolongada
crise estrutural da sociedade brasileira, que frustra necessidades e aspirações
do povo, enfraquece as salvaguardas da soberania e mina gradativamente as bases
do Estado nacional.
O PCdoB peleja igualmente nessa trincheira, mas mirando o
plano mediato propugna reformas estruturais progressistas – tributária,
agrária, urbana, educacional, midiática, judiciária; fortalecimento do SUS,
instituição de um Sistema Nacional de Segurança Cidadã, enfeixadas num plano
nacional de desenvolvimento – que, uma vez conquistadas mediante ampla e
prolongada mobilização social, proporcionarão substancial elevação no padrão de
vida material e espiritual do povo e o alcance de uma consciência social
avançada, apta a vislumbrar a própria superação do sistema dominante.
Para tanto, urge deter o desmonte gradativo do Estado democrático
de direito pelo bolsonarismo.
Não cabe simplesmente aguardar que a situação se agrave e se
crie, dois anos e meio à frente, ambiente eleitoral favorável a um a nova vitória
das forças progressistas.
Muito cartesiano para que dê certo.
Aí está a diferença de fundo. O que não invalida a aliança,
digamos, estratégica entre os dois partidos – momentaneamente díspares nas intenções
táticas.
Alianças
partidárias implicam objetivos claros e bom senso https://bit.ly/38kNhAO
Nenhum comentário:
Postar um comentário